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Quarta-feira, 8/11/2006 Crítico Julio Daio Borges Como é possível haver independência da crítica se nos jornais de referência (...) o espaço da crítica musical séria se reduz cada vez mais? Como reflexo da ignorância e analfabetismo endêmico (...) hoje em dia já nem na imprensa existem elites culturais, os editores são na sua maioria jovens inábeis vindos de escolas de jornalismo, que apesar de conceitos técnicos aprendidos não aprendem o essencial: cultura onde não existe substrato, um defeito da universidade (...), também geralmente medíocre e pouco estimulante. Quem acaba na cultura são rapazes (...) que não dão para a "polítrica" ou para qualquer coisa de mais "útil" dentro do jornal ao contrário de exemplos saudosos do passado em que editores eram figuras intelectuais de referência (...). Esta falta de substrato lato leva a um destaque de certas formas de cultura, que geralmente nunca incluem a música, compartimentando conhecimentos e formas de agir perante a arte. O cinema, por exemplo, terá sempre destaque face à música, porque é mais acessível aos editores (...). A literatura também passa à frente da música numa compartimentação artística absurda e ligada sempre a carências de gosto e de formação, o que não acontece, por exemplo, na Alemanha, Inglaterra, França, Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Países Nórdicos ou Áustria e que é mais um sintoma do nosso atraso e falta de substrato. Estes editores são o espelho de administrações mercantilistas e de direções tontas, que julgam que o povo quer é massificação. A opinião política, também esta rasteira e enviezada, enxameia e contamina os jornais e consome os orçamentos. Sempre desprezando o fato básico que leva à venda real de um jornal na via pública: as notícias, notícias bem escritas, em cima da hora.(...) Um exemplo: apesar de meios técnicos avançadíssimos os jornais já não conseguem ter no dia seguinte a crítica à ópera da véspera, nem sequer em 3000 caracteres, o que é quase igual a zero.(...) Por outro lado a possibilidade de formação de públicos, no que é verdadeiramente serviço público, está totalmente arredada dos jornais. Pensa-se que o leitor é basicamente estúpido e inculto e não está interessado em coisas longas e complexas, espelho afinal de mentalidades igualmente limitadas. De fato o público é inteligente e está ávido de informação. É evidente que a escrita para um público geral sobre música clássica, por exemplo, deve explicar os contextos e ser relativamente simples, mas não significa que seja imbecilizada, ou reduzida apenas ao D. Giovanni (...) ou à porcaria inenarrável que constitui o exemplo de Anne Sophie von Otter a cantar Abba que surge em destaque em todos os jornais (...). Reduz-se a zero o espaço inteligente para a escolha dos críticos cada vez mais limitada, críticos que já nem sequer podem escolher o tema de cada artigo que vão escrever, acabando ao editor, que geralmente é uma nulidade total no assunto (e que tem na cabeça, geralmente cabeçuda, o que acha que o público quer) acabando por se exercer uma censura cultural e uma tarraxa que nivela pelo nível mais rasteiro os temas que conseguem entrar nos escassos linguados que vão sobrando aos desgraçados dos críticos. (...) As direções e edições de cultura (...) de muitos (...) jornais, acrescento eu, são incompetentes para o serviço a que se propõem. E continuo a acreditar que a crítica bem escrita e fundamentada, por longa que seja, suscita interesse do leitor, sobretudo nas classes que lêem os supostos jornais de referência, e também potencia a formação de quem não tem tanto interesse pelo assunto a priori. O público é bem mais inteligente que os editores e direções dos jornais (...) P.S. - Uma das vacas sagradas da imprensa (...) são os diretores e os editores. Nenhum jornalista, colaborador ou crítico (...) se atreve a criticar qualquer destes influentes personagens, toda a gente quer continuar a trabalhar... Creio que num blog independente se poderá abordar este assunto sem grandes problemas e é nestes pontos que a blogosfera continua a ganhar ao jornalismo puro. Henrique Silveira, em Crítico (porque parece o Brasil, mas é Portugal...) Julio Daio Borges |
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