"Para ser crítico de cinema, ou cineasta, é preciso muita paixão pelo cinema." Luiz Carlos Merten, crítico do Estado de S. Paulo, faz-nos lamentar nossos cerca de 20 anos - nós, na platéia do curso de Jornalismo Cultural promovido pelo Centro de Estudos da revista Cult. A maior parte dos alunos é formada por universitários que, não tivessem visto motivo de inveja nos milhares de filmes já assistidos pelo jornalista que assina a maior parte dos textos de cinema do grupo Estado, teriam encontrado um na defesa apaixonada que Merten faz de sua profissão.
"Tudo bem, eu não ganho uma fortuna. Mas ganho bem, e para ver filmes, viajar pelo Brasil e para o exterior, conversar com estrelas de cinema, ver festivais. Mas isso não resolve a questão inicial: de onde eu tirei autoridade para escrever sobre cinema?" (aos que se animaram com a descrição do cargo, Merten manda tirar o cavalinho da chuva. Não tem planos de se aposentar no Estado de S. Paulo, onde escreve há 17 anos, tão cedo). Essa autoridade vem, de um lado, pela própria forma de trabalhar: Merten se considera mais um repórter do que um crítico. Gosta da redação, e já recusou a oferta de escrever de casa. Conversa muito com fontes, faz entrevistas, apura. Mas quem acompanha seus textos sabe que ele nunca é puramente referencial.
"Eu não sigo nenhuma teoria do beltrano, do sicrano. Eu sigo a minha", conta o crítico, que lançou cinco livros sobre cinema. Merten começou sua carreira jornalística no Rio Grande do Sul. Já tinha começado a faculdade de arquitetura, mas escrever sobre cinema ganhou a parada quando seus textos, divulgados informalmente, primeiro num mural da faculdade e depois numa página no Diário de Notícias, começaram a ser lidos e comentados. Logo surgiu a necessidade de cursar jornalismo, por conta da exigência do diploma. Merten teve períodos em outras editorias que não a de cultura - passou por política, polícia, esportes. Dessa experiência ganhou uma agilidade tremenda; quando morre alguma personalidade do cinema, é ele quem costuma ser chamado para preencher, em coisa de uma hora, uma página do "Caderno 2" sobre o recém-falecido, à beira do fechamento.
Merten desanca a faculdade e as fórmulas prontas para se aprender a escrever sobre (e a fazer) cinema. Sobra mais ainda para a maldição das estrelinhas usadas para classificar a qualidade de um filme, que grassam na imprensa apesar de serem ridicularizadas por qualquer jornalista cultural ou crítico de arte. Essa falta de critérios objetivos talvez seja desapontadora para quem gosta de cinema e quer ser crítico, mas não sabe como começar. A única dica objetiva de Merten é: "escreva. Faça um blog". Ele inclusive, acaba de lançar o seu; para um redator compulsivo como ele, talvez só a web mesmo seja o limite. Contudo, Merten é avesso à Internet; não abre e-mails e normalmente confia o suficiente na memória para não se sentir obrigado a checar cada nome ou data que menciona.
O melhor de uma palestra como essa está nas entrelinhas. Ao elogiar Munique, O Terminal e Guerra dos Mundos, os três últimos filmes de Steven Spielberg, o jornalista acabou dando a maior pista do que deve importar a um crítico. Ele diz que essa tríade venceu a desconfiança que ele tinha com relação ao cineasta, causada principalmente pelo fato de que em A Lista de Schindler e Parque dos Dinossauros, o campo de concentração e a ilha com sua fauna artificial têm basicamente a mesma essência. Sobre o Spielberg desses filmes, diz: "eu sempre acreditei que ele era um cara democrático, no sentido calhorda". Mas nas três obras mais recentes, Merten vê um diretor que compreendeu os Estados Unidos pós 11 de Setembro e faz um cinema de "reflexão à sociedade norte-americana atual", sem precisar de uma única menção direta a esse acontecimento.
O olhar crítico sobre a sociedade, a relação com as fontes, o conhecimento das especificidades do cinema como arte, sua relevância econômica e social, tudo isso fica para trás diante da reiteração da idéia que iniciou e concluiu a palestra: "Para ser jornalista de cinema ou diretor de cinema, tu tem que gostar pra caralho, mesmo, mesmo. Tem que ter um grau de envolvimento, porque é um exercício de paixão".
Walter Benjamin é modismo acadêmico; mate o pastor e as ovelhas serão dispersadas. Apenas no caráter destrutivo há possibilidade de caminho frente a um muro. O caráter destrutivo não supera barreiras, elimina com violência impensada e catártica. O caráter destrutivo é a vingança contra o falatório, meio pelo qual os homens se fazem entender. O caráter destrutivo não entende, provoca desentendimentos. Roubo cultural não é crime.
Mate o pastor e as ovelhas serão dispersadas; os oráculos são instituições destrutivas. O academicismo é uma instituição destrutiva.
Fazendo versos em Shangai os poetas brasileiros de modismo doces bárbaros divertem-se mais do que vingam-se. Um doce bárbaro com molho tártaro? Não sei, mas creio que estou pendendo para a vingança auto destrutista; você é um comunista pela cara de artista?
Gabriela W. Linck, no seu Teufelswerk, que linca pra nós.
"Nós não somos tão importantes assim." Jerônimo Teixeira, crítico de livros da Veja, começou sua palestra relativizando a importância do crítico literário. A segunda aula do curso de Jornalismo Cultural promovido pelo Centro de Estudos da revista Cult, nessa terça-feira, deu um bom panorama do cotidiano de quem tem como trabalho comentar livros. A relativização de Teixeira, no entanto, não vai muito longe: ele não deixa esquecer que a Veja é lida semanalmente por um milhão e meio de pessoas. E sobre a função do crítico, diz que ele tem de "mostrar, de alguma maneira um verniz de autoridade para o leitor", ao indicar o que ele deve ler, o que é relevante.
Essa aparente contradição é só um aperitivo do que acaba sendo cobrir literatura e livros no Brasil. Há que se fazer a diferença entre literatura e livros em casos como o do crítico da Veja, que além de ficção cobre livros de assuntos variados, como história e política. E ocupar esse cargo, na Veja, significa receber de editoras uma média de 100 livros por semana, para submeter a filtros e critérios. Em edições mais trabalhosas, são duas ou três resenhas, mais a seção Veja recomenda, com pequenos blocos de texto sobre dois ou três livros - a revista é bastante setorizada, então todo o trabalho ligado a livros fica na mão de uma pessoa só. Não ficaram muito claros quais são os critérios para a pauta de livros da Veja - falou-se muito em "interesse do leitor", o que é bastante vago no caso de uma revista que atinge um público tão genérico e difuso.
Há possibilidades variadas de cobertura da produção em livros do Brasil, claro, presas a especificidades de outros públicos e outras mídias. A palestra em parte reteve-se na rotina de trabalho daquele que é possivelmente o crítico literário mais lido do Brasil. E a dificuldade mais geral que ele enfrenta não deixa de ser a do jornalismo cultural e da crítica em geral: a crise do "homem de cultura", em favor de uma especialização cada vez maior e mais cedo. Nas palavras de Teixeira, "especialização que chega às raias da idiotia".
Livre de preocupações como a busca de novos autores e, em certa medida, das reclamações de escritores supostamente incompreendidos, restam outras dificuldades como o abismo entre o leitor que pouco ou nenhum contato teve com o mundo das letras e o iniciado, problema comum no jornalismo especializado.
Com um tom irônico presente quase o tempo todo, Teixeira se classifica como misantropo, avesso aos contatos com assessorias de imprensa (aos quais sobram petardos como "os releases são muito ruins em geral" e "eles dizem que o livro é interessantíssimo, e o livro não é nada interessante"). O olhar sobre os escritores também é de soslaio: brincando, diz que não freqüenta, sob hipótese alguma, a Vila Madalena, por questões de integridade física.
Resta a paixão pelos livros e o respeito pelos leitores. A primeira, manifestada nas indicações de leituras que pontilharam a palestra e pelo conselho dado em resposta à pergunta da platéia, sobre como avaliar os livros: "não é você quem vai matizá-los, são os livros que são matizados ou não". Frase que, ainda que discretamente, abre um caminho bastante genuíno para a crítica literária: que falem os livros.
Mentira de tudo, em tudo e por tudo. Mentira na terra, no ar, no céu, onde, segundo o Padre Vieira, o próprio céu mentia no Maranhão, e direis que hoje mente ao Brasil inteiro. Mentira nos protestos. Mentira nas promessas. Mentira nos programas. Mentira nos projetos. Mentira nos progressos. Mentira nas reformas. Mentira nas convicções. Mentira nas transmutações. Mentira nas soluções. Mentira nos homens, nos atos e nas coisas. Mentira no rosto, na voz, na postura, no gesto, na palavra, na escrita. Mentira nos partidos, nas coligações e nos blocos. Mentira dos caudilhos aos seus apaniguados, mentira dos seus apaniguados à Nação. Mentira nas instituições. Mentira nas eleições. Mentira nas apurações. Mentira nas mensagens. Mentira nos relatórios. Mentira nos inquéritos. Mentira nos concursos. Mentira nas embaixadas. Mentira nas candidaturas. Mentira nas garantias. Mentira nas responsabilidades. Mentira nos desmentidos. A mentira geral. O monopólio da mentira.
Rodrigo Amarante, vocalista, guitarrista e compositor do grupo Los Hermanos, ao ouvir a pergunta "incomoda vocês vocês serem sempre lembrados por Anna Julia?" diversas vezes, vinda de um mesmo jornalista, fala sobre o "jornalismo preguiçoso" e o "jornalismo baseado na polêmica".
Eu diria que este pode ser considerado o "momento lucidez do ano". Do Amarante, claro.
Eu não sou muito de falar da natureza, essas coisas. Mas ontem, ao deitar-me para dormir, esforcei-me para pensar nas árvores balançando com o vento lá fora, no verde da coisa toda, no frescor da coisa toda, e no friozinnho agradável que devem sentir as plantas. Isso por efeito do sono, devido à vontade tresloucada de dormir, de desligar, de turn out... Eu sou muito urbano. Se passo um dia na roça, digo, roça mesmo, sou bem capaz de enfiar o nariz no cano de descarga do caminhão mais próximo, só para sentir um pouco o cheiro da cidade. Sei o quão doentio é isso, eu sei. Mas quantos hoje não fazem assim? Valha-me!
Incrível como situações excepcionais, como o aniversário de cinco anos do 11/09, podem causar um certo desequilíbrio emocional. Sempre fui um grande crítico do trompetista norte-americano Wynton Marsalis, por seu posicionamento reacionário, despótico e nefasto em relação à história do jazz e o futuro do gênero. Ademais, acho seu estilo frio, redondinho demais, sem qualquer espaço para emoção - culpa talvez do afã de soar como os velhos mestres. Ontem, contudo, estava assistindo ao minuto de silêncio em Nova York pela CNN, e logo após Marsalis surgiu, tocando sozinho ao trompete a comovente "Just a Closer Walk With Thee", canção tradicional americana, daquelas que eles chamam de "spiritual songs" e gravada por centenas de artistas, da musa country Patsy Cline ao mestre Louis Armstrong... Não sei se pela gravidade do evento, Wynton pareceu colocar-se inteiro naquela rendição. E eu, que nunca gostei lá muito dele, senti os olhos cheios d'água.
Dias atrás estava conversando com um amigo meu de São Paulo, músico também. E dizia para ele da minha tristeza com relação à qualidade do que se toca na maioria das rádios brasileiras hoje em dia. O sentimento que tenho certamente é compartilhado por milhares de brasileiros que gostariam de não estar vendo o que aconteceu com os canais de TVs, rádios, jornais e revistas que abriram de forma escancarada as oportunidades para a divulgação, venda e apoio ao que está no mercado hoje.
Por outro lado temos as gravadoras que se renderam ao mercantilismo, ao lucro desvairado e imediato, e passaram a jogar no mercado enchuradas e mais enchuradas de uma coisa que chamam de música, com letras chulas, muitas vezes com palavras de baixo nível e muito mais. Entre um acordo espúrio aqui e outro ali, estamos sendo obrigados a assistir a este triste capítulo da nossa história musical, num país de Chiquinha Gonzaga, de Pixinguinha, Noel Rosa, Cartola, Caymmi, Elis, Guinga, Aldir Blanc, Paulinho da Viola, João Gilberto... e por aí vai. Nossos melhores frutos musicais, e cito aqui pessoas de gerações passadas e dessa nova geração, como Guinga, estão à margem das gravadoras e produtoras musicais, rádios, TVs, revistas e jornais, sites de música, blogs, etc. e tal.
Onde vamos parar com tanto lixo? O que será das gerações que hoje escutam "calcinhas pretas" e "calipsos" por todos os lados? Que tipo de formação cultural essas pessoas terão? Como será a nossa música daqui há 30 anos?
Da Ava Araujo, que divulga compositores novos e que nos convida a conhecer seu blog...