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Segunda-feira, 17/3/2003
Saponáceos e detergentes

Julio Daio Borges




Digestivo nº 125 >>> Os semiólogos, em geral, são conhecidos por escreverem mal. Sua prosa quase sempre deriva para análises cansativas da linguagem, e o leitor, se não for um iniciado, desiste logo. Roland Barthes, no entanto, revelou-se uma exceção. A Difel relança no Brasil o seu "Mitologias" (1957) e a surpresa aflora dessa coletânea de ensaios: enfim, a semiologia legível e suportável. Barthes registra seu espanto diante das transformações do pós-guerra, na França, e tenta "ler", no comportamento dos franceses, os "signos" do futuro. Há, claro, momentos densos de um cerebralismo exasperante. É típica a sensação: "Já li isso? Já li, mas não parece...". Apesar de não conseguir fugir dos cacoetes de seus colegas de "significantes" e "significados", Barthes se permite ser frugal e, às vezes, até engraçado. Como quando se debruça sobre as perucas dos imperadores romanos, nos filmes de Hollywood. Ou quando persegue André Gide em suas férias de escritor, junto com os semanários de variedades como o "Paris Match". É, em realidade, surpreendente que ele dialogue com o jornalismo e chegue mesmo a emulá-lo. Afinal, acadêmicos costumam descambar para o abstracionismo de uma tal maneira que um parágrafo, deslocado de seu contexto original, não consegue significar absolutamente nada - é pura verborragia desperdiçada. O inconveniente de "Mitologias", embora seja um livro médio (pouco mais de 250 páginas), é o mesmo de todas as coleções que nascem pautadas pelas notícias de jornal: pecam pela repetição e, muitas vezes, pela dispersão de quem atira para todos os lados. Assim, Barthes passa da greve aos brinquedos de criança, do automóvel ao caso policial, dos intelectuais à propaganda de sabão em pó. E terminamos nos perguntando o que ele pretendia com tudo isso. Não pretendia nada (talvez seja a resposta), o importante é o percurso. Será? Para quem sente falta de semiologia (bruta), há uma segunda parte dedicada a desvendar os "mitos" modernos. Roland Barthes, evidentemente, não é leitura de cabeleireiro - mas nunca os semiólogos foram tão claros e conseguiram se comunicar como verdadeiros seres humanos.
>>> Mitologias - Roland Barthes - 256 págs. - Difel
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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