Sexta-feira,
27/12/2002
Além do Mais em 2002
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 114 >>>
2002 foi ano de Copa do Mundo e de Eleição. Quase só isso. Tirando o Carnaval (que tem todo ano), 2002 praticamente parou o Brasil. Tanto quanto cordiais, os brasileiros são festivos e mais agarrados a um feriado do que ao trabalho. Está bem, talvez seja impressão. Mas tente pedir alguma coisa (um produto ou serviço) na sexta-feira: só vai recebê-lo ― se é que vai ser atendido ― na próxima segunda-feira. Não são poucos os estabelecimentos que só começam a funcionar, direito, a partir das 10 horas da manhã; fazem almoço de uma e meia, duas horas, e quando é cinco da tarde já estão juntando as coisas para, às seis, fechar as portas. Não é má vontade, nem preconceito ― é a experiência de quem lida com a nossa indústria de bens e serviços. Talvez seja por isso que no Brasil só prospera quem mexe com "indústria de base" ― o resto é considerado supérfluo, e não só aqui mas em qualquer país em desenvolvimento. A cultura então nem se fala. Os brasileiros não precisam de "cultura" para viver ― até porque não é essa a sua função ―, portanto, não pagam por ela e não acham que ela "vale". Oscar Wilde dizia que toda arte é inútil. Ou seja: não tem uma "finalidade" específica, que se possa precisar. Por que você, por exemplo, ouve música? Ela não faz o seu trabalho, ela não resolve os seus problemas, ela não paga as suas contas, mas você, ainda assim, continuam escutando ― mesmo sem saber muito bem por quê. O pensamento para a "cultura" deveria ser o mesmo ― mas não é. Talvez porque no Brasil haja ainda muito embusteiro, cantando música que não é música, escrevendo livros que não são livros, pintando quadros que não são quadros. Qual a solução? Deixar tudo isso de lado, afinal não "vale a pena"? Errado, vamos ter de inverter esse fluxo ― e mostrar o que é verdadeira música, o que é verdadeira literatura, o que é verdadeira arte. Com uma classe mais educada de pessoas, talvez consigamos mudar o panorama. O que acontece, ainda, infelizmente é que as pessoas "com condições" estão consumindo o mesmo lixo cultural que as pessoas "sem condições". E o Brasil que um dia teve ambiente para o surgimento de um Machado de Assis, de um Villa-Lobos, de um Glauber Rocha, agora vai se contentando com um Paulo Coelho, uma Xuxa, um Tchan. O Brasil ainda produz, obviamente, grandes coisas. É, portanto, responsabilidade de cada brasileiro valorizar a verdadeira cultura ― para depois não reclamar e lavar as mãos como Pôncio Pilatos.
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Julio Daio Borges
Editor |
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