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Segunda-feira, 10/12/2001
Você me dispensa de escrever

Julio Daio Borges




Digestivo nº 60 >>> Era uma vez dois escritores que resolveram se corresponder. Eles se chamavam Fernando Sabino e Clarice Lispector. E eles tinham dezenas de interrogações sobre a literatura e o fazer literário. Ele se casou e teve filhos. Ela também, com a diferença que foi morar fora do País: em Paris, em Washington. As cartas deles, dessa época em que cada um escrevia seu livro (ele, o primeiro, ela, o segundo), foram reunidas no volume “Cartas perto do coração”, da Editora Record. São missivas que atravessam os anos 40, 50 e até 60. Clarice Lispector nasceu em 1925 e faleceu em 1977. Fernando Sabino nasceu em 1923 e vive até hoje. São dele as notas de rodapé e os esclarecimentos. A gente lê e, mais que a curiosidade pelos ossos do ofício, fica querendo saber quando é que o galã vai beijar a mocinha. Lógico, eles eram casados. Lógico, eles tinham família. Lógico, eles moravam em cidades diferentes, em países diferentes. Mas, mesmo assim, a gente fica torcendo. Até porque, afinal, eles se encontraram algumas vezes no Rio, e bem que podia ter dado tempo. Enfim. O negócio é que, se aconteceu ou se não aconteceu, não foi publicado e, portanto, nunca vamos saber. Também, existem outras coisas. Ambos metem o pau no Álvaro Lins, um crítico literário daquele tempo. Ambos se encantam com a genialidade de Guimarães Rosa, que publicava Grande Sertão: Veredas. E ambos são extremamente ciosos e envergonhados com os seus textos. A Clarice, por exemplo, nem os editores entendiam direito, e ficavam com medo de lançá-la, temendo um fracasso comercial. Ela se irritava e ameaçava engavetar seus escritos para sempre. Acabavam saindo. Já o Fernando, embora a Clarice pedisse (quase implorasse), era muito relutante e demorou cartas e mais cartas para enviar-lhe seus originais. Dizia: “Seja impiedosa”. Ela não foi muito. Tem também os coadjuvantes: o Otto, o Paulo, o Rubem. E o Maury, marido da Clarice. E a Helena, esposa do Fernando. Ficamos com saudades de todos eles, quando terminam as páginas. (São duzentas.) Esse escritores são fogo, cativam a gente.
>>> Cartas perto do coração - Sabino e Lispector - 222 págs. - Record
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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