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27/10/2007
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Palavra na Tela – Crítica
A crítica literária, no Brasil, está em cima do muro. Não elogia, nem escracha. E não toma a dianteira sobre o mercado editorial. Convictos desta carência de valoração (na imprensa tradicional, pelo menos), os jornalistas Sérgio Rodrigues, Paulo Polzonoff e Jonas Lopes, íntimos do meio, reuniram-se na Casa Mário de Andrade, para a discussão que fecha a série A Palavra na Tela: Jornalismo, Literatura e Crítica depois da Internet, a convite de Julio Daio Borges, pelo Digestivo Cultural.
Com a internet, a própria definição de "crítica" ficou diluída. Os três convidados, já militantes da Rede, descartaram mitos e trouxeram novas questões: o que é crítica, enfim? É necessário diferenciá-la da resenha, do ensaio? O "achismo" típico do texto opinativo, que menospreza argumentos objetivos, é válido na era virtual? Ou ainda importa a técnica, a profissionalização, o embasamento cultural? A crítica na internet toma o lugar da imprensa convencional?
Ouça o áudio do encontro e confira, abaixo, as principais questões levantadas pelos profissionais na última noite da série - encerrada com quatro encontros; quatro temas distintos (interligados pela Web); doze participantes; e um saldo de informações que repercutiu na blogosfera e aqui mesmo, no Digestivo.
Os três jornalistas
Egresso do Jornal do Brasil, ex-colunista do NoMínimo e editor do Todoprosa, Sérgio Rodrigues não se considera "interneteiro". Apenas um "jornalista que usa a internet". Cobriu das editorias de esportes a cidades - até chegar à cultural. Até se tornar um jornalista autoral, sempre fez críticas literárias, esporadicamente. Também é escritor, autor de O homem que matou o escritor (Objetiva, 2000), What língua is esta? (Ediouro, 2005) e As sementes de Flowerville (Objetiva, 2006) - que comenta em entrevista
ao Digestivo. Paulo Polzonoff, por sua vez, começou a escrever em jornal e logo entrou na internet. Embora publique resenhas em seu site, não se considera um crítico. "Sou um bom leitor, gosto de dividir o que leio", define-se. Em entrevista ao Digestivo, Polzonoff conta sua trajetória. Jonas Lopes também nunca se considerou um blogueiro, embora, desde a faculdade, já treinasse na blogosfera. Para escrever com segurança sobre literatura, leu por dois anos. Os resultados vieram: Bravo!, Digestivo Cultural, Rascunho. Lopes não toma partido do meio impresso ou do virtual, mas confessa que deixou de subestimar a Rede ao conhecê-la melhor.
Processo crítico
O olhar do crítico ao ler um livro: Polzonoff assume que, se escreve, lê de forma diferente. E não perde tempo com livros que não lhe interessam. Rodrigues concorda. Lê o que gosta, até porque é impossível consumir tantos títulos. "Gosto de convencer os outros sobre a minha opinião", conta. O ex-colunista do NoMínimo, no entanto, também não se considera um crítico. Ele separa a crítica aprofundada (próxima ao ensaio) da resenha, feita pela maioria. "Não tenho problema com a palavra resenha. É esta que gosto de fazer".
Escritores medíocres
Aos estreantes que não lhe agradam, Rodrigues dedica o silêncio. "Se ninguém diz que o cara é bom, para que dizer que é ruim?". Para o jornalista, é o feedback mais justo. "Não há nada pior para um escritor do que ser ignorado pela imprensa", acredita.
Crítica neutra
Rodrigues assegura que, além de o brasileiro ser mal orientado na escolha de livros, o debate literário é muito fraco por aqui. Enquanto na internet impera uma guerra de egos - como lastima Polzonoff - no meio impresso é o contrário, segundo Rodrigues. "A imprensa está anódina. Todos os livros são 'mais ou menos' bons", queixa-se.
Rascunho e Bravo!
Polzonoff reconhece que escrevia para o Rascunho já pautado a criticar. "Era irresponsável", diz. Lopes, contudo, acha que essa irresponsabilidade tinha uma função. Ainda assim, acredita, ao tomar uma postura mais comportada, o Rascunho sobrevive sem levantar polêmicas, mas também não traz grandes questões. Já a Bravo!, segundo seu colaborador, se compromete a ser um guia, e, portanto, rejeita uma postura crítica. "Por isso é Bravo!, e não 'Vaia'", brinca Lopes. E acrescenta: quem escreve para a revista tem o leitor como mais leigo possível. Não pode abrir mão de explicações enciclopédicas, por mais óbvias que pareçam.
Rabo entre as pernas
Para Rodrigues, a imprensa não se posiciona porque é insegura. "O papel dela é dar perspectivas, ao contrário do que se vê", considera. O que, de fato, interessa (se o autor é bom ou ruim) não aparece na crítica. Na visão de Polzonoff, contudo, não é fácil assumir uma posição contundente. Corre-se o risco de sofrer sérias retaliações. "Essa responsabilidade tem um preço", desanima. Preço que, segundo ele, é alto demais.
Escritores que resenham?
Em sites como o Paralelos, é comum que autores resenhem autores. Lopes lembra que, em uma edição da EntreLivros, Daniel Galera recomendou um ex-sócio como leitura. "É apadrinhamento. Não há como dar credibilidade". Já Rodrigues - sempre ponderando as opiniões - não vê a prática com maus olhos. "Só estão ocupando um vácuo deixado pela imprensa tradicional", acredita. Mas na visão de Lopes, escritor é escritor e crítico é crítico. "Não se pode misturar os papéis", opina.
Função da FLIP
A Festa Literária de Parati teria criado um mercado inexistente - uma vitrine ao escritor - em detrimento da obra? Polzonoff acha que sim: a literatura tem seu lado pop no mundo todo. O jornalista cita o escritor JT LeRoy, cujo sucesso foi criado em cima de suas falsas memórias - abusos sexuais, drogas. De volta à FLIP, Rodrigues acrescenta que é saudável à literatura, ainda que o público freqüente as palestras para pegar autógrafos, e não para comprar o livro do autor.
Subsídios
Grupos como o Movimento Literatura Urgente querem a criação de políticas públicas para a literatura. Subsídios nessa área, na visão de Lopes, não são prioritários. "É uma arte que ocupa um espaço muito pequeno na vida das pessoas", acredita. Por outro lado, Rodrigues acha defensável que pequenos grupos, como uma companhia de dança, sejam beneficiados pelo Estado - em favor da diversidade cultural. Mas considera que a literatura não se encaixa neste caso. "Ela deve se auto-sustentar, senão, que morra".
Amores Expressos
Foi forte a polêmica em torno dos incentivos estatais que levaram 16 escritores a 16 cidades do mundo, de onde devem sair livros sobre o amor. Sobre escrever por encomenda, Rodrigues acredita que pode funcionar, embora considere um risco. "Provavelmente, os melhores livros do mundo não foram feitos dessa forma", reflete.
Crítica na internet
Espaço ilimitado e links são vantagens inexistentes nos textos impressos. É o que defende Lopes, apesar de enumerar, também, os contras do meio virtual. "Não existe um editor para te cobrar o tempo todo. E ainda há muito conteúdo disperso, sem um filtro crítico", acredita. Além disso, o jornalista defende que, apesar das deficiências da imprensa, as opiniões formadas ainda estão ali. O próprio Digestivo reproduz Daniel Piza, Sérgio Augusto, Luís Antônio Giron - nomes fortes do papel. "Os bons não vão querer escrever de graça na internet. E pouco se investe nessa parte, exceto pelos blogs da Folha e do Estadão, onde há uma estrutura por trás".
"A internet vai salvar a literatura"
É no que acredita Rodrigues, para quem o meio virtual tem condições de ocupar espaços onde a imprensa jamais esteve, mesmo no seu ápice. "O Long Tail é a melhor notícia para a literatura nos últimos 100 anos", acredita. No esquema tradicional, seria impossível uma troca tão grande de informações. "Acho que a tendência é a internet se profissionalizar em detrimento do 'dandismo', uma questão de amadurecimento". Já Polzonoff não é tão otimista. Acredita que o fluxo de informações deixa a desejar em relação aos estrangeiros e tem a impressão de que as pessoas lêem sempre as mesmas coisas na internet. "Talvez estejam se formando como leitores", cogita.
Amadorismo
Na velha imprensa, poucos escreviam como se escreve, hoje, na Rede. Como ficam, então, os critérios para uma boa crítica? O amadorismo é preocupante? Lopes questiona a existência da própria crítica profissional. "Seria muito chato ler resenhas só de profissionais", diz. E complementa que, se os que se julgam mais gabaritados soubessem tanto quanto afirmam, não escreveriam textos tão ilegíveis. Rodrigues concorda que os amadores devem botar lenha na fogueira. Funcionaria como uma seleção natural. "Quem se destacar, ficará menos amador", defende.
Bagagem cultural
Adiante, Marconi Leal, presente no debate, lamentou a falta de embasamento da crítica brasileira. Careceria de base cultural para criticar, segundo ele. Mas, para Rodrigues, as deficiências da crítica e a literatura se eqüivalem. "Livros são feitos em cima de livros, cada vez mais pobres e vazios", cutuca, especialmente os repletos de maneirismos, sempre com falsas novidades. Sentado à frente de um retrato com os protagonistas da Semana de Arte Moderna, o jornalista responsabiliza a "herança do modernismo" por esse vazio literário.
Ficção versus não-ficção
Para que um livro de ficção "aconteça" no Brasil, é preciso que seu autor seja uma celebridade ou, pelo menos, esteja envolvido em algum escândalo de peso, como comenta Rodrigues. Motivo disso, segundo Polzonoff, é a iniciação deficiente do brasileiro. "As pessoas têm trauma da literatura na escola". Talvez, daí, venha a crescente preferência por histórias reais. "Soube, por uma agente literária, que, na última Feira de Frankfurt, só queriam comprar memórias, autobiografias ou romances inspirados em histórias reais", lamenta o editor do Todoprosa, para quem é ingenuidade preferir o gênero à literatura. "Ficção não é o falso. E a não-ficção não é mais edificante só por ser real", considera. Lopes resume em outras palavras. "Resistir para que a literatura não expresse a realidade é um erro. Ela pode exprimir o real sem ser realista".
Jornalismo literário
Lopes aprecia os autores de romances de não-ficção (John Hersey, Truman Capote), mas não gosta de misturar o gênero com o jornalismo convencional. Já Rodrigues sente que as pessoas encaram o jornalismo literário como um recurso para espetacularizar o texto. "Não é por aí. Um texto pode ser seco e bom", comenta, certo de que florear o jornalismo não é uma contribuição à literatura. Lembra, também, que figuras de estilo como a elipse não podem existir no jornalismo, embora sejam um recurso freqüente na literatura.
Literatura brasileira no exterior
"A presença de nossos autores no exterior é muito fraca", lembra Rodrigues. Cita Machado de Assis como um nome importante, mas ainda desconhecido. Leituras daqui se restringem a Paulo Coelho, que embora um nome forte, não tem conexão com a produção brasileira. "É um self made man, mas pertence a um filão popular, sem qualidade, do time de Richard Bach e outros", conclui.
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"A Palavra na Tela"
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Tais Laporta
27/10/2007 às 14h51
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Aula com Suassuna
Dois países
"Existem dois paises no Brasil: um oficial e um real. O último é bom e revela seus melhores instintos, mas o outro é caricatural e burlesco. Se eu continuar vivo por muito tempo, comprovarei minha tese de que a tendência é que o oficial se torne cada vez mais grotesco."
"É um trabalho de trincheira, mas construo tijolo por tijolo o ambiente para que, se destruirem completamente o Brasil real, as outras gerações possam conhecer um pouco dele através da minha obra."
Quem sou
"Sou formado e deformado pelo Brasil oficial. Não sou ufanista, não idealizo e não admito a categoria um para outros países e a de terceiro para o Brasil."
"Nunca quis sair do Brasil. Mesmo assim, sou conhecido em diversos países."
"Me enchi de esperanças com Gorbachev, mas acredito que Boris Yeltsin oprimiu a patria de Gogol e Dostoievski."
Cultura
"Gosto médio é pior que mal gosto."
"Podemos fazer arte com nosso próprios meios. Importar ja é demais."
"O Brasil não pode abrir mão de si. A cultura é a sede e a honra da nação."
"O que é artisticamente bom não morre."
"A cultura pode muito pouco; ela não tem poder econômico ou politico. Mas tenho uma língua afiada e vou reclamar até o fim."
Idade Média
"Me atribuem frases que não pronunciei e depois dizem que estou errado. Isso é um disparate. Não quero que a Idade Média volte. O Brasil nem mesmo a teve, pois ela começou no século XVI. Qual seria a vantagem para mim, do jeito que tiro graça com padre e bispo? Eu seria queimado."
"Guimarães Rosa se inspirou no romance medieval em Grande Sertão: Veredas e a Idade Média não matou mais do que o século XX, com Hitler. Infelizmente, mortes e guerras acompanham a evolução humana. Até Bush ja contribuiu razoavelmente para esse cenário. As trevas existiram, mas não é a única característica da Idade Média."
Morte do livro
"Já profetizaram a morte de tudo. Que o cinema matou o teatro, que a TV matou o cinema e o computador vai matar o livro. Enquanto existir gente como eu, o livro irá existir. Pois como faço para ler deitado com um computador?"
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Marília Almeida
27/10/2007 às 07h03
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Fragmentação do Espaço Público
As possibilidades permitidas pelos blogs colocam-nos perante um alargamento do espaço público, no âmbito da apresentação de diferentes pontos de vista sobre determinados assuntos. Simultaneamente, a comunicação é feita de forma cada vez mais segmentada e consequentemente fragmentada. A fragmentação referida nesse livro manifesta-se sobretudo através da publicação individual permitida pelas potencialidades destas ferramentas comunicacionais e é justificada em cinco capítulos. A fragmentação do espaço público, o regresso de uma subjectividade opinativa, a relação entre blogues e jornalismo, a presença destas ferramentas nas mais diversas áreas e a emergência de novas identidades são as principais temáticas abordadas.
Blogs e a Fragmentação do Espaço Público, uma indicação da Adriana Amaral, lincando também pra nós.
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Julio Daio Borges
26/10/2007 à 00h19
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Não saia com ele
"Desde que ele entrou na minha vida, perdi meu emprego, dinheiro, familia... Ele entra na sua vida, faz mil promessas diz que vai te ajudar... Moças, não caim na labia dele!"
Marta, no Não saia com ele, uma espécie de "I will survive" da Web 2.0...
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Julio Daio Borges
25/10/2007 à 00h00
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artes, cultura e mundo da lua
Transformar a realidade. Cantar, pular, rodopiar, emocionar e seguir assim... brincando e reinventando a vida. Eis o artista e por ele nasceu o Misen-En-Scène. Um dedinho de prosa sobre as artes, a poesia do mundo. Essa mesma que salta sobre nós a todo instante.
Patrícia Rocco, apresentando o Misen-En-Scène, que linca pra nós.
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Julio Daio Borges
24/10/2007 à 00h51
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Palavra na Tela – Literatura
Embora a Casa Mário de Andrade estivesse menos cheia que na noite anterior, o terceiro encontro da série A Palavra na Tela: Jornalismo, Literatura e Crítica depois da Internet, deu a impressão de que o espaço transbordava de gente. Os responsáveis por essa sensação foram Ana Elisa Ribeiro, Ricardo Giassetti e Augusto Sales - convidados pelo Julio Daio Borges, organizador do evento pelo Digestivo Cultural.
Ficou claro que discutir literatura contemporânea não é falar apenas de livros. Livros, aliás, correm o risco de tornar-se acessórios marginais depois da internet (assim deram a entender os três participantes da noite). Não é preciso esforço para concluir que a Rede, além de ter aberto os braços para quem quer escrever, também tornou-se o carro-chefe de polêmicas sobre o suporte papel, o acesso à leitura, o direito autoral, a remuneração on-line e os novos autores. Pelo menos, esta é a opinião dos que aceitaram o abrigo virtual e fizeram dele um caminho inédito para a literatura.
Se possível, a conversa fluiria por horas. Por sorte, o Julio atentou que tratava-se de um encontro esgotável, e não de uma longa conversa de bar. Assim, evitou-se que os participantes se estendessem em descrições específicas e foi possível variar as pautas no tempo previsto. Não faltaram elogios e provocações à nova onda literária à solta na Rede - um boom, como observou o Julio.
Os três convidados soltaram a língua com a segurança de quem conhece o terreno onde pisa. Satisfeitos por terem nascido na era da internet, talvez vissem a literatura com outros olhos sem a existência da Web. Sabe-se lá o que estariam fazendo: alimentando esperanças com o papel ou simplesmente longe das letras. Sorte deles - e nossa - que o olhar da Rede para fora é otimista. A seguir, um pouco sobre eles e sobre os principais pontos do encontro. Ouça o
áudio do debate na Casa Mário de Andrade.
Ana Elisa Ribeiro - Escritora, blogueira, colunista do Estado de Minas e do Digestivo Cultural. Conheceu a internet nos primeiros chats. Já escrevia na Web, mas com certo "ciúme". Achava que seus textos se dissipariam. Passado o conflito, criou seu primeiro site, o Patife, e, depois, a Estante de livros on-line, no qual resenhava autores recém-publicados. Em 2003, foi convidada pelo Julio a fazer parte do Digestivo.
Ricardo Giassetti - Um dos fundadores da Mojo Books, projeto que transforma álbuns de música em literatura (os livros ou "mojos" podem ser baixados gratuitamente). Largou a faculdade de Direito, chegou a ter uma editora de quadrinhos (a finada Pandora), entrou para a publicidade e escreveu roteiros - sempre como autodidata. Por fim, aproveitou o potencial criativo para inventar a Mojo, hoje também uma editora.
Augusto Sales - Blogueiro e editor do site Paralelos. Iniciou-se na Rede pelo chat da UOL, já em 1996. Passou pelas ciências contábeis, sonhou com engenharia, mas acabou por criar o site Falaê em 1999, o projeto-piloto para o Paralelos, uma das primeiras iniciativas literárias da internet. O site mapeou a chamada geração "00", uma vitrine para os novos autores.
Papel para quê?
Mesmo prevendo a resposta, o Julio perguntou se o papel ainda era "o" suporte da literatura. Para provar que não, Ana Elisa lembrou que a substituição dos formatos é historicamente natural. "O livro de rolo foi substituído pelas folhas empilhadas. Hoje, o rolo só serve para diploma". Ela foi ao fim do século XV, quando
Gutenberg criou a prensa tipográfica e, assim, transformou o livro artesanal em produto de massa. Uma inovação comparada, segundo a escritora, aos sites literários, exemplos de alternativas às editoras. Augusto Sales, depois de lançar um livro a partir do Paralelos, parafraseia Beatriz Resende: "Assim como a arte abandonou a moldura, a literatura não precisa mais do suporte papel". Ricardo Giassetti lembra dos novos formatos, como o PDF e as experiências de leitura pelo celular. Conta que já precisou criar animações que simulavam o ato de virar uma página. "Um cacoete", considera.
Editoras
"É uma ilusão pensar que as editoras lerão seu original, quanto menos publicar", acredita Ana Elisa. Para ela, as casas editoriais sempre foram oligopólios que detinham a tecnologia para fazer o livro circular. "Você não precisa passar mais pela editora. É possível fazer um produto bonito e sofisticado sem essa intervenção, porque a tecnologia burlou a precariedade". Se alguém lhe perguntar se deve publicar em papel, a escritora responde: "Não deve. Faça o teste na Rede primeiro".
Falsa vitrine
Publicar em papel, nem de longe, é sinônimo de visibilidade. Para Ana Elisa, pelo contrário, significa dispersão. "O livro não aparece. Tem grande chance de ficar na última estante da livraria, lá embaixo, empoeirado. Quando não no depósito", acredita. Uma tiragem de mil exemplares estaria tão dispersa que ninguém a perceberia, como se o livro fosse uma antipublicação. Já surge a ironia: um texto de internet se desloca em qualquer direção.
Autor maior que a obra
Outra ilusão que os participantes derrubaram refere-se à obra. "É muito difícil ficar conhecido por causa de um texto publicado", acredita Giassetti. "Você sabe quem é o escritor, mas não lembra que livro ele escreveu", conta Ana. Para ter repercussão, o autor precisa viajar, dar palestras, enfim, criar algo em cima do próprio trabalho. Mas o que marca, no fim, é seu próprio nome.
Do site para o papel
"Como foi lançar um livro a partir do Paralelos?", pergunta o Julio ao editor do site. "É um complemento. Não tem jeito, livro ainda é papel, um formato que funciona bem", pondera Sales. Para justificar, contou sobre o trauma que foi, para ele, trocar LPs por CDs. (Depois Sales se conformou...) De repente, um formato que "funcionava bem" poderia deixar de funcionar. "Acho que quem já nasceu na internet não vai querer sentir o cheiro do livro", acredita.
Mojo Books
O projeto surgiu depois que Giassetti e seu futuro sócio, Danilo Corci, integrantes da mesma banda de rock, decidiram homenagear Franz Kafka e James Joyce em letras de música. "Que disco daria uma boa história?", veio o lampejo. Daí, convidaram um grupo de pessoas (não necessariamente escritores) para criar histórias a partir de álbuns musicais de que gostassem. Lançado sem pretensões, em dezembro de 2006 (com livros inspirados em Depeche Mode, New Order, Big Star e Supergrass), o projeto trouxe mais leitores que o esperado.
Retorno financeiro
A dúvida era: a internet, enfim, gera remuneração aos escritores? O fundador da Mojo Books conta que o projeto ainda não é pago. Para Ana Elisa, este assunto ainda está muito atrelado à publicidade, embora a verdadeira remuneração em dinheiro seja indireta. As oportunidades surgem de forma indireta. "Escrever na internet desencadeia uma série de coisas fora dela", conta a escritora. Aí estaria o retorno. "Ganhar dinheiro com livro é para poucos fenômenos. Mário de Andrade e João Cabral de Melo Neto publicavam com dinheiro próprio", exemplifica.
Leitores dispersos
Foi praticamente consenso que o brasileiro não lê. E não lê porque não gosta. "Tem até professor de literatura que não gosta", lembra Ana. Por esse motivo, Giassetti escolheu uma leitura fácil e fluída para os livros da Mojo, além de aproveitar o interesse do público pelas bandas, de modo a estimular a leitura. Está levando, paralelamente, o projeto Mojo Escola, que leva a técnica de composição para as salas de aula. "O objetivo é ensinar a contar o que você sentiu ao ouvir determinado disco", explica Giassetti. Para ele, não adianta forçar a criança a ler o que não gosta. Despertar a leitura é um desafio torturoso para a dispersa geração nascida na internet.
Brasileiro lê pouco
Ana Elisa lembra que o brasileiro lê uma média de dois livros por ano - já inclusos os de auto-ajuda, religiosos etc. - que, aliás, vendem bem mais que literatura. No universo literário, já pequeno, há muito Paulo Coelho, Sidney Sheldon, Agatha Christie. Aqui existe o apego material pelo livro, uma cultura do objeto de status. Importante lembrar que, em países como o Japão, é estranho guardar livros em casa. Lê-se e passa-se para outra pessoa.
Contradição
Embora o brasileiro não cultive o habito da leitura, Ana Elisa coloca um paradoxo. "O Brasil é a oitava potência editorial do mundo". Segundo a escritora, o Governo compra quantidades absurdas de livro didático para as escolas. Nas escolas, sim, estaria um verdadeiro mercado com potenciais leitores - como concordam os três convidados.
Criar o hábito
Giassetti critica severamente o uso distorcido que o brasileiro faz da leitura. "Aqui não se forma leitores. Você compra o livro mas não cria o hábito de ler". Diferente do barbeador e do cigarro, que segundo os convidados naturalmente levam ao hábito, o livro não embute a necessidade de ler no brasileiro. O problema do desinteresse, segundo Ana Elisa, é o "alfabetismo funcional": o sujeito é capaz de ler, mas não de entender. Neste sentido, a internet estimularia uma participação ativa, com direito a reações e respostas diretas. "A nova geração nunca escreveu tanto", lembra a escritora.
Geração virtual
Embora haja uma crítica ferrenha ao "internetês" (linguagem que ignora muitas regras ortográficas), segundo Ana Elisa os candidatos de vestibulinhos não utilizam a linguagem de internet nas redações. Para o editor do Paralelos, a transposição é a mesma para a linguagem oral. "A internet é uma ferramenta absurda. Sorte nossa poder acompanhar do começo e entender a mudança", afirma Giassetti.
Plágio na internet
Embora Ana Elisa receie que sua obra se disperse pela Rede sem seu conhecimento, ela acredita que existe um respeito pela autoria, na maioria dos casos. Os veículos que reproduzem já divulgam os créditos e citam o autor. A escritora lembra que a cópia sempre existiu, desde a pesquisa à Barsa (quem nunca fez isso?) até a onda da xerox. Mas Giassetti lamenta casos de reprodução sem citação de nomes ou pedido de autorização. "Ainda acham que a internet não é de verdade. A pessoa sabe que está errada, mas pensa que nunca vão descobrir. E, na maioria das vezes, não descobrem mesmo". Ana Elisa pensa numa improvável solução. "Se o livro custasse um valor que não compensasse 'xerocar', talvez valesse mais a pena comprar o original".
Escritor de internet?
Muitos escritores podem ser considerados filhotes da internet, porque foi de lá que saíram para conquistar espaço em grandes editoras. Mas a maioria não gosta da denominação. Como lembra o Julio, eles recusam o título, como se escrever na Rede tirasse o direito de profissionalização. "Não querem o rótulo porque qualquer um pode ser escritor de internet. 'E eu não sou qualquer um'", exemplifica Ana.
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"A Palavra na Tela"
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Tais Laporta
23/10/2007 às 16h30
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Cucarachas, uni-vos!
O Tordesilhas, Festival Ibero-americano de poesia contemporânea começa na terça-feira, dia 30 de outubro, e se estende até 4 de novembro em São Paulo. O encontro de poetas brasileiros e do exterior se propõe a "apresentar e discutir a produção recente de poesia na América Latina e Península Ibérica", tendo como lema "Desconstruindo a linha de Tordesilhas". E a interação vai além.
Com curadoria de Claudio Daniel e Virna Teixeira, Tordesilhas será no Caixa Cultural, mas a programação noturna vai percorrer diversos centros culturais paulistanos, como o Instituto Cervantes e a Academia Internacional de Cinema.
Trinta convidados estrangeiros, em companhia dos hermanos daqui, vão conversar sobre temas de interesse como "Revistas latino-americanas impressas e eletrônicas" (com Léon Félix Batista, Marcelo Chagas...) "Editoras independentes ibero-americanas" (Luís Serguilha, Victor López...), "Território e linguagens na web - blogs de poesia" (João Miguel Henriques, Allan Mills, Bruna Beber...). Da mesma forma que discussões sobre a poesia espanhola e portuguesa atuais, assim como acerca do lugar deste gênero na universidade.
Nota-se que Tordesilhas pretende trazer uma poesia próxima e muitas vezes desconhecida do grande público brasileiro, sendo que é uma iniciativa bastante aguardada se pensarmos, por outro lado, na boa divulgação e tradução que a nossa poesia contemporânea tem recebido em alguns países. Diversos lançamentos dentro do próprio festival demostram este reconhecimento meio às escondidas, assim como o caminho contrário: se a montanha vem até nós, nós também propomos algo a ela...
Parte da produção poética contemporânea nacional estará presente em livros com ânsia de leituras estrangeiras, a serem lançados durante o evento (dia 2 de novembro). É o caso das coletâneas de Caos Portátil, poesia contemporánea del Brasil (Cidade do México, El Billar de Lucrecia, 2007) e Antologia Vacamarela (São Paulo, 2007). Além dos livros de capa artesanal do selo Demônio Negro, com um esperado relançamento.
Caos portátil é uma edição bilíngüe português/espanhol da editora mexicana capitaneada por Rocío Cerón, a El Billar de Lucrecia. Com traduções de Camila do Valle e Cecilia Pavón, segundo Bruno Solomonoff, são "280 páginas de potencia poética, sin lugar a dudas uno de los libros más esperados de esta década. Ese continente aparte que es el Brasil, se le abrirá al lector en castellano con esta extraordinaria selección".
Se Caos traz 13 poetas, a Antologia Vacamarela, projeto do coletivo homônimo, reúne 17 poetas brasileiros com a intenção de revelar parte da jovem produção poética deste início de século. Para tanto, os textos do livro se abrem em edição trilíngüe português/espanhol/inglês. "A tradução de todo o conteúdo para o espanhol e o inglês representa um esforço de superação da barreira da língua para a poesia em língua portuguesa", anuncia o grupo.
São pequenos editoriais e parcerias entre autores e tradutores que fazem movimentar - ainda que de maneira pontual pela dificuldade da distribuição e tiragem limitada -, a literatura de hoje, sem dúvida em busca de um diálogo e um fazer aparecer-se salutar. Mas, apenas querer não basta, hoje é essencial repensar estratégias de publicação e divulgação. Rocío, em entrevista sobre difusão de poesia à revista argentina Plebella, pondera sobre a questão: "Tanto los autores como las editoriales están obligadas a repensar las formas o vías de encuentro con sus posibles consumidores. Si no estaríamos condenados a sólo leernos entre poetas, en el mejor de los escenarios posibles."
Um profundo interesse pela poesia brasileira também acontece na Argentina. Nosso vizinho Cristian De Nápoli esmiúça a poesia latino-americana, nos presenteando com os livros da coleção Black&Vermelho, sem contar o Festival latinoamericano de poesía Salida al Mar.
Evidentemente, a internet também participa deste jogo. Um dos convidados do Tordesilhas, o catalão Joan Navarro, mantém desde 1999 uma primorosa revista eletrônica dedicada à poesia, a sèrieAlfa - fulls temporals d'art i literatura.
Assim, o Festival Tordesilhas tem uma grande importância em si por ser uma iniciativa pioneira e pelo esforço de aproximação entre Brasil, os outros países da América Latina e Península Ibérica. Mas também por possibilitar um abrir de olhos especial sobre a poesia brasileira contemporânea. E a constatação é de que não se faz nada sozinho (de outra forma nem teria graça!). São os veículos colaborativos que estão fazendo a diferença.
Quem sabe construindo outras linhas, sobretudo imaginárias, curvas criativas, atravessando cordilheiras e oceanos. Seria este o mote da vez?
Para ir além:
Tordesilhas, Festival Ibero-americano de poesia contemporânea - 30 de outubro a 4 de novembro - das 9h às 21h - Caixa Cultural São Paulo - Praça da Sé, 111 - Entrada Franca.
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Elisa Andrade Buzzo
23/10/2007 às 12h56
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Arrrnaldo Jaborrr
Arnaldo Jabor é o Galvão Bueno da política e da cultura: faz lá o dele, gritando como pode e se indignando bastante, inclusive a favor. Aliás, coisa bem interessante essa de se indignar a favor. Chega a ser uma revolução na arte da polêmica: concordar com tudo, mas balançando a cabeça de um lado para o outro, dizendo "tsc, tsc, tsc".
Jabor se faz de analista da pós-modernidade, muito embora pareça que a pós-modernidade seja uma invenção dele para justificar, como sintoma, a própria verborragia, quase sempre chamuscada de erudição. E o riso vulgar a contento. E cinismo, também. E um terno desalinhado às vezes. E bastante cuspe enquanto fala.
Volta e meia, ele fala de novidades como a "des-referencialização" do real, o fim das fronteiras, a falência de utopias e ideologias. Repete o mantra (agora a gente tem que usar essa palavra, "mantra", quando fala de alguma repetição, já viram?) da inexistência de esquerda e direita, da necessidade de ultrapassar o maniqueísmo. Engraçado. Se não me falha a memória, em 82,6% de seus artigos, Jabor faz reduções do tipo "Antigamente" versus "Hoje".
E justamente sua melhor qualidade - a de ser ex-cineasta brasileiro, num País em que todo mundo é cineasta wannabe - também está indo pro brejo: ele está rodando outro filme. Sugeriram como título Eu te odeio, mas ele achou que era elogio.
Bruno Rabin, no Farsante, que linca pra nós.
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Julio Daio Borges
23/10/2007 à 00h42
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Pensar puede matar
Fabiane Lima, no seu Megalopolis, que linca pra nós.
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Postado por
Julio Daio Borges
22/10/2007 à 00h38
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Gullar no Ofício
Dia 23, terça-feira, às 19h, o Museu de Artes e Ofícios, em Belo Horizonte, recebe o poeta Ferreira Gullar para um bate-papo com o público da série Ofício da Palavra. Com curadoria do jornalista José Eduardo Gonçalves, este encontro promete ocupar todas as cadeiras do prédio da antiga estação. Entrada franca e fácil.
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Postado por
Ana Elisa Ribeiro
21/10/2007 às 18h17
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