Digestivo nº 471 >>>
Até o sucesso do Facebook, a história das redes sociais era uma história de prejuízos incalculáveis. As redes sociais bateram sempre recordes em número de páginas navegadas (pageviews), mas eram ineficientes para a veiculação de anúncios. Os usuários simplesmente não clicavam. Logo, não havia um "Google das redes sociais". Mesmo o Orkut, aqui no Brasil, era um portento, em termos de audiência, mas assustadoramente dispendiosa, como rede social — até por conta dos eternos processos judiciais (pedofilia etc.). O Facebook não só mudou essa história, com seus produtos virtuais, e jogos no estilo FarmVille, como se tornou o endereço mais acessado da internet. Mais acessado que o outrora todo-poderoso Google... Steve Jobs, o mago da computação na Apple, deve ter feito um raciocínio parecido. Como Bill Gates, Jobs nunca quis entrar na internet para perder dinheiro. Como já tinha a iTunes Store, a maior base de compradores de música da internet pós-pirataria, lhe pareceu lógico criar uma rede social a partir daí. Vale lembrar que o MySpace, a maior aposta de Rupert Mudoch na internet, começou originalmente como uma rede social "musical". Do mesmo modo, a Last.fm — a "última FM" —, teve o seu momento. A estratégia se juntaria ao movimento da Apple no sentido de se tornar uma "rede proprietária", para além da Web — alicerçada em dispositivos móveis como o iPhone e o iPad. Depois da apresentação oficial em setembro, no famoso estilo "Jobs", o mercado de internet tremeu, e imaginou que a Apple dominaria as redes sociais também. Ocorre que Steve Jobs ainda é um empresário old school, quase do velho mainstream: à medida que vai ficando poderoso, vai revelando sua ambição de controle — tanto quanto... Bill Gates? Jason Calacanis, que vem provocando Mark Zuckerberg, ironizou, em sua newsletter, dizendo que o Facebook tem os e-mails das pessoas, enquanto que a rede social Ping, da Apple, tem os seus cartões de crédito... Mas Dave Winer, num segundo momento, acertou mais em dizer que Jobs não está preparado — ainda — para a Web. A rede social Ping foi construída para incentivar o consumo de faixas, jogos e vídeos na iTunes Store. Não é uma ferramenta de publicação e sequer permite grande interação entre os participantes. Vale lembrar, ainda, que a Apple "pediu uma ajuda" ao Facebook, a fim de aproximar, "na Ping", as pessoas que já estavam conectadas na rede de Zuckerberg — mas a "parceria" durou só algumas horas, pois logo o Facebook acusou a Apple de tentar acessar dados sensíveis... E, conforme vai se desenvolvendo, a rede Ping sutilmente revela uma disposição de trabalhar em favor das velhas gravadoras (como a Last.fm hoje?). Nos anos 80, Steve Jobs lutou, contra a IBM, a batalha do computador pessoal. Depois, nos 90, lutou a batalha do software, contra a Microsoft. Nos anos 2000, reergueu a Apple, e, nos 2010, parece estar vencendo a batalha dos dispositivos móveis. Sua estratégia atual parece querer sobrepor a Web e reabilitar o velho mainstream falido. Será que vai conseguir? Será que a Web permite?
>>> Ping, a rede social da Apple
Como o próprio Karl Marx visualizou o mundo não está parado à sombra de um modelo, mas em plena evolução. Só que Marx falava na maquinaria, que absorveria inclusive a mão de obra; ainda não havia a expressão robótica, automação ou informática. E tudo isto é dialético, temos que acompanhar a evolução e ficar mais tempo livre para beber, comer e amar, como previu Lesing, e tão bem escrito por Paul Lafarg, no seu "Direito à preguiça".