É indiscutível como o triunfo do telefone, do avião, do automóvel. Há aliás toda uma correspondência viva e direta entre as artes de hoje e o nosso tempo tão diverso dos tempos idos.(...)
Sempre que posso, testo alguns programas voltados à creative writing (escrita criativa), uma vez que os processadores de texto normais, a princípio, não possuem como usuários alvo os escritores e roteiristas. Em geral, editores de texto comuns têm a pretensão de ser utéis a toda e qualquer pessoa, a toda e qualquer função, desde a redação de receitas de bolo até a escritura de um romance. Claro, é bom ter um processador de textos comum ― e eu tenho dois: o Writer (editor do OpenOffice) e o EditPlus (útil para editar scripts em PHP, HTML, etc.). Mas não é destes que quero tratar. Senti a necessidade de um processador voltado à "escrita criativa" quando notei a quantidade de arquivos paralelos e secundários que vou criando enquanto escrevo meu romance: um com a descrição dos personagens, outro com ideias para a trama, outro com informações surgidas no processo mesmo da escrita ― as quais não devo esquecer de forma alguma ―, outro com dados de pesquisas feitas sobre temas relevantes, e assim por diante. No correr das semanas e dos meses, me vi afogado por dezenas de arquivos em DOC, TXT, RTF e HTML, nos quais, para meu desespero, encontrei dados repetidos e redundantes. Enfim, um processador de textos comum já não me satisfazia. Como eu já utilizava editores voltados à criação de roteiros de cinema e vídeo, decidi encontrar algum útil à escritura de romances, novelas e contos. Quero falar de ao menos três.
O primeiro, e o que me pareceu mais interessante e objetivo, é o WriteItNow. É ideal para romancistas e novelistas. Com ele, você cria um projeto no qual é possível definir, em abas separadas, o perfil dos personagens, ideias gerais, anotações referentes ao andamento da trama, eventos importantes, locações e, claro, a subdivisão do trabalho em capítulos e cenas. Há ainda gráficos que mapeiam a interação dos personagens e também a ordem cronológica dos eventos e acontecimentos mais significativos. O programa é capaz de exportar o livro completo ou os capítulos individuais para arquivos RTF, TXT, HTML e PDF. É possível ainda, na versão mais recente do programa, estabelecer metas e prazos para a finalização da obra, através da escolha de um número de palavras a ser escrito diariamente. Possui até mesmo uma instância cuja função é organizar e monitorar as cópias enviadas para editoras, com datas de envio, de aprovação, de negativa etc. A interface é simples, bonita e bastante intuitiva. O programa não é gratuito, mas vale o preço.
Outro bom programa é o yWriter 5. Embora a interface não seja tão atraente e intuitiva, possui praticamente as mesmas funções do WriteItNow. Sua maior vantagem é ser gratuito e ter sido desenvolvido por um escritor de romances satíricos que também é programador ― o que significa que seu criador realmente conhece as necessidades de um autor de ficção. Sua função de becape via FTP é uma mão na roda. Na sua próxima atualização virá com a interface em português traduzida por mim.
Devido a seu minimalismo, o terceiro é o contrário dos anteriores: Dark Room. É ideal para escritores que não necessitam senão de uma tela em branco. Ou, o que é padrão neste processador, de uma tela negra com texto em "fósforo verde", uma coisa meio Matrix. Digamos que é um Notepad metido à besta. Também é gratuito. Indicado para quem escreve contos e não deseja distrações. Eu gostei.
Alottoni (@jovemnerd), Carlos Cardoso (@cardoso), Carlos Merigo (@cmerigo), Cris Dias (@crisdias) e Azaghâl (@azaghal), no Nerdcast, o melhor podcast brasileiro sobre o (inescapável) Twitter.
Lembro com a clareza da luz emitida pelos postes de rua todo o frenesi que tomou conta de São Paulo há três anos, quando a firma 1533 decidiu, com a ajuda maciça dos paulistanos, decretar feriado na cidade.
Passei o dia 15 de maio e os seguintes sem entender nada do que acontecia. À tarde, no primeiro dia, os jornais mostravam pessoas deixando o trabalho apressadas, correndo para os ônibus, como se um tsunami estivesse prestes a atingir uma cidade distante do litoral. Tudo muito estranho; mesmo assim, mantive a rotina.
Fim da tarde. Lembrei da entrega de alguns filmes na locadora. Saí de carro, acompanhado da minha namorada, temerosa de que eu andasse na rua sozinho, ainda que a caminhada fosse de apenas três quarteirões. Absurdo: quando chegamos lá, os funcionários haviam afastado o caixa, localizado no balcão perpendicular à vitrine, colocando-o do lado oposto, distante de "tiros que poderiam vir de fora", segundo o atendente.
O estranhamento crescia. Decidi aproveitar a tranquilidade e jantar na padaria-restaurante ao lado da locadora. Os funcionários ficaram irritados com a nossa presença, ansiosos para fechar as portas e cruzar os braços. Bebemos sopa. Na saída, ao lado do carro, vimos o segurança de uma empresa dormindo na calçada, sentado em uma cadeira apoiada na parede. Foi então que alguém da firma passou para deixar um recado.
Um ratataear fortíssimo quebrou o silêncio. O barulho vinha do início da rua, duma curva, sem que pudéssemos ver sua origem. O segurança que dormia acordou, subitamente caiu de lado no chão e engatinhou como um filhote de onça assustado por debaixo do portão de arame da empresa. Antes que ele conseguisse soltar as costas do portão, o suposto tiroteio se revelou: um motorista idoso, com o rosto colado ao volante, dirigia uma Brasília velha, que não primava pela qualidade do motor. Rimos até o segurança se livrar, com a ajuda de amigos, do portão que o esmagava. Voltamos para casa.
Lembro de ter sido questionado várias vezes sobre as circunstâncias que levaram a firma a decretar o toque de recolher do dia 15 de maio de 2006. E a polícia, por que não impediu? E o Estado, não deveria agir com rigor? Pena de morte, pena de morte já! E eu pensava nos detentos que tinha visto no centro de Detenção Provisória I de Guarulhos, que visitei quando era estagiário do Ministério Público, acompanhando o Promotor das Execuções Penais. Aqueles caras presos? Aqueles caras amontoados, acocorados, andando em círculos, usando drogas, sem educação formal, vivendo num quadrado de concreto, dentro da cadeia, conseguiram fechar o maior centro financeiro da América Latina com um boato?
Depois de três anos, muitas reformas foram feitas. A mais importante de todas, a ortográfica, mudou o nome da firma 1533, para 1633. Alguém se habilita a dar umas aulas de português no Centro de Detenção?