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Sexta-feira, 14/3/2003
Homenagem do vício à virtude

Julio Daio Borges




Digestivo nº 125 >>> Uma semana após a estréia, "Chicago" continua gerando opiniões controversas. Entre aqueles que "adoram", muitos apostam na ressurreição do gênero musical, na consagração de Catherine Zeta-Jones e no número retumbante de Oscars. Já entre os que não acham grande coisa, o musical está tão editado que parece um videoclipe, as músicas não valem à pena e as interpretações deixam muito a desejar. Quem tem razão? No bojo dos lançamentos pré-Oscar, é difícil estabelecer prioridades, quanto mais prestar atenção num filme só. O problema começa aí. Que tal então explorar o que é ponto pacífico? A produção, por exemplo. Em "Chicago", ela está deslumbrante. Tão presente e avassaladora, em cada detalhe, em cada luzinha, que chega a inebriar. É um banho de riqueza à americana. E por isso, talvez, seja excessiva e tenha provocado dores de barriga (quando não paixão) em alguns espectadores. Há sentido em acompanhar o desbunde hollywoodiano numa cidade, digamos, tomada por pedintes (como São Paulo)? Gere, Zeta-Jones e Zellweger - em que "mundo" vocês vivem? (Algumas questões que podem ter sido levantadas.) Quem sabe, no entanto, a atração de "Chicago" não esteja no seu luxo nababesco, no seu desperdício de dólares num planeta que não erradicou a fome e que se prepara para mais uma guerra. [Eu sei, esse discurso também é chavão.] Ao contrário do que a embalagem sugere, o mérito do longa reside provavelmente no seu cinismo. Uma característica presente não apenas no "underground", mas ultimamente até no "mainstream". Nos diretores que desconfiam do sistema, mesmo tendo sido moldados por ele. Nos atores que costumam se sabotar, conferindo maior humanidade à personagem. Assim, quando a vedete "loura" rouba a cena da "morena", inventando uma falsa gravidez, ela sabe que o truque é baixíssimo, e que a mentira não vai durar. Do mesmo modo, no momento em que a "morena" vem pedir ajuda à "loura", ambas sabem que nenhuma das duas vale nada, mas que - evidentemente - o show deve continuar. E assim caminha a humanidade. Os sentimentos não valem a pena, a imprensa só mente e a justiça não funciona. Eis as três lições de "Chicago". Gostando ou não, ainda é melhor aprendê-las entre risadas e canções.
>>> Chicago
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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