Terça-feira,
25/12/2001
Os silêncios me praticam
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 62 >>>
Luiz Melodia foi buscar inspiração no poema de Manoel de Barros para disco homônimo: “Retrato do artista quando coisa”. Ninguém questiona as qualidades poéticas do último e, depois de ouvir o resultado (musicado pelo primeiro), espanta-se que os dois universos tenham se fundido. São versos sem rima e sem métrica definidas, mas foram bem amarrados pela melodia e pela harmonia. Se esse exemplo tivesse se estendido para o resto do compact disc, o autor de “Pérola Negra” manteria os bons fluidos que ainda emanam do seu “Acústico Ao Vivo” (de 1999). Mas não. Luiz Melodia preferiu insistir no pop romântico que vem se arrastando sem muito brilhantismo desde “14 Quilates” (de 1997). Obviamente que há momentos agradáveis como em “Esse filme eu já vi” (quase um rock), “Otimismo” (um misto de Djavan e Sebastião Rodrigues Maia), e até em “Gotas de saudade” (que o próprio artista considera comercial, não passando de um reggae leve). A audição segue suave, sem abalos e, por isso mesmo, homogênea ao extremo – a ponto de confundirmos os arranjos e as canções (principalmente quando sob a batuta de Serginho Trombone). Foi-se o tempo em que Melodia fazia de cada passagem uma surpresa. Essa fase de agora, mais acessível (digamos), coincide com o desejo do cantor e compositor de se desfazer da pecha de “maldito”. Ele se ressente que tenha sido jogado para escanteio pelos grandes nomes de sua geração (leia-se os tropicalistas). Luiz Melodia quer ser aceito. E tem razão: andar a margem, às vezes, cansa. Ninguém lhe tira esse direito. Acontece, no entanto, que vamos continuar preferindo suas trilhas pelos anos 70. Fazer o quê.
>>> "Retrato do artista quando coisa" - Luiz Melodia - Indie
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Julio Daio Borges
Editor |
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