Passeando pela "blogolândia" (prefiro este nome à blogosfera), relembrei a sensação gostosa que é se perder em algo novo, mas ao mesmo tempo "velho conhecido", de tão similar à minha personalidade. Foi assim com a Internet, que amei de cara e me rendeu muitas noites mal dormidas e dias de estômago vazio (paixão no início é assim mesmo). Quando descobri o Orkut, a sensação foi menos intensa, mas da mesma família. Que delícia achar os amigos perdidos. E conhecer partes ocultas dos amigos presentes.
Dedicar atenção aos blogs também mexe com muitos pontos sensíveis: minha paixão pela tecnologia aplicada à comunicação, o fato de eu ser seduzida por este meio tão especial, a chacoalhada na imagem do velho jornalismo e nas relações em geral, a liberdade de expressão, a possibilidade de experimentação, a autonomia conquistada por quem publica...
Fico felicíssima ao identificar o que é tão particular a este novo meio de comunicação e não posso deixar de pensar em McLuhan e o seu "o meio é a mensagem". No mundo dos meios, sou mais Internet, embora adore a comodidade de leitura do veículo impresso, dentre eles o formato revista. Mas confesso que já me peguei querendo abrir link em matéria impressa, associar música, filme, cheiros e sabores a uma peça fraquinha, mas de tema bacana.
Para intermediar relações humanas, sou mais pra e-mail do que MSN (no qual a conversa perde partes e função diante de dois monólogos instantâneos), adoro um Orkut, fujo do telefone e me re-apaixonei pela "existência palpável" das cartas comuns assim que mudei de país (é, elas existem ainda e carregam sentimentos disfarçados em relatos do dia-a-dia e têm como estilo uma narrativa que considero muito gostosa).
Mas foi nos blogs que me realizei. Publicação com retorno, direito a réplica, tréplica e até "métrica". Cada endereço transpira a personalidade de seus donos. A essência vaza em cada escolha de palavra, de imagem, do nome do blog, de temas, de arranjos... É gente na versão pura, mesmo quando tentando projetar uma imagem. A tentativa de disfarçar já entrega. O blog não deixa, exige o sangue. É lindo!
Acho que demorei para reparar: mas onde está aquele texto da Bravo!, que um dia foi a revista mais bem escrita do Brasil? Tem coisas grosseiramente escritas lá dentro. Não precisava. Virou um panfletão dos programas culturais e mais nada. Leio a homenagem ao Paulo Francis que fizeram nesta última edição: tem a Sônia Nolasco em artigo excelente e o José Onofre - apesar de fora dos seus bons momentos -, mas só. Fiquei triste em constatar assim a decadência de uma revista da qual eu gostava tanto.
Harold Crick é um cara certinho. Desses neuróticos e entendiantes que os parentes chamam de "sistemático". É auditor da receita federal (nos EUA) e leva aquela vidavidavida, entendem? Daí que um dia ele vai auditar uma moça sexy e a parte comédia romântica do filme se instala.
Mas isso não é demérito. O filme é uma graça. Os efeitinhos de desenho animado são graciosos, assim como o ator e a atriz. Dustin Hoffman é que parece meio deslocado na trama, assim como o final do filme poderia ter solução melhor.
Harold Crick descobre, um dia, que é um personagem de romance. O livro ainda não está acabado e ele descobre essa loucura quando começa a escutar a voz da narradora em off. Para não pirar sozinho, procura um professor de teoria da literatura, daqueles bem ao estilo USP, e eles iniciam uma investigação cheia de piadinhas internas. Para entender os gracejos, é necessário saber um mínimo sobre o cânone literário ocidental.
Crick é convincente, já a fusão entre narrador e autor (na mesma pessoa, na mesma voz) parece atrapalhar as aulas de literatura da vida real. Vai-se explicar tudo de novo, mas depois de ver este filme, o narrador é o autor. Fazer o quê?
Paguei meia-entrada, sentei no meio da sala de projeção, comi uma trufa depois do filme e nem vou contar o final. Vale o ingresso.
Hoje de manhã(...), tentei postar alguma coisa(...) antes de viajar, mas criou-se a situação, insólita para mim, de(...) não conseguir entrar no proprio blog. Tentei postar alguma coisa como comentário e, na hora de salvar, perdi todo o conteúdo. Bem, cá estou...
Acabei de reler o O coração das trevas, de Conrad (onde se encontra, lá pelo fim do livro, a célebre exclamação "o horror, o horror..."). É certo que Conrad escreveu em inglês, que ele aprendeu depois dos vinte anos de idade. Ou seja, duvido que falasse inglês fluente. A tradução (inglês para português) é legal mas... tem alguma coisa esquisita. É algo como se um pintor habilidoso e destro machucasse a mão direita e pintasse com a esquerda.
Bem, deixa pra lá. O que eu queria dizer é que eu estava na fila do caixa do supermercado e cedi meu lugar para uma mulher grávida e logo atrás dela veio outra. As duas barrigudas se entalaram no corredor estreito, segurando bolsas e sacolas plásticas, dando umbigadas uma na outra, tentando se desvencilhar; uma agarrada ao carrinho de compras, a outra empurrando com as costas o rapaz que empacota as mercadorias e que tentava ajudar, enfiando os braços sob as axilas da segunda e tomando cuidado para não roçar a barrigona e os seios intumescidos... em certo momento as duas mulheres, ambas simpáticas, começaram a rir e uma delas falou: "oh, meu deus, que horror, que horror...!" Eu pensei: Conrad, você precisava ver isso...
Promovida pelo Centro Cultural Banco do Brasil, a mostra de cinema Olhares Neo-Realistas reúne 36 filmes do movimento italiano que influenciou o cinema moderno. Desde 03 de janeiro até o dia 28 janeiro na programação do CCBB-SP, ela entra na do CCBB de Brasília no dia 23 e se estende até 11 de fevereiro.
As principais características do Neo-Realismo são suas locações na rua, elenco de atores não-profissionais, equipes pequenas, poucos equipamentos e roteiro do cotidiano com a intenção de não ser apenas um cinema social, mas político, o que acabou gerando filmes de impacto sobre diversas cinematografias.
Mais do que fazer um panorama do movimento, a mostra também aborda suas influências e abrange desde clássicos, como Roma, Cidade Aberta, de Roberto Rossellini (1945), até extensões como Os Esquecidos, de Luís Buñuel (1950). É verdade que também apresenta filmes menores de diretores reconhecidos, como o filme de estréia de Luchino Visconti, Obsessão (1943) e Paisá (1946), do próprio Rosselini e parte da trilogia que começa com Roma, filmes povoados de clichês que parecem ter envelhecido, ao contrário de Roma e Os Esquecidos. Mas todos importantes para compreender seu contexto e principais personagens.
O diálogo do movimento com a cinematografia latino-americana estão em filmes como O Jovem Rebelde (Cuba, 1962), de Julio García Espinosa, e Os Inundados (Argentina, 1961), de Fernando Birri. Há também representantes brasileiros como O grande momento, de Roberto Santos (1958) e Agulha no Palheiro (1953), de Alex Viany.
Além da exibição dos filmes, o CCBB promove debates com historiadores, escritores e estudiosos brasileiros, além de aulas sobre o movimento. Também foi lançado um catálogo-livro com textos de diversos autores sobre o tema.
Mostra de filmes "Olhares Neo-Realistas"
Terça-feira a domingo: horários diversos
Ingressos por sessão: R$ 4,00 e R$ 2,00 (meia-entrada);
filmes exibidos em DVD têm entrada franca. Site oficial: www.bb.com.br/cultura
Horário de funcionamento da bilheteria: das 09h às 20h
Centro Cultural Banco do Brasil
Rua Álvares Penteado, 112 - Centro - SP
(próximo às estações Sé e São Bento do Metrô)
Informações: 11 3113.3651 / 3113.3652
De vez em quando alguém bom de lábia me convence a ir ao cinema. E quando eu me deixo ir, tenho a expectativa de que o filme me cause algum impacto. Que seja desses amaciados, suaves.
Na semana passada, peguei uma fila pequena e paguei meia-entrada (dei carteirada do clube de assinantes do meu provedor de Internet) para assistir a Perfume: a história de um assassino, filme baseado no best-seller do alemão Patrick Süskind. O livro chegou a ser escolhido como leitura do ano na Inglaterra em 2002. That's right, se não fosse a esquisitice absurda da coisa.
Um cara nasce com o olfato afiadíssimo e, depois de uma trajetória resistente como trabalhador braçal na França medieval, torna-se aprendiz de perfumista. Sua loucura pelos perfumes é tanta, que ele resolve estudar formas de apreender o cheiro das mulheres (das cheirosas, claro). Para fazer o melhor perfume do mundo, mata 13 delas (as notas dos acordes que formam os perfumes) e inebria uma multidão com um lencinho perfumado no dia da execução de sua sentença de morte (ficar pregado numa cruz).
Os primeiros 15 minutos de filme são interessantes. Chega a dar nojo a sugestão do fedor francês daquela época. Depois o filme vira uma viagem de nem sei que tipo de droga. Bem que o leitor do jornal do provedor tentou me avisar.
Como não sou especialista em cinema, pode ser que eu não tenha entendido nada. Pode ser que aquilo tudo seja arte puríssima. E pode ser que o filme seja mesmo ruim. Vai saber.
Vale a pena contar o final: de volta à terra natal, o assassino é comido (literalmente) pelos conterrâneos ávidos por uma carninha perfumada. Isso sem falar na cena da suruba (de causar inveja ao Calígula). Voltei para casa e continuei trabalhando.
1) Prestigiar mais a cultura nacional;
2) Não deixar que façam lavagem cerebral em mim;
3) Procurar rir menos dos outros;
4) Prestar mais atenção aos perigos dessa vida;
5) Retomar o meu lado cantor-de-banda-de-rock.
Tuca Hernandes, no seu blog, que linca pra nós (porque as explicações, e os respectivos videos no YouTube, estão lá...)
Quando eu quero comprar uma roupa, o vendedor de roupas entende de tudo. Quando eu quero comprar um carro, o vendedor de carros também entende de tudo. Mas quando eu quero comprar um livro, o vendedor de livros nunca entende do produto que ele tem que vender. O vendedor que menos conhece seu produto é o vendedor de livros.
Entrei numa livraria para pesquisar uns preços. Perguntei por A náusea, de Sartre. O rapaz consultou o sistema - coisa que eles adoram fazer - e encontrou uma cópia em uma prateleira lá no canto. Me disse o preço, eu li a contracapa e as orelhas. Ele perguntou se eu estudava Letras, eu respondi "Jornalismo". Me indaguei o porquê da pergunta, se talvez estudantes de Letras têm desconto ou se são os únicos a lerem Sartre. Mas resolvi não esticar a conversa e segui para uma segunda livraria.
Lá, perguntei para outro rapaz pelo mesmo livro. Ele também foi consultar o sistema:
- Tem H?
Eu franzi a testa:
- Como assim?
Estiquei os olhos para ler o que ele estava digitando no computador que não A náusea e "Sartre". Estava escrito "Anausea".
- Não, é "a" espaço "náusea" - informei, acabando com seu neologismo do absurdo.
Ele se corrigiu, murmurou Jean-Paul Sartre em um falso sotaque francês e me disse "só por encomenda". Suspirei e fui embora pensando que vendedores de livros têm muito a aprender com vendedores de carros ou roupas.
Eu não quero uma aula sobre Existencialismo francês quando eu for consultar um preço numa livraria, mas eu gostaria muito de ser orientado e informado sobre a obra, onde ela se encaixa no assunto, que outros títulos poderiam me ajudar na minha pesquisa. Eu gostaria que os vendedores de livros dialogassem comigo, me instigassem, me oferecessem outros produtos, assim como faz a mocinha da loja de roupas. As livrarias são formadas não por livreiros, mas por meros funcionários que consultam o sistema e buscam o livro na prateleira: operários de uma indústria em que pensar não é necessário e conhecer o produto que vende não é importante.
Isso me lembra o filme Tempos modernos, de Charles Chaplin. O sujeito se resigna a ser um mero apertador de porcas e parafusoss e não tem idéia do resultado final que sua fábrica produz, até que é literalmente engolido por uma das máquinas. O mercado das livrarias não exige de seus vendedores entendimento do assunto ou predileção pela literatura. Para trabalhar numa livraria basta saber acessar o sistema e buscar o livro na prateleira, sem criar vínculo com o cliente e sem estimulá-lo quanto a leituras semelhantes. O conhecimento é um subproduto que se compra no escuro, ao contrário de roupas e automóveis.
O mercado das "lojas de livros" seria mais esperto se percebesse que o cliente bem orientado e bem atendido sempre volta e compra mais. As livrarias não passam de espaços bem iluminados, cheios de livros nas prateleiras, com vendedores desinteressados e computadores com acesso ao sistema. E isso é muito pior nas já comuns megastores, onde os vendedores foram trocados por terminais on-line onde você mesmo acessa o tal do sistema numa tela sensível ao toque, sob um deslumbre tecnológico que não sacia carência alguma. Revolucionário mesmo é o livreiro que conhece os livros que vende, conversa com o cliente e participa de sua ânsia por conhecimento. Afinal, conhecimento não é sistema, é diálogo; não é máquina, é homem.
Mas tudo bem, não é o fim do mundo. Para mim, o mundo acaba mesmo toda vez que eu vou numa livraria e admiro a prateleira dos mais vendidos. Ali está, diante de mim, o retrato da falência do indivíduo, uma fatia da ansiedade do homem contemporâneo e um testemunho do desespero existencial que nos faz baratas tontas num mundo de ofertas coloridas e respostas ilusórias. Curiosamente, dessas respostas os vendedores de livros sabem me informar.