Sexta-feira,
28/3/2008
Camus e Sartre, de Ronald Aronson
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 360 >>>
O engajamento parece coisa do passado. As ideologias se diluíram desde o fim do século XX, e o debate político tende a ser cada vez mais técnico. Não existem mais visões de mundo totalmente antagônicas, e as diferenças residem hoje nos detalhes. Portanto, parece fora de época um lançamento documentando a relação complicada entre Albert Camus e Jean-Paul Sartre, pais fundadores do "engagement" e do modelo de "intelectual politizado". Porém, o trabalho do professor Ronald Aronson é tão hábil que, embora fale predominantemente do pós-Guerra na França, nos diz muito sobre o nosso tempo, e seus escombros. Sartre, por exemplo, ainda que não seja mais lido como escritor, nem como filósofo, teve uma influência tão marcante, na cena política dos 1900s, que encontramos ecos seus na esquerda do mundo todo, desde os líderes do PT no Brasil até a derrocada de Fidel Castro em Cuba, até o caudilhismo bolivariano na América Latina, num espírito "revolucionário" e "guerrilheiro" retrô. O livro Camus e Sarte conta como essas verdadeiras filosofias foram forjadas, no embricamento com o marxismo, na ascensão do stalinismo e no paternalismo em relação ao Terceiro Mundo. Camus e Sartre romperam na vida real, mas sua relação intelectualmente dialética ajudou a consolidar o pensamento do último, que triunfou globalmente enquanto a esquerda durou — mesmo sendo o primeiro mais artista e tendo permanecido, efetivamente, como escritor. Sartre, o homem, é ainda hoje, talvez, o exemplo máximo de filósofo inicialmente purista, que invadiu a cena política, alcançou uma posição, deslumbrou-se com o poder, tornou-se simplesmente político e perpetuou-se a qualquer custo. Camus alcançou a mesma arena pública, mas nunca conseguiu compactuar com o sistema (hoje, mainstream), combatendo a capitulação de seu ex-amigo, terminou massacrado na França, agonizou, produziu uma obra-prima, conquistou o Nobel, eternizou-se. Camus e Sarte são arquétipos, ainda, do nosso tempo, e, nesse sentido, o livro de Ronaldo Aronson é tão revelador.
>>> Camus e Sartre [Primeiro Capítulo]
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Julio Daio Borges
Editor |
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