Digestivo nº 373 >>>
Em macroeconomia, no Brasil, quando a inflação ameaça, o Banco Central remedia, via reunião do Copom, com aumento da taxa Selic, a taxa básica de juros — mas, e quando a crise acontece na vida pessoal, que remédio se deve buscar? Partindo do princípio de que crises são inevitáveis, assim como as catástrofes naturais, muitas vezes também imprevisíveis, Laura Day escreveu Bem-vindo à sua crise, um manual de sobrevivência com elogios de Nicole Kidman. Cinema nem sempre tem tudo a ver com psicologia, mas uma celebridade, às voltas com relacionamentos efêmeros, deve conhecer bem o significado do termo crise (ou, pelo menos, deveria). Day, uma terapeuta de Nova York, redefine a crise como o momento propício para se abandonar velhos padrões (que, justamente, falharam) e tentar construir, do zero, a vida que se quer efetivamente levar. Recheado de exercícios, em que o sujeito em crise é obrigado a "desenvolver" e até a mexer na ferida, o volume de 200 páginas é, relativamente, curto, mas denso na travessia (sobretudo se a carapuça servir). Dependendo da crise, pode parecer impossível encará-la como uma espécie de "benção", mas é isso mesmo que a autora advoga — afinal, sem a crise, nada mudaria e a vida continuaria uma porcaria. A crise, portanto, deve ser um ponto de inflexão. Uma chance de corrigir a própria trajetória. As pessoas, em geral, reagem à crise de quatro maneiras típicas: ou com violência; ou com ansiedade; ou depressivamente; ou negando a própria crise. Laura Day "trabalha" cada caso no livro e insiste para que não se caia nas três principais armadilhas pós-crise: ruminação, recriminação e revanche. A crise, quase sempre, é a crise de um modelo, que se deve abandonar (porque não serve mais), construindo, no processo da crise, outro. (A tal da "mitologia pessoal".) Depois de um golpe — ou até de um nocaute —, é difícil se reerguer, mas, como dizia Nietzsche, o que não mata, fortalece — então Bem-vindo à sua crise serve como um catalisador.
>>> Bem-vindo à sua crise
Sob o ponto de vista de "benção", a crise criou grandes obras de arte, grandes inventos, corporações, incrementou o intercâmbio cultural e o turismo. A necessidade faz a ação... Viva a (e sobreviva à) crise!
O mais difícil ao atravessar uma crise é reconhecê-la. A maioria foge da besta ao invés de enfrentá-la. Apesar de algumas contusões, podemos sair fortalecidos do conflito. Pena que, nesse mundo novo, onde estar triste pelas crises, e refletir sobre elas, virou quase motivo de vergonha... a tendência é ignorar o preço que, muitas vezes, se tem que pagar por estar vivo.