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Terça-feira, 17/12/2002
Gibizon

Julio Daio Borges




Digestivo nº 112 >>> Às vezes, é bom lembrar os quadrinhos e entender porque, em certa idade, aquele universo nos impressiona. "O livro negro do Radicci", assinado por Carlos Henrique Iotti, tem todos os elementos típicos (ou quase). A caricatura e a representação simplista do mundo dos adultos. (Principalmente no que se refere aos pais.) A presença de um (anti)herói jovem ou de comportamento juvenil, que desperta identificação imediata. As sugestões de sexo, aqui e ali, sem o custo que lhe é inerente e com uma facilidade inigualável no mundo real. A inclinação aventuresca do passarinho que, recém-saído do ninho, anseia pelos primeiros vôos. Com a vantagem de confortavelmente emular sua existência nas páginas de uma HQ, sem correr o risco de avariar uma asa, quebrar a cara ou espatifar-se no chão. Duro. A dureza pontiaguda e áspera da realidade. Mas o "Radicci" não é para tanto. (Ou é?). Também não é para tratados de sociologia sobre a imigração italiana no sul do País. A personagem de Iotti, que mereceu uma coletânea da L&PM, veio da Itália, reside numa colônia, faz a colheita da uva, com estranhamento também cruza a cidade, enchendo a cara de vinho de vez em quando e, no seu machismo, sofrendo repreensões da mulher. O autor alerta para a mudança de traço, do primeiro ao último quadro. Não é algo para se reparar. Mas preocupante é a falta de inspiração eventual, quando a piada conhecida ou o adágio popular substituem o esforço de criar uma nova história. Uma tira, inclusive, se repete nos mínimos detalhes. (Um desafio para os revisores.) Nos melhores momentos, o argumento gira em torno dos "tempos modernos" e da conseqüente inadequação de figuras do século passado. É Radicci tomando olés do computador, resgatando o filho de uma república de estudantes (modernosos) ou tendo de lidar com sua própria crise de meia idade. O português lembra o de Juó Bananere, sem a riqueza de vocabulário e sem a sofisticação da língua que Alexandre Ribeiro Marcondes inventou. Apesar das limitações que, obviamente, existem, o desenho de Iotti é simpático e dá para passar a noite à base de ocasionais gargalhadas. Radicci prova que o acento regional persiste e que nem só de HQs do Rio e de São Paulo vivem as bancas.
>>> O livro negro do Radicci - Iotti - 169 págs. - L&PM
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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