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Sábado, 13/1/2007
Cinema em Atibaia III
Tais Laporta

Depois da última sessão de curtas brasileiros, a cidade de Atibaia entrou em clima de expectativa. Em 2007, o Festival de Atibaia Internacional Audiovisual alcançou a popularidade esperada: as mostras receberam uma quantidade considerável de espectadores e as intervenções artísticas, promovidas por uma delegação francesa, atraíram quem passava por perto. Os que circularam pelo Centro de Convenções entre uma sessão e outra puderam assistir à performance do grafiteiro Blade e do músico Khalid K., que criou sons extraordinários apenas com a voz e recursos eletrônicos.

Outra grande sensação do festival - fora as mostras de cinema - foi o show com o cantor e compositor Luiz Melodia. Com voz de veludo que lembra os grandes mestres do jazz e do blues, Melodia deitou seu repertório musical entre as quatro paredes do Cine Itá, no centro de Atibaia. Levou o público ao êxtase com as músicas "Estácio, eu e você", "Codinome beija-flor" e "Ébano". Quando encerrou a apresentação, a platéia aglomerou-se em frente ao palco, aos delírios, com pedido de bis. Melodia voltou com "Negro gato" na ponta da língua.

Antes do show, aliás, os últimos filmes da mostra competitiva vieram a público. Em termos de qualidade, a média da seleção foi razoável se comparada às sessões anteriores. O primeiro curta a rodar, no formato de vídeo, foi Tinha a gata Gioconda, de Ivan Spacek. O diretor fez um passeio nostálgico pela infância em Atibaia, por meio de colagens e recortes com fotografias, trabalho que desembocou em engraçadas criações. Entre elas, os quatro super-heróis que habitam a antiga cidade. O curta é um criativo projeto de humor.

Em seguida, o documentário Lectures percorreu os metrôs e trens da França para documentar as principais leituras dos passageiros. Flagrou momentos de introspecção e cenas curiosas, como a de uma mulher contando uma história, através de um livro, para o filho pequeno. Pautado pela imagem, o vídeo foi totalmente gravado por uma câmera de telefone celular, o que rendeu uma baixa qualidade visual. Apesar do feito experimental, não merece maiores elogios.

Já o também curta-metragem de não-ficção A resistência do vinil faz uma interessante imersão pelo universo dos que resistem em colecionar, vender ou pechinchar discos de vinil, dez anos depois de sua substituição pelo CD - e, agora, pelo DVD e pelo MP3. Capta depoimentos curiosos e engraçados e resgata memórias já esquecidas sobre o tempo em que as agulhas choravam em muitas vitrolas. Grande filme, completo e sem lacunas evidentes, foi merecidamente indicado para figurar na mostra.

Quanto ao curta De Glauber para Jirges, de André Ristum - o mesmo diretor de 14 Bis, um dos mais bem orçados da história brasileira, também exibido no Festival de Atibaia - relê trechos de cartas enviadas por Glauber Rocha ao amigo Jirges Ristum - pai do diretor - em meados dos anos 70. Mostra o olhar crítico de Glauber sobre as características brasileiras da época e presta uma homenagem aos dois amigos, ambos falecidos na década de 80. A ótica de Ristum, assim como em 14 Bis, é predominantemente emotiva. No desenrolar do filme, os movimentos de câmera são sempre atribulados e inconstantes. Pode ser definido como um documento memorável, mas não como uma obra-prima.

No caso de No princípio era o verbo, ficção de Virgínia Jorge, descortina-se um forte resgate de situações tipicamente brasileiras e há muito esquecidas pelo cinema. O roteiro desenvolve três histórias simultâneas em um dia de Carnaval, que se fundem em ritmo poético e bem-humorado. Tece uma reflexão simples, porém brilhante, sobre os mistérios do cotidiano pelo prisma de pessoas comuns. Um retrato fiel do cotidiano que se repete todos os dias no Brasil. Este, sim, um filme de sensibilidade ímpar.

O próximo curta, Deu no jornal, é uma animação que mostra as fantasias sexuais de um solitário leitor de jornal. Nos classificados, o personagem dá asas ao desejo e a lembranças eróticas. Arrancou risos da platéia, mas constrangeu algumas mães com crianças pequenas. Já o filme mais aguardado da noite, Eletrodoméstica, de Kleber Mendonça Filho, não é nenhum lampejo de genialidade, mas faz o gênero do gosto popular. Havia sido bem comentado em outros festivais. O roteiro desenvolve a relação de uma dona de casa com seus afazeres domésticos e com os recursos eletrônicos que cercam seu trabalho. Mas as cenas finais, dependendo da ótica pessoal, podem ser interpretadas como uma idéia sem graça ou como uma saída fantástica. As opiniões se dividiram.

Agora resta aguardar o resultado final da competição. O melhor curta-metragem em 35mm receberá 16 mil reais dos organizadores, mais oito mil em equipamentos de filmagem. Já o melhor vídeo recebe oito mil reais dos organizadores, mais quatro mil em equipamento. O melhor diretor, fotógrafo, ator e atriz também recebem premiações. Além do prêmio do júri, a Federação Internacional de Cineclubes vai conceder o prestigioso Troféu Dom Quixote a um dos trabalhos apresentados.

O Digestivo vai fazer um balanço, aqui no blog, dos resultados que saem esta noite.

Tais Laporta
13/1/2007 às 14h27

 

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