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Quinta-feira, 14/11/2002
Brasil em transe

Julio Daio Borges




Digestivo nº 108 >>> "A preguiça me levou a estudar cinema". Assim começa o depoimento de José Roberto Torero em "O Cinema da Retomada", compêndio de mais de 500 páginas organizado por Lúcia Nagib e lançado pela Editora 34. Provavelmente a maior e mais completa reunião de cineastas brasileiros de todos os tempos, ainda que englobe apenas o período que vai de 1994 a 1998. São noventa nomes. De Nelson Pereira dos Santos a Beto Brant. De Cacá Diegues a Fernando Meirelles. De Hector Babenco a Walter Salles. Funciona também como um dicionário de realizadores tupiniquins, com dados biográficos e filmografia completa. Para folhear e ler numa sentada. As influências são as mesmas de sempre: Neo-Realismo italiano, Nouvelle Vague francesa, Cinema Novo brasileiro, etc. Dos testemunhos registrados, as controvérsias são o que mais nos interessa. Babenco, por exemplo, diz que cineasta brasileiro tem de ser "o cafetão e a prostituta ao mesmo tempo". Já Neville D'Almeida prefere descarregar sua fúria nos jovens críticos: "ejaculadores precoces", segundo ele. Pelo mesmo caminho segue Sérgio Rezende, atacando um certo "rapazinho do JB". Mais ponderado está Walter Lima Jr., que tenta desfazer mal-entendidos acerca de seu amigo Glauber Rocha: "Seus contemporâneos foram esmagados por sua onipresença". Ugo Giorgetti, quase um outsider, chega para redimir o seu meio: "Cinema nunca me deu o que comer, sempre vivi da publicidade". Desaponta, no entanto, a participação de seu colega, Fernando "Cidade de Deus" Meirelles, pouco menos de duas páginas (nada sobre o seu atual "hit"). Também José Henrique Fonseca (filho do homem), numa pagininha apenas. A verdade é que os novatos têm pouco a dizer, mesmo quando se estendem, como Walter Salles e Beto Brant. Exceção aberta para José Roberto Torero, um cético felizmente incorrigível: "Com as leis de incentivo, entramos na Era Moderna, o tempo das navegações, do Renascimento e do Absolutismo". (Todos, vale lembrar, revoltadíssimos com um tal de Guilherme Fontes, o arrivista que perverteu as ditas leis.) Proclama Reichenbach, na contramão da História: "Temos que fazer filmes péssimos!". Rogério Sganzerla, por sua vez, joga a culpa nos Marinho: "O Brasil é tutelado pela Globo". O fechamento cabe ao emocionado Cacá Diegues: "Tenho certeza de que esse cinema vai surpreender o mundo, como já está surpreendendo". Que Deus o ouça. (Se for mesmo brasileiro.)
>>> O Cinema da Retomada - Depoimentos de 90 cineastas dos anos 90 - Lúcia Nagib - 528 págs. - Editora 34
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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