Quarta-feira,
18/2/2009
João Gilberto na Casa de Chico Pereira
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 403 >>>
Mais de cinquenta anos depois, parece impossível que se pudesse ter, no meio da sala de estar, um dos maiores intérpretes do século XX, esbanjando arte e atendendo, inclusive, a pedidos dos convivas. Mas aconteceu; e com o, hoje, intocável João Gilberto. Graças a um providencial vazamento na internet, circulam, atualmente, registros — originalmente em gravador de rolo (pré-cassete) —, feitos por Chico Pereira, fotógrafo e capista da gravadora Odeon, com o inventor da batida da bossa nova, por volta de 1958, antes da eclosão do movimento. Talvez, para leigos, não seja uma audição user friendly, com muitas paradas, performances entrecortadas e conversas difíceis de se acompanhar. Mas, para aficionados, é um prato cheio. João cantando, por exemplo, "João Valentão" (Dorival Caymmi), "Louco" (Henrique de Almeida/ Wilson Batista) e "Chão de Estrelas" (Sílvio Caldas/ Orestes Barbosa). Nesta última, confessando, inclusive, o ineditismo da execução: "Nunca cantei. Nunca. Acho que, de tanto ouvir, acertei, mais ou menos, a letra..." Mais ou menos? Depois de "Doralice" (que gravaria), divide mais opiniões com a audiência (entre risos): "Caymmi é danado, né? Você vê que ele foi um rapaz sensível..." E quando questionado sobre o maior violonista daquele então (fora ele próprio), dispensa Baden Powell, pelo excesso de virtuosismo, e elege um enigmático "Jacob": "Que eu gosto, assim, é um rapaz de São Paulo... Formidável. Tem 20 anos". Por onde andará Jacob? Além das indefectíveis gravações que João logo eternizaria na sua estreia solo em disco, constam, ainda: "Preconceito", "Mágoa" e "Beija-me". São 38 trechos em MP3, contabilizando as conversas e as repetições. Consoante às atuais discussões sobre genialidade, e realizações humanas de estrondoso sucesso, é o gênio forjando, como disse Joyce, a consciência (musical) incriada de sua raça.
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Julio Daio Borges
Editor |
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