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Quinta-feira, 19/4/2007
Além de My fair lady
Fábio Scrivano

É animador constatar que a Broadway clássica também tem vez no Brasil. Claro que Andrew Lloyd Webber (O fantasma da ópera), Cy Coleman (Sweet charitym), John Kander (Chicago) e Stephen Sondheim (Company) são extremamente bem-vindos, mas se o país quer realmente mostrar ao público o que transformou o teatro musical americano numa das maiores glórias artísticas do século XX, é preciso voltar algumas décadas.

E enquanto as melodias de Jerome Kern ou Richard Rodgers não desembarcam por aqui, vamos celebrar a montagem de My fair lady, um dos mais adorados e bem-sucedidos musicais de todos os tempos, criação de Frederick Loewe (1901-1988, música) e Alan Jay Lerner (1918-1986, letra), este muito bem representado pelas versões do talentosíssimo Cláudio Botelho.

O currículo da dupla Lerner e Loewe é comparativamente pequeno, mas impressionante. Conheceram-se em 1942, mas seus primeiros shows (What's up? e The day before spring) estão esquecidos. O sucesso chegou com a fantasia romântica Brigadoon (1947), sobre um vilarejo escocês que só "existe" durante um dia a cada cem anos, e repleto de canções adoráveis como "Almost like being in love" e "The heather on the Hill". A versão para o cinema, filmada com Gene Kelly em 1954, foi lançada em DVD no Brasil com o título A lenda dos beijos perdidos.

Em seguida veio Paint your wagon (1951) um faroeste cuja abordagem musical apropriadamente americana ("I talk to the trees", "How can I wait", por exemplo) destoa do estilo europeu de Loewe, influenciado pelas melodiosas operetas de sua cidade natal, Viena, onde seu pai, tenor profissional, estrelou A viúva alegre (1905).

Mas foi mesmo My fair lady (1956) que inscreveu os cancionistas entre os grandes. Baseado em Pigmalião, do famoso dramaturgo inglês George Bernard Shaw, conta os esforços de um professor de fonética (Rex Harrison) para transformar uma simples florista (Julie Andrews) em uma dama da alta sociedade. Na transposição para o cinema, Oscar de melhor filme em 1965 e também disponível em DVD no Brasil, Harrison foi mantido - continuou "falando" suas canções, lamentavelmente - mas Andrews perdeu o papel para Audrey Hepburn, uma atriz graciosa que não era cantora e foi dublada. Mesmo assim, é impossível resistir ao capricho da produção e, principalmente, às riquezas melódicas e verbais de "I could have danced all night", "On the street where you live" e "I've grown accustomed to her face".

Em 1958, usando uma história similar (da escritora francesa Colette), Lerner e Loewe criaram Gigi diretamente para Hollywood, com Leslie Caron, Louis Jourdan e Maurice Chevalier nos papéis principais. Um dos últimos e mais queridos musicais do estúdio MGM, o filme foi premiado com o Oscar, assim como a belíssima canção-título.

Dois anos depois, a dupla voltou a Broadway com Camelot, outro sucesso, apesar de vários problemas durante a produção. A história do triângulo amoroso entre o Rei Arthur (Richard Burton), Guinevere (Julie Andrews) e Lancelot (Robert Goulet) ficou ainda mais emocionante ao som de "If ever I would leave you", entre outras jóias. O musical chegou ao cinema em 1967, com Richard Harris, Vanessa Redgrave e Franco Nero no elenco principal, e vale a pena procurar o DVD, distribuído pela Warner, na locadora.

A última parceria entre Lerner e Loewe foi o filme O pequeno príncipe (1973), baseado na popular fábula de Saint-Exupery e dirigido por Stanley "Cantando na chuva" Donen. A trilha não está no nível dos trabalhos anteriores da dupla, mas a sensível canção-título merece ser conhecida - o DVD também já foi lançado no país.

Depois disso, Loewe se aposentou, mas Lerner continuou em atividade. Seus shows subseqüentes foram fracassos retumbantes, apesar de algumas canções preciosas em 1600 Pennsylvania Avenue (1976), com música do maestro Leonard Bernstein, Carmelina (1979), sua terceira colaboração com o brilhante Burton Lane, e Dance a little closer (1983), co-escrito com Charles Strouse, de Annie.

No fim da vida, Alan Jay Lerner também teve problemas de ordem médica e financeira, conseqüência de uma vida sentimental turbulenta, de oito esposas. Feliz mesmo foi o casamento de suas palavras com as notas de Frederick Loewe. Dessa união, surgiram canções e musicais inesquecíveis. E o privilégio de conhecer esse legado está ao nosso alcance.

Fábio Scrivano
19/4/2007 à 01h11

 

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