DIGESTIVOS
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Quinta-feira,
28/2/2002
Beauty does that to me
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 71 >>>
An Affair to Remember. A capa do DVD e a tradução em português (“Tarde Demais para Esquecer”) não inspiram muita confiança. [Oh, não, mais um romance água-com-açúcar para consolar corações partidos ou para iludir moças solitárias.] E, realmente, os primeiros dez minutos do filme repetem (ou dão início) a, mais ou menos, um milhão de fórmulas que conhecemos para o gênero: era uma vez um galã namorador (Cary Grant) que, enfastiado depois de tantas conquistas, conhece, num barco, a mulher de sua vida (Deborah Kerr); ela é inteligente, desafiadora e não dá a menor bola para a sua fama de garanhão, conclamando-o ao desafio; ele apela para todas as armas que antes funcionavam (de um dom-juanismo barato) e, ao constatar que não têm nenhum efeito sobre ela, uma garota um pouco mais sofisticada, desiste, dando lugar à amizade; e, aí, então – como que por encanto – os dois se apaixonam; só resta um problema: ambos, antes de embarcar, tinham se comprometido (com outras duas pessoas) para casar. É preciso, porém, lembrar que, como disse Camus, todas as histórias já foram contadas. A única coisa que nos resta, portanto, é contá-las de uma maneira nova. Eis o grande charme de “An Affair to Remember”. Não é propriamente um ovo de Colombo hollywoodiano, mas comove, aqui e ali, graças a algumas sacadas de Leo McCarey (o diretor). Como não se deixar levar, por exemplo, pela aura miraculosa que envolve uma tarde no mediterrâneo, quando Cary Grant resolve apresentar Deborah Kerr à sua avó, sensível, sábia e arguta, a primeira a anunciar, sutilmente, que ambos haviam nascido um para o outro? Como negar inteligência, outro exemplo, à cena do primeiro beijo em que, numa escada, os dois amantes se enlaçam, mas sem que a platéia possa vê-los, deduzindo tudo pelo movimento de pernas e pés? Tudo bem que, da metade para o final, o longa perde o ritmo, e a espera entedia um pouco (afinal de contas, já sabemos de antemão como vai acabar). Mas vale à pena. O desfecho é o tal, com chave de ouro; e até com chave de lágrimas (se nos é permitida a metáfora), feito para desmontar moçoilas mais suscetíveis. Assim foram os anos 50. Os mesmos que consolaram o mundo.
>>> An Affair to Remember
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Julio Daio Borges
Editor
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