O cenário é simples, uma mesa velha, algumas cadeiras, lençóis, uma samambaia... E o público fica em volta, próximo daquela narração ao mesmo tempo encenada. Os atores encaram com sutileza a platéia, e não é difícil ver os olhos cheios de lágrimas de muitos, co-autores daquela nova história.
Qual não foi minha surpresa ao receber o convite da fotógrafa Sissy Eiko para ir até a Vila Maria Zélia, recanto paulistano fincado na Zona Leste, e conferir a peça Dias raros. O grupo Teatro da Travessa, formado por quatro jovens atores, Francisco Wagner, Lígia Borges, Paulo Arcuri e Roberta Stein, interpreta com naturalidade a adaptação de contos retirados dos livros Dias raros e Duas tardes, do escritor paulista João Anzanello Carrascoza.
Num estilo sutil e poético, abordando diversas relações familiares, e a um só tempo com uma unidade bordada pelo delicado, pela superação ou pela desilusão, os contos de Dias raros são um capítulo à parte. Obra que encanta pelo singelo, pela finura com que reconhece e esmiúça tênues momentos entre pai e filho, irmãos e, como não poderia faltar, das desventuras amorosas.
O local de apresentação da peça, que tem orientação cênica de Luiz Fernando Marques, também é uma raridade que superou o tempo e vai começar a ser restaurada neste ano. A Vila Maria Zélia é como uma cidade em miniatura, palco de gravações de filmes a peças de publicidade. Com mais de 200 casas, ela é a primeira vila operária do Brasil e terminou de ser construída em 1917, idealizada pelo industrial Jorge Street.
Assim, é num dos galpões do antigo boticário desta cidade dentro de uma outra cidade que a peça é encenada. E onde também é possível conhecer um pouco da história da vila, com fotos e textos informativos. Dias raros fica por lá até 31 de agosto, sempre aos sábados e domingos. As reservas podem ser feitas com Lígia Borges pelo número (11) 7408-5152.
A Flip é muito mais um evento social do que literário. Muita gente implica com o evento, que é um auê, uma pequena bagunça em torno de uma experiência que é acima de tudo íntima, solitária. Não vejo muito problema nisso.
Ir à Flip não é a mesma coisa do que ler os escritores que estão falando lá, óbvio. A idéia da Flip, acho, é que pessoas interessadas em livros, em literatura, se encontrem para conversar, nas mesas oficiais ou fora delas. Conversar sobre livros não é a mesma coisa que lê-los, claro. O que não significa que seja ruim, errado.
Ao contrário: é muito saudável que a literatura seja exposta assim, publicamente, sem o ranço que costuma acompanhá-la em ambientes acadêmicos, fechados. Claro que a Flip também tem os seus momentos de afetação burocrática, que, infelizmente, este ano acompanhou a sua abertura. Mas no geral não é assim: as mesas são boas, divertidas, e os escritores — se nem sempre são os melhores, os que mais gostaríamos de ouvir — normalmente são relevantes, interessantes.
E o público da Flip não é composto exclusivamente por intelectuais, acadêmicos. O legal é que é um evento que atrai uma variedade incrível de pessoas — estudantes, bibliotecários, banqueiros, empresários, professores, etc. —, que não imagino se reunindo com facilidade em outros ambientes. E talvez esse seja o seu maior mérito: atrair pessoas gostam sinceramente de ler, mas que não por isso acham que a vida está trancada numa biblioteca.
Edu Carvalho, na provavelmente melhor definição da Flip, no seu blog (que voltou com força total).
Ele não sabia, mas eu chegava na aula virada. Não dormia, e não era vagabundagem. Vinha do trabalho. Saía por volta das seis da manhã, chegava em casa, tomava uma xícara de café preto bem forte, e ia tomar o ônibus para a aula. Chegava na faculdade lá pelas sete, não tinha uma viva alma por ali. Eu ia direto para o segundo andar, entrava na sala de aula improvisada, e ele estava ali. Muito raro ele não chegar primeiro.
Trazia uma maleta cheia de livros, quase mais peso do que era aconselhável carregar. Ele sofrera um acidente de moto uma vez, e ficara com uma seqüela num braço. Não conseguia estendê-lo completamente, mas não abria mão dos calhamaços de livros. Eu tinha a maior admiração do mundo por ele. Ainda tenho.
Eu chegava ali, sem dormir, pronta para uma manhã inerte. Pronta para ficar muda. Pronta para apenas deixar a carcaça funcionar e desligar meu cérebro de tudo. Do mundo. Eu passava as madrugadas inteiras operando como uma peça de engrenagem. Por que ali havia de ser diferente?
Mas havia ele. E eu era a primeira da turma a chegar, mas aquilo me envergonhava, porque eu não era uma aluna competente. Aplicada. De talento. Eu era igual ou pior que os demais. Descrente. Apática. Eu não iria me sobressair ali, mas isso não fazia diferença para ele. Ele me recebia com sorrisos às sete e quinze da manhã e dizia "vem aqui que eu quero te mostrar uma coisa". E espalhava páginas de jornal em cima da mesa, livros, e falava e gesticulava e defendia seus pontos de vista como a coisa mais fundamental do mundo. Como se não houvesse aquele desânimo a pairar sobre todos e inclusive sobre ele. Só que a gente se rendia, e ele não. Ele nunca. Ficava a brigar sozinho por aquilo de que não conseguia nos persuadir.
Eu não consigo expressar o quão feliz eu me sentia ao sentar ali e ficar ouvindo aquelas coisas. Aqueles papos, aquelas queixas que ele tinha do mundo e de nós. Eu seria capaz de ficar por horas ouvindo, anotando, viajando naquelas suas histórias. Por vezes, dava vontade de ir atrás do velho e perguntar se poderia segui-lo. Se ele poderia me ensinar a ser como ele. Mas acho que eu não era e, triste, me conformei.
Enfim, estou pronta para voltar para a boca da noite. Para perder de vista a luz do sol. Para esquecer por mais umas noites que o dia existe. Mas, na saída, não poderei voltar à sala de aula e ouvi-lo mais um pouco. Terei que adentrar outra sala, e admirar o silêncio.
Antes de sair da casa do meu pai, eu tive um casinho com um cara problemático. Ele me ligava todos os dias e me contava suas mazelas. O cachorro que estava doente, o céu que estava cinza e chuvoso, o emprego sem graça, o livro que havia perdido no ônibus, o vinho sujo e barato.
Inventei várias desculpas para não atender ao telefone. Inventei várias cólicas e dores de cabeça para não precisar sair com ele. Mas a culpa era minha.
Eu estendi minha mão, braços e pernas quando ele estava mal. Emprestei meu colo, meus ouvidos e minha paciência e meu jeito de "mulher compreensiva e terna". Aí deu nisso: um chiclete ― e dos mais vagabundos.
Às vezes até que ele era legal. Ou era o meu humor e as garrafas de vinho que faziam com que tudo fosse lindo e suportável. Não sei...
Morte agora ou depois? Quando você for votar, esta questão precisa estar respondida. Quando um americano for votar, a importância da resposta é quase crucial. Os Estados Unidos ainda são o grande império contemporâneo, portanto, os mais influentes, os maiores consumidores e os maiores manipuladores do mundo.
Eles comandam guerras e desmatamentos. E é justamente nas duas últimas palavras que precisa haver foco. Se você quer ver morte agora, torça por um republicano. Se você quer morte depois, torça por um democrata. Explico: republicanos preferem guerras, e os democratas preferem investimentos em outros setores da economia que não armamentos. Estes outros setores provocam poluição e desmatamentos, que geram, no futuro, morte.
Você também pode torcer pensando em dinheiro: escolha o candidato financiado pelas empresas nas quais você acredita.
Ressalto: não sou contra os EUA! Pelo contrário, os admiro. Possuem qualidade de vida e sua influência na política externa é admirável, mas que ao votar o eleitor precisa fazer uma escolha, ele precisa.
Outra coisa que me surpreende é sua democracia. O voto é indireto (no Brasil é direto) o que abre a possibilidade de um candidato com menos votos ganhar a eleição.
Mais intrigante do que isto é que em um país que já foi dividido pela escravidão, com a Ku Klux Klan ainda sendo uma "importante" organização, com cada vez mais neonazistas e neofascistas, haja a possibilidade de um afrodescente, mulçumano, assumir o cargo de imperador!
Ser rei não é fácil. Ser o rei de um país hegemônico, nem se fale. Ser um rei negro em uma época de crescentes preconceitos, nem se diga. É por isso que torço por Obama. Ele é a imagem de um povo que sabe se reciclar se quiser ficar no poder. Ele é transcendente à questão do preconceito.
Aliás, duas considerações: (i) a maioria das pessoas não sabe, muito menos os nazistas de plantão, mas no Antigo Egito a cor da pele era irrelevante. A dinastia mais importante de faraós era negra (para saber mais confira a revista National Geographic de fevereiro de 2008); (ii) não sei se vai ser a China o país que superará os EUA, mas algum dia algum país os ultrapassará ― a história nos ensina que todo império rui. É importante, porém, que absorvamos do grande líder o que é positivo, como aprendemos filosofia da Grécia, medicina do Império Otomano, e "pão e circo" dos Romanos. Dos EUA devemos aprender que a discriminação racial não pode ser levada a sério, sob pena de condenarmos o próprio imperador!
Neste sentido, se você prefere ver mortes depois, é acionista de empresas ligadas ao gabinete do imperador e, ainda por cima, não é preconceituoso, torça por Obama.
Trabalho em grupo, você começa a fazer na primeira série, e vai até o final da sua vida. Mesmo assim, sempre tem um cidadão que não sabe lidar com trabalho em grupo. As figuras típicas, geralmente, são:
* O nerd, que faz tudo o que você não sabe fazer (e muito menos quer saber como fazer); afinal, ele é nerd: tá lá pra isso.
* O finge-que-sabe, mas não sabe coisa nenhuma (apesar de ter um bom discurso).
* O boa-pinta, que cede casa, a comida e a bebida, e tem uma ligeira participação no trabalho braçal (mas ninguém vai reclamar, afinal, ele cedeu casa, comida, bebida...).
* O confete, que mais pula, grita e bagunça do que faz alguma coisa.
* O criativo, com boas idéias e propostas. (Alternando-se com o confete, mas para melhor: já que, de fato, faz o trabalho.)
* O mala, que não faz coisa nenhuma (sequer se encaixa na classificação confete): é um chato, é o que sobra, o cream cracker (da cesta de café da manhã que sua mãe ganhou).