Quarta-feira,
2/7/2008
Senhora dos Afogados, por Antunes Filho
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 371 >>>
Não é uma obra-prima a montagem de Senhora dos Afogados, de Nélson Rodrigues, por Antunes Filho — mas é, como diria Paulo Francis, provavelmente o melhor Nélson disponível, sendo, talvez, Antunes Filho, quase octogenário, a última reserva do teatro brasileiro. Como afirmava e reafirmava o mesmo Francis, o texto é de grande poesia — para ele, a maior em Nélson (mas, possivelmente, não maior do que em Álbum de Família) —, Antunes Filho e o Grupo Macunaíma, porém, acrescentaram trechos, criando seqüências inteiras, às vezes alongando cenas, já que o público da televisão (majoritário, ainda hoje) talvez não suporte a tragicidade plena, os desvios comportamentais incuráveis e o destino impiedoso na história da família Drummond. Ler Senhora dos Afogados — como ler as maiores obras-primas de Nélson Rodrigues para teatro — é uma experiência brutal, para quem justamente tem sensibilidade literária — mas, hoje, os espectadores, mesmo no cinema, não suportam a tragédia sem concessões, guardando um riso de canto de boca, para o momento da abertura à comédia, transformando o sério em ridículo e suspendendo toda a gravidade. Nos estertores do pós-modernismo, "tudo é relativo" e nada pode ser completamente "sem saída" — mesmo Nélson Rodrigues; e Antunes Filho, nesta montagem, não foge disso. O núcleo da família Drummond, obviamente, está bem representado, com destaque para a filha remanescente, entre uma mãe corretamente hipnotizada (por vezes, um pouco sonsa) e um pai distante (em algumas situações, um pouco robótico). Rindo na hora errada (é para rir em alguma hora?) e jamais relacionando o que acontece com o seu próprio inconsciente (Nélson tem soado apenas exótico, ultimamente), o público deve ter sustentado a temporada mas não está à altura de um clássico Antunes Filho. Ainda há tempo, contudo, para revisitar Nélson Rodrigues, segundo um de seus mais ardentes representantes.
>>> Senhora dos Afogados
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Julio Daio Borges
Editor |
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