Quinta-feira,
11/7/2002
A visão certa
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 90 >>>
O que têm em comum José Saramago, Hermeto Pascoal e Win Wenders? Aparentemente nada, mas João Jardim e Walter Carvalho colheram seus depoimentos (entre tantos outros) para montar o documentário "Janela da Alma". São pouco mais de 70 minutos de colagens, trechos de perguntas e respostas, discutindo o ato de ver, olhar, enxergar - suas limitações, extrapolações e falhas. Interessante notar como essa vertente vem se estabelecendo no cinema brasileiro atual, na medida exata de um "gênero": não existem grandes desafios em termos de sétima arte, apenas uma habilidade especial para montar um "discurso", a partir de diferentes visões de mundo, como numa reportagem. Depois de décadas de inércia, frente à televisão, o público já parece "formatado", disposto a encarar e a desfrutar esse tipo de "pacote" - apreendendo, reagindo e posteriormente refletindo sobre as idéias ali apresentadas. Ou seja: ninguém precisa ser um Glauber Rocha para entender quando Saramago compara os infinitos canais de tevê a cabo aos supostamente infinitos periódicos os quais poderia assinar; nem precisa ser um Nelson Pereira dos Santos para entender quando Hermeto conta da sua vesguice: de como ela lhe permitiu, durante a adolescência, paquerar três ou quatro meninas ao mesmo tempo; muito menos precisa ser um Arnaldo Jabor, para entender quando Wenders explica sua necessidade de enxergar dentro de um enquadramento (framework), sendo-lhe impossível viver sem óculos. Em resumo: o filme não é, em nenhum momento, específico, técnico, hermético, de alcance limitado; é, ao contrário, simples, direto, claro, revolvendo em temas universais, da vida como ela é, para crianças e adultos, dos 8 aos 80 anos. O espectador não é obrigado a saber que Saramago é escritor, que Hermeto é músico e que Wenders é cineasta - pouco importa. "Janela da Alma" será desfrutado, do mesmo jeito, por sábios e ignorantes. Mas o que isso pode significar a longo prazo? Ninguém sabe. A curto pode, no entanto, significar que os nossos homens de cinema conseguiram, finalmente, se fazer entender pela massa.
>>> Janela da Alma
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Julio Daio Borges
Editor |
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