Digestivo nº 425 >>>
Quem acha que é só em matéria de tecnologia que os blogs dominam, deveria ler o ensaio de Michael Nielsen, um dos pioneiros da computação quântica, sobre o futuro do jornalismo científico. Nielsen centra-se na área que melhor conhece, a de ciência, mas seus insights valem para toda a produção de mídia. Começa falando de tecnologias "disruptivas" (numa aproximação grosseira para "disruptive") — tecnologias que rompem com a continuidade de uma determinada evolução, produzindo "descontinuidades" e tornando-se revolucionárias. A internet é disruptiva, por exemplo, já que obriga muitas indústrias antes consolidadas a uma forte adaptação. A internet rompe com a "continuidade" em muitos setores. Do geral Nielsen passa ao particular, e aborda a indústria que tem sofrido mais, ultimamente, com as "descontinuidades", a dos jornais. Além da ameaça econômica — blogs são mais baratos de manter e de se anunciar —, Nielsen cria uma hipótese original para a tendência dos jornalistas, e dos executivos de jornal, de não enxergar a revolução: estão de tal maneira entranhados na indústria do papel que se tornaram imunes a qualquer tipo de argumentação "de fora". Logo, Nielsen conclui que algo como o Google News jamais seria inventado dentro de uma redação de jornal. Morreria antes de nascer, em realidade. O problema é que qualquer nova tecnologia, como os blogs, parece excessivamente falha, se comparada a um modo de produção centenário, os jornais. Ocorre, porém, que uma tecnologia disruptiva só pode ser detectada, e "combatida", nos seus primeiros estágios. (Veja, agora, a batalha dos jornais para fechar seu conteúdo on-line — depois que todo mundo "abriu", tornou-se inútil... Ou, outro exemplo, a discussão do download...) Michael Nielsen conclui que a indústria de mídia, em geral, está passando às mãos de empresas cujo DNA é tecnológico: Apple (música), Amazon (livros) e Google (conteúdo on-line). Assim, quem quiser sobreviver terá de aprender tudo sobre tecnologia e refundar sua empresa nessas bases. Voltando ao jornalismo científico, Nielsen conta que, enquanto o New York Times costuma jactar-se de ter seis prêmios Pulitzer, a blogosfera que cobre ciência tem quatro medalhas Fields, três prêmios Nobel, entre outros luminares. E tem a tecnologia... Portanto — até cientificamente —, quem vai vencer a guerra?
>>> Is scientific publishing about to be disrupted?
Venho acompanhando os artigos do Digestivo sobre o fim da imprensa impressa (!!) e a "nova" imprensa eletrônica. Fica evidente que a discussão gira sempre em torno do lucro, da remuneração e dos investimentos das empresas de imprensa. Porém, muito mais do que números, o que está em jogo é algo mais profundo, mais complexo e abrangente do que se tem ilustrado. Todo o sistema capitalista precisa de uma estrutura ideológica que sustente a produção e circulação privadas de mercadorias pelo globo. Esse arcabouço é dado pela grande mídia, pela grande imprensa. A produção de alienação (religião, conceitos e preconceitos), necessária à estabilidade da máquina de lucros, também está a cargo desses mesmos organismos. Com a imprensa eletrônica, descentralizada e livre (será?), como farão para controlar a informação aqueles que controlam o capital? Falta aprofundar o discurso agregando essas categorias. Quem o fará? Abraços.