Terça-feira,
22/6/2010
Gênio, de Harold Bloom
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 465 >>>
Se Borges foi um dos maiores leitores do século XX, talvez Harold Bloom então seja um dos maiores leitores deste incipiente século XXI. E Gênio, sua pequena enciclopédia das maiores mentes criativas da história da literatura, talvez não tenha sido devidamente lido, quase dez anos depois. Harold Bloom escrevia em 2001 (pós-Torres Gêmeas) e falava do alto de seus 71 anos (81 — ele repetiria — era a "idade ideal" para Dante). Como vinha de sua maior obra, Shakespeare: a Invenção do Humano (1998), estava impregnado do teatro do Bardo: comparava Shakespeare a quase todo mundo. Assim, Cervantes fizera o romance equivalente a Shakespeare (Dom Quixote), Tolstoi criara os personagens mais vivos depois de Shakespeare e só Chaucer poderia ser o antecessor à altura de Shakespeare (entre outras comparações). Também: foram décadas lecionando o Bardo, e falando sobre ele, quase diariamente. Assim como Richard Dawkins é considerado o maior representante de Darwin hoje, Harold Bloom talvez seja o maior especialista em... Shakespeare. Mas nem só do Bardo vive o Gênio. Interessante Bloom não incluir gênios vivos (e considerar Saramago um gênio — o que nos deixa meio preocupados). Interessante também que ele, Bloom, um dos maiores estudiosos da religiosidade judaico-cristã, tenha, em tão boa conta, Nietzsche ("o maior pensador moral de todos os tempos"; será mesmo?). Também Freud, que considera, inclusive, um escritor de gênio (#exagero). Bloom agrupa seus gênios a cada capítulo, e o dos alemães ainda tem Thomas Mann (que Borges não tinha em boa conta) e Goethe (o "super-homem" de Nietzsche). 100 gênios é muita coisa, mesmo para Bloom. E ele se sai melhor com aqueles mais próximos de si, como Samuel Johnson ("o primeiro grande crítico") e Emerson (admiração compartilhada com Nietzsche, e Borges). Seus melhores momentos são os primeiros gênios do livro: além de Shakespeare, Cervantes e Tolstoi, Virgílio, Santo Agostinho e Dante. Em seguida, O Javista (ou o "autor" do Velho Testamento), Sócrates/Platão (esqueceu de Aristóteles?), São Paulo, Dr. Johnson e os nossos alemães de sempre (faltou Schopenhauer). Mais adiante, Kafka, Tchekov (o maior contista), Wilde ("a primeira celebridade"), Emerson (reloaded), Hugo, Baudelaire e Rimbaud (também Valéry). Ainda, Homero, Camões (que desejava Vasco da Gama maior que a Odisseia e a Eneida), Joyce, Stendhal, Pessoa e Fitzgerald. E, para terminar (a nossa seleção da "seleção de Bloom"), Flaubert, Eça, Machado, Borges (de novo), Balzac e Dostoievski. A inclusão do Bruxo do Cosme Velho foi comemorada em prosa e verso por aqui, mas não soa tão empolgante no livro, embora Bloom o considere "o maior escritor de origem africana de todos os tempos" (leia-se: negro). Sua empolgação com Eça é tocante, quase ouvimos as gargalhadas de Bloom com A Relíquia e intuímos que todo o Jorge Amado saiu dali. O que teria pensado Bloom de Nélson Rodrigues? Dizem que recusou Guimarães Rosa, porque não lhe restava mais tempo para lê-lo...
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Julio Daio Borges
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