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Quarta-feira, 11/6/2008
Blog
Redação
 
Infinitely Fascinating People

I look for something that's new and interesting. A business model that hasn't been tried before is always interesting, even if it's likely to fail. It might give my readers an idea they didn't have before. I like new ideas, even if they're not billion-dollar ideas. Interesting founders -- if you've done something interesting in the past, if you're extremely young or extremely old or from a country that doesn't generate a lot of entrepreneurs or there's something unique about the founder. But if you're a "me too" company, just a small twist on something that already exists, it's unlikely you're going to get written about.

* * *

Some people are drawn to movie stars and rock stars. To me, entrepreneurs are the interesting people in this time and our society because they drive the economy. They have whacked out marginal utilities for risk in the sense that they seem to value risk instead of trying to shy away from it. They tend to walk away from high-paying jobs to do things that are highly risky just because they want to change the world and hope to make some money even though it's very unlikely they will. That's what's drawn me to this particular beat. I love blogging just because it's a direct channel to your readers that's very raw and unfiltered.

* * *

Two-time winners are rare. Part of the reason is the best start-ups generally come from somebody needing to scratch an itch. They have a problem, and they realize there's no solution so they make it themselves. Second-time entrepreneurs usually don't have that second itch. Sometimes they don't have the hunger to prove they can do it, so maybe they don't give all they have. Now, there are exceptions. Marc Andreessen is clearly one. A lot of the Pay Pal guys have done interesting things even though they've already made a lot of money. Steve Jobs, on a much different scale, with Apple, Pixar and NeXT clearly has something. It's very rare, and those people I find infinitely fascinating.

Michael Arrington, agora uma das 100 pessoas mais influentes do planeta (porque eu já falava dele em 2006...)

[1 Comentário(s)]

Postado por Julio Daio Borges
11/6/2008 às 08h43

 
Machado de Assis e a Esperança

Era um dia bonito em Santos. Acordei cedo e comecei a pesquisar sobre o Sr. Joaquim Maria Machado de Assis, mais conhecido por Machado de Assis. Precisava pensar em algo para escrever para este Especial, que pudesse transmitir uma mensagem sem ser hipócrita comigo e enganador de leitores (em particular, os "apressados" que iriam pesquisar sobre o maior escritor brasileiro na Internet e se deparariam com o meu texto, citando-o em uma alguma ocasião, causando quem sabe alguma infeliz conseqüência).

Já adianto e explico: não sou especialista nos romances realistas machadianos. Admiro sua linguagem, aprecio sua ironia, mas não posso ir além.

Porém, nobre leitor (bem Machado, não?) você me dá licença para falar sobre uma coisa bonita?

Estava eu sentado na mesa da copa, debruçado sobre livros de literatura e, nos intervalos, lendo os contos de Machado, quando minha sogra me contou, com um ar de orgulho e nostalgia, a força de vontade que seu pai teve para sair de Portugal, emigrar para o Brasil e proporcionar uma vida confortável em Santos para sua família. Narrou-me que seu pai acordava às três horas da manhã e só fazia a primeira refeição ao meio-dia — durante esse tempo trabalhava duro em uma terra desconhecida. Veio por meio de uma carta de chamada enviada pelo seu irmão. Sua filha (minha sogra) nasceu no velho continente, e seu pai só foi conhecê-la quando ela tinha mais de 2 anos, mas, no final, tudo valeu a pena: teve uma família feliz e a certeza de que venceu.

Enquanto ela falava, lembrei da admiração que minha namorada tinha e tem pelo avô. Realmente algo mágico...

Lembrei, também, que eu, igualmente, sinto grande respeito e admiração pelos meus avós (eles ainda serão tema de grandes artigos). Todos fugiram da guerra e fincaram raízes em um país desconhecido, transmitindo seus hábitos e ensinamentos da melhor forma possível: com carinho!

Os imigrantes são parte importante do Brasil e trazem no sangue histórias de otimismo, dedicação e vontade de vencer.

Estes heróis construíram o Brasil e enriqueceram a nossa cultura. Perpetraram, subconscientemente, uma sociedade mais culta e receptiva, para novas idéias e crenças.

Mas o que tem tudo isso a ver com Machado de Assis?

Machado é uma vertente da mesma moeda. Nasceu pobre, fruto de um ex-escravo e uma lavadeira açoriana. Ficou órfão muito cedo e sofria, já na infância, de epilepsia e gaguez.

Ora, tudo isso já é mais do que razão para, pelos deterministas, chegar-se à conclusão que ou viraria "ladrão" ou "office-boy" nos tempos modernos. Talvez, um suicídio. Quem diria que se transformaria em um dos maiores ícones da literatura brasileira?

Ele, como os imigrantes, serve-nos como exemplo, orgulho e modelo a ser seguido. Raça e determinação! Dedicação e oportunismo! São essas as palavras que melhor combinam com o perfil dos verdadeiros heróis brasileiros.

Se tivéssemos uma nova onda de imigrantes e uma nova onda de "Machados", hoje, com certeza, teríamos muito mais esperança!

[1 Comentário(s)]

Postado por Daniel Bushatsky
10/6/2008 às 16h56

 
A Lua (1928)

Tarsila do Amaral, no na velocidade terrível da queda, que linca pra nós.

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Postado por Julio Daio Borges
10/6/2008 à 00h47

 
Música francesa

Ou o ska de Babylon Circus

Quem acha que a França parou no tempo, com as antigas chansons, ou descambou para a parafernália norte-americana de um soul ganido e um rap surrado, não conhece o ska. Bem peculiar, o ritmo é quente e não deixa ninguém parado. Talvez possa ser descrito como uma mistura de rap, reggae e rock, com uma pitada da chanson. Ainda assim, não dá para se ter idéia de como o ska faz a gente sacudir o esqueleto ao mesmo tempo em que veicula letras engajadas e muito bem construídas.

Em 2002, morei em Lyon e tive a oportunidade de conhecer uma das melhores bandas de ska daquele país, o Babylon Circus. Numa daquelas noites de fim de ano absurdamente frias e congelantes, fui a um pub para me esquentar e ver gente. O melhor pub de todos os tempos: L'Abreuvoir, ou numa tradução literal, "O Cocho". Um lugar apertado, rústico, sujo, cheio de gente e muito animado.

Atrás do balcão, três barmen carecas, sem camisa e tatuados por todo o torso, braços e pescoço, faziam performances, encenando dublagens de música, enquanto liberavam chopes e tequilas a toque de caixa. A música, aliás, era o que havia de melhor ali: entre um punk e um rock pesado, tocava "Milord", de Edith Piaf, e todos cantavam. Depois vinha um Zorba, o grego, e outras músicas inusitadas para aquele ambiente hard. Era um barato ver um monte de metaleiro cabeludo abraçado, dançando cancã ou cantando aquelas músicas todas.

Às 3h da manhã em ponto, podia estar o ambiente mais animado que fosse, normas da casa e do país: a música era interrompida, acendiam-se as luzes e um dos barmen tocava um sino, mandando todo mundo para casa. Só para dar aquela vontade de voltar na semana seguinte. Sinto saudades do Abreuvoir. Da minha vida em Lyon, não. L'Abreuvoir foi para mim um lugar de refúgio, catártico, onde todo o estigma da rabugice francesa ficava do lado de fora da porta. Como eu gostava daquilo! Mais autêntico do que o nosso carnaval brasileiro.

Foi no Abreuvoir que ouvi, pela primeira vez, o Babylon Circus. Uma banda de ska lionesa que faz bastante sucesso por lá e em alguns países da Europa. Aqui, infelizmente, ainda é desconhecida.

Senhoras e senhores, com vocês, Babylon Circus!



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Postado por Pilar Fazito
9/6/2008 às 10h49

 
Morando sozinha II

Quando você mora sozinha, você pode deixar tudo se acumular em bagunça e caos ao seu redor. Eu não faço isso. Não gosto de bagunça e uma casa desorganizada me dá a impressão de que minha vida está desorganizada também. Deixo acumular um pouco os afazeres, mas acabo fazendo o serviço sujo. Nas horas mais esdrúxulas, isso é verdade. Já passei pano na casa à meia-noite, por exemplo. Vou limpando o que deve ser limpo à hora em que me dá na telha (ou na véspera de receber visitas).

O fogão eu não limpo nunca. Nunca! É uma questão de honra, para mim, não limpar o fogão. Até porque quase nunca cozinho (por "Juliana cozinhar" entenda-se fazer macarrão, miojo ou capeletti). Lavo roupa em dia de chuva, jogo água na varanda e deixo ela secar sozinha, mas odeio pia suja, banheiro sujo, lixo se acumulando, coisas fora de lugar. Mas é claro que não sou assim nenhum exemplo de mulher "do lar". Não gosto de varrer (a poeira foge de mim, não sei como usar a vassoura!), não gosto de encher balde d'água e Pinho Brill e sair passando pano pela casa inteira. Quando sou obrigada a fazer isso, molho o pano, encharco com um daqueles desinfetantes cor-de-rosa bem cheirosos, enrolo tudo na vassoura e limpo a casa inteira de uma vez! Ai, não tenho paciência pra ficar nessa de "carrega o balde", "molha o pano", "torce o pano", "enrola na vassoura", "passa o pano" e, no próximo cômodo, repetir a operação. Não, não e não! Tenho coisas melhores pra fazer do que ficar carregando balde, né, gente?!

Bah, mas me dê um limpa-vidros com spray, e um paninho, que eu faço a festa! A-do-ro! Gasto quase tudo de uma vez e só não uso no piso porque eu teria que me abaixar. Mas é o serviço mais gostoso de se fazer! Pena que é caro, senão eu usaria todos os dias. Um treco daqueles é uma arma na minha mão. Uma arma contra o bolso! Dizem que, nos EUA, é fácil trabalhar de faxineira... que as patroas não exigem muito. Será que consigo uns dólares lá só limpando vidros, espelhos, box de banheiros, pias, geladeiras, azulejos? (Sim, eu uso o spray em todas essas superfícies. Ainda há pouco olhei para a máquina de lavar e quase joguei uns jatos de spray nela também, só não fiz isso porque estava ligada e funcionando... Fiquei com medo de levar um choque!)

Ju Dacoregio, no seu blog, que linca pra nós (leia também "Morar só: a melhor coisa").

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Postado por Julio Daio Borges
9/6/2008 à 00h35

 
Sex and the City, o filme



Anos e anos atrás, quando Sex and the City estava na 4ª temporada mais ou menos, eu viciei. E comecei a baixar loucamente os episódios que ainda não haviam chegado no Brasil (e eram meses de diferença!).

Nisso, uma amiga querida teve uma gravidez de risco e precisou ficar meses de cama. A solução? Sex and the City.

Fizemos alguns brunchs na casa dela, onde as mulheres ficavam literalmente a tarde de domingo vendo um episódio (ainda não lançado) atrás do outro, enquanto os meninos (por que será que vamos sempre falar "os meninos", ainda que estejamos falando de marmanjos barbados com mais de 40 anos nas costas hein?) ficavam na outra sala tocando violão e guitarra...

Um dos meninos (o marido da moça da gravidez de risco) inclusive dizia que aquilo era "Pókemon de Velha", porque ficávamos grudadas na TV a tarde toda.

Lady Rasta, no seu blog, que linca pra nós.

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Postado por Julio Daio Borges
6/6/2008 à 00h28

 
Festival da Mantiqueira

A ordem dos fatores não altera o produto (na estrada, de São Francisco Xavier para São Paulo, vim repassando a lição de matemática). Talvez acarrete mudanças nas operações de subtração e divisão. Como nem dividir nem subtrair foi a proposta do Festival da Mantiqueira, Diálogos com a Literatura, encerrado no último domingo (01/06/2008) naquele charmoso distrito do município de São José dos Campos, posso ousar e iniciar o relato do evento pela abertura de seu terceiro dia.

O festival literário ― uma inspirada e brilhante realização da Secretaria Estadual da Cultura, Prefeitura Municipal de São José dos Campos e Fundação Cassiano Ricardo, com o apoio da Livraria Saraiva e produção da Associação Paulista dos Amigos da Arte (APAA) ― teve início na sexta-feira, dia 30 de maio. Além de oficinas destinadas a professores e alunos da rede pública e para bibliotecários (previamente escolhidos para participar do evento por meio de concurso), o ponto alto do acontecimento foram as palestras abertas que contaram com a presença de escritores e gente das artes.

Sob o título de "Diálogos da Literatura", com a mediação competente de Cunha Júnior, no segundo dia (31/06), pela manhã, Suzana Amaral, Marçal Aquino e Moacyr Scliar discutiram a relação da literatura com o cinema. À tarde, pelo programa, Fernanda Takai, Nelson Motta e Zuenir Ventura visitaram as relações entre a literatura e a bossa nova. Antes deles, em carreira solo, o escritor Milton Hatoum dialogou com o público sobre suas obras, mais que premiadas (Relato de um certo Oriente, Dois Irmãos, Cinzas do Norte e Órfãos do Eldorado, todos editadas pela Companhia das Letras).

O terceiro dia (01/06) ― cuja programação vespertina, contou com um bate-papo com o escritor Marcelo Rubens Paiva e com o painel sobre as relações entre as letras e a televisão, a cargo do trio formado por Bruna Lombardi, Lauro César Muniz e Mario Prata ― foi aberto com chave de ouro. Fernando Morais discorreu sobre seu último livro, O Mago, saído do forno editorial na última sexta-feira (dia de abertura do evento Diálogos da Mantiqueira), e passado às livrarias do país em seguida.

Como todos sabem, trata-se da biografia sobre Paulo Coelho, em cima da qual Fernando Morais ― autor das elogiadas biografias sobre Assis Chateaubriand, Olga Benário e Marechal Montenegro ― trabalhou durante os últimos quatro anos. Entregue a editores espalhados por 40 países, O Mago teve sua sessão inaugural de autógrafos durante o festival de São Francisco Xavier, evento que tem todos predicados para entrar de forma definitiva na agenda cultural do Estado de São Paulo.

Mantendo a platéia encantada (além de jornalista e biógrafo exímio, Moraes tem o dom da palavra, um causeur, seguindo a velha tradição francesa de mesmerizar os ouvintes com casos e observações de espírito, dando provas que uma conversa pode ser promovida à condição de obra de arte), Fernando Morais traçou um painel sobre a realização desse seu mais recente livro.

Entre baforadas de charuto, recordou que tudo começou quando a Editora Planeta, após adquirir os direitos autorais de Na toca dos leões ― livro que relata a trajetória da agência de publicidade W/Brasil, uma das mais premiadas no mundo ―, propôs a aquisição daqueles referentes a sua próxima obra. Teria que ser, entretanto, tema de interesse além das fronteiras brasileiras. Nosso autor imaginou a biografia de Hugo Chávez. Logo, porém, soube que Bob Fernandes, também jornalista, já trabalhava sobre o assunto. Deram-lhe a idéia de escrever sobre a televisiva Xuxa, que não o entusiasmou. Veio então a sugestão de trabalhar em cima da vida de Paulo Coelho. A curiosidade sobre a pessoa subjacente ao autor mais traduzido do que o próprio Shakespeare despertou o apetite de Fernando.

Por solicitação de Morais, a Planeta escreveu ao candidato a biografado que surpreendentemente deu sinal verde para o projeto, desde que assinado por Fernando Morais. Dando início ao trabalho, Morais agendou as entrevistas com Coelho. Como condição prévia, alertou desde logo que o biografado só teria acesso ao conteúdo da biografia quando de sua publicação. Paulo Coelho concordou com a condição e marcou um encontro com seu biógrafo na Europa. Para espanto deste último, o peregrino de Compostela, hoje, além de católico praticante, um homem de uns trezentos milhões de euros, o esperava no aeroporto sem segurança, secretária, assessor ou motorista. Vestia-se, na opinião de Morais, como um padre à paisana: todo de preto, camisa, um par de calças simples, botinas de lona grossa. Nas mãos, a alça de uma prosaica mala de rodinhas. Também preta.

Fernando Morais planejara ver seu homem em ação junto ao público; por isso, na primeira parte do programa, acompanhou-o ao Oriente Médio e à Europa Central, onde na época Paulo lançava O Zahir. Em seguida, seguiu-o para observá-lo junto a seus pares, na entrega de um prêmio em Hamburgo, Alemanha, e no banquete de gala em sua homenagem, promovido pela Editora Flammarion, para comemorar sua contratação, no Chalet des Iles, restaurante requintado no Bois de Boulogne, em Paris. Por último, autor e personagem passaram juntos mais ou menos duas semanas na casa que este último mantém na cidade medieval de Saint Martin, no sul da França, próxima à fronteira da Espanha. Foram quinze dias inteiros de conversas gravadas, da manha à noite.

Ao término dessa temporada, Paulo confessou que havia feito o que sempre evitara na vida: psicanálise. Falar com tanta insistência sobre seu passado, equivaleu a um processo psicanalítico.

As gravações, depois de transcritas por uma secretária, foram lidas pelo autor que, de volta ao Brasil, passou a entrevistar todos aqueles nelas mencionados. Foram realizadas bem mais de 100 entrevistas. Uma vez que o núcleo da vida de Paulo Coelho encontrava-se no Rio de Janeiro, Fernando Morais mudou-se de São Paulo para essa cidade, por oito meses. Ele invocou a lição dada por Gabriel García Márquez, durante um dos cursos ministrados na Escola Internacional de Cinema, em Cuba: se é necessário descrever a porta de um hotelzinho em Paris, saiba quantos degraus tem a escada que vem depois dela, não importa se essa informação, no final, vai aparecer ou não. Nessa linha, por exemplo, subiu a pé os nove andares da casa de saúde onde Paulo Coelho fora um dia internado e tratado com eletrochoques, só para conferir a vista que o interno teria visto um dia: a baía de Guanabara, paraíso visto do inferno.

Por volta de 2006, Morais voltou mais uma vez à Europa para se encontrar com Coelho, que se preparava para repetir o caminho de Santiago de Compostela, vinte anos depois daquela sua primeira vez, fonte de inspiração para a escrita de O diário de um mago. Nessas alturas, Fernando já tinha aproximadamente 150 páginas escritas. Nem suspeitava que a releitura de um documento jurídico, igual em suas formalidade a tantos outros do gênero, iria colocar seu trabalho de pernas para o ar.

Relendo a cópia que lhe fora entregue do testamento de Paulo Coelho, prestou atenção em duas linhas que antes lhe haviam escapado. Tratavam-se das instruções acerca de certo baú, que devia ser incinerado fechado depois de sua morte. Morais, por telefone, perguntou o que tinha dentro dele, trancafiado a dois cadeados. A resposta veio evasiva: coisas de infância, reminiscências sem importância. Coelho aconselhou que o autor continuasse seu trabalho e não perdesse tempo, garantindo que nada seria acrescido com o conhecimento do conteúdo do baú. Depois de muita insistência ― e as negativas de seu dono contradiziam a falta de importância daquilo que ali era guardado ―, Paulo Coelho fez uma aposta com seu biógrafo: se ele descobrisse o nome do major que o interrogou no quartel em que esteve detido, em Ponta Grossa, em agosto de 1969, ele daria as chaves do baú.

Esquecendo-se de que Fernando Morais, antes de escritor e biógrafo, tinha sido um premiado repórter, Paulo Coelho o subestimou. Em menos de uma semana, com uma única pista ― o major tinha uma obturação de ouro em um dos dentes centrais ― e o auxílio de almanaques do Exército, meia dúzia de telefonemas, uma confirmação feita pelo relatório publicado sob o título "Tortura nunca mais", o major fora identificado, entrevistado e fotografado. Paulo Coelho cumpriu sua parte, dando ordens ao banco em cujo cofre guardara o par de chaves do baú no sentido de liberá-las a Fernando.

O conteúdo obrigou o autor a reconsiderar o trabalho alinhavado até então. O baú ― que era uma peça grande, daqueles antigos baús-armários, usados em viagens transatlânticas ― guardava volumes e mais volumes do diário de Paulo Coelho, escrito dos 10 aos 50 anos. Algumas páginas eram práticas, como aquelas em que o letrista e parceiro de Raul Seixas, lá pelos fins de 1960 e início de 1970, contabilizara seus ganhos quando do lançamento das gravações da dupla (uma delas rendera sete discos de ouro).

Outras eram recheadas de som e fúria, evidenciando a catábase espiritual de seu dono, que incluiu práticas de ocultismo, satanismo, sacrifício de animais e indução de uma namorada ao suicídio. Havia relatos sobre sexo pouco ortodoxo, drogas, tudo embebido em um caldo de angústias desmedidas. Contudo, diante desse conjunto, o que se destacou aos olhos de Fernando foi a determinação de Paulo em seguir aquilo que prega, quando insiste na perseverança na busca da lenda pessoal de cada um (termo que pegou emprestado do místico católico São João da Cruz): "Uma coisa é a gente ouvir que Júlia Kubitschek, mãe de Juscelino, repetia que seu filho seria presidente da República; outra coisa é ler alguém teimar em seu diário, aos 10, 11, 12 anos, que será um escritor lido em todo mundo".

No fim de sua infância, Paulo ― que era aluno do tradicional colégio jesuíta Santo Inácio, no Rio de Janeiro ― ganhou um concurso de contos e uma caneta dourada como prêmio. Ao chegar a casa, anunciou feliz para a mãe que seria escritor. Após uma tunda, recebeu como resposta que entre os 60 milhões de brasileiros da época havia um só Jorge Amado. Por isso, queria o filho engenheiro. Paulo Coelho não chegou a tanto, mas teve sucesso, ganhou dinheiro como letrista e como executivo de gravadora, nutrindo, ainda que de modo subcutâneo, seu grande sonho de ser um escritor reconhecido.

Frente a esse novo cenário, Fernando Morais sentiu-se cindido pela dúvida: incluiria esse material no livro, por um lado, sendo fiel aos fatos, mas por outro, arriscando romper a confiança daquele que passara a apreciar como pessoa? Outra hipótese seria omitir aqueles pontos em que a exposição de Paulo Coelho poderia ser excessiva. Não seria isso, contudo, uma censura? Negar aos leitores a verdade que havia emergido do baú, cujas chaves o próprio Paulo havia lhe entregado? Fernando Morais escolheu por não esconder nada.

O que o biografado pensará dessa biografia depois de lê-la? O autor ainda não sabe, uma vez que, na sexta-feira, dia 30 de maio, quando recebeu da editora os dois primeiros exemplares de O Mago, encaminhou um deles para seu personagem, em Saint Martin. Na tarde desse último domingo, a partir das três horas da tarde, Morais passou a autografar os muitos volumes que haviam chegado ao meio-dia em São Francisco Xavier. Talvez naquele momento, Paulo Coelho tivesse começado a ler o livro do qual é figura central.

Algumas coisas Fernando Morais têm como certas: no final de uma biografia, o biógrafo sabe mais da vida do biografado do que o próprio biografado, porque tem conhecimento dos acontecimentos sob todos os ângulos, uma vez que pesquisou a visão dos outros sobre o sujeito. Além disso, tem certeza que não escreverá outra biografia sobre pessoa viva. Doravante, apenas sobre mortos, de preferência há muito tempo. Durante o processo de redação, pensou várias vezes em desistir, achando que a tarefa estava além de suas forças, engordou dez quilos, ficou de barba branca e hipertenso. Citando a escritora Rachel de Queiroz, arrematou com o alerta de que escrever não é bom, bom é ter escrito.

Também é certo que o que importa é o público. Ele não teme a crítica, pois se lembra de que Nelson Rodrigues dizia que a bactéria da crítica não vai ao teatro. Parafraseando, a mesma bactéria não compra livro. Ele considera sua literatura mais para o populista Ademar de Barros do que para Fernando Henrique Cardoso: adora tomar metrô e ver gente lendo seus livros.

Debates abertos, formou-se uma fila longa para a formulação de perguntas, muitas e variadas. O que o expositor prefere: o período da pesquisa ou da escrita? Quando o biógrafo sabe que pode parar com a primeira e passar para a segunda? O fato de ser um homem de letras facilitou o diálogo com Paulo Coelho? Qual das biografias que escreveu está mais cheia de História?

O diálogo durou por mais uma hora e renderia um calhamaço de notas. A presente notícia, porém, tem que cessar por aqui. Na trilha de suas obras anteriores, principalmente das biografias que assinou no passado ― aliás, gênero que Fernando Morais relançou no Brasil ― seu O Mago será um sucesso. Pelos aplausos e comentários do público ao fim da causerie competente do autor, não é preciso de magia para se prever isso.

Nota do Editor
Eugenia Zerbini, vencedora do prêmio SESC Literatura 2004, com seu romance de estréia, As netas da Ema. Atualmente, escreve A mãe dos brasileiros, biografia romanceada da imperatriz Teresa Cristina, mulher de d. Pedro II.

[5 Comentário(s)]

Postado por Eugenia Zerbini
5/6/2008 às 11h54

 
Q and A With Jeff Bezos

"We've never done anything of real value that wasn't at least a little bit controversial when we did it. But if you want to be a pioneer, you have to be comfortable being misunderstood."

Jeff "Amazon" ­Bezos, em entrevista à Portfolio, dica do Edu Carvalho.

[1 Comentário(s)]

Postado por Julio Daio Borges
5/6/2008 à 00h35

 
Calligaris, o fenômeno

O conto do amor (Companhia das Letras, 2008, 128 págs.), de Contardo Calligaris, é sucesso. Lançado no mês de maio, recebi agora meu exemplar, que é da segunda reimpressão. O romance está nas listas de mais vendidos de sites, jornais e revistas. O autor apareceu no Roda Viva.

Dizem até que Calligaris é o novo Chico Buarque. O que, justiça seja feita aos dois, não é verdade. Pode ser que Calligaris, no futuro, tenha estilo próximo ao de Chico, mas O conto do amor, mesmo, não lembra nenhum dos três romances do carioca.

Calligaris escreveu um thriller. Bem conduzido, curto, com o personagem principal se apaixonando por uma moça que conhece na Itália, onde ambos examinam pinturas renascentistas em busca de pistas para desvendar um evento misterioso da vida do pai do mocinho, que, pouco antes de morrer, revelara ao filho ter sido ajudante do pintor clássico Sodoma. Mensagem cifrada.

Em suma, O conto do amor tem os ingredientes certos para agradar as massas, mesmo que não tenha sido feito com esse intuito.

Não há no livro, entretanto, muita coisa além do thriller. Algo de autobiográfico, sim. Mas no geral não o achei melhor, por exemplo, do que aquele Bala na agulha, de Marcelo Rubens Paiva. Que, por sua vez, não foi parar nos mais vendidos. Puro azar.

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Postado por Daniel Lopes
4/6/2008 às 16h30

 
Verdades Inconvenientes

você foi só
mais um pequeno
com o qual
eu tive de fingir

Júlia Lima, no Hay tomates!, que linca pra nós.

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Postado por Julio Daio Borges
4/6/2008 à 00h53

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Guerra dos Mascates
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Quintana de Bolso: Rua dos Cataventos & Outros Poemas
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Das Credo Eine Theologie Für Laien
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