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Terça-feira, 19/6/2007
Diversão
Daniel Bushatsky

Grandes autores são para poucos e bons leitores. Indicar Machado de Assis ou Dostoievski a um garoto que acabou de sair do colégio ou a um adulto sem formação sólida é o mesmo que pedir a um leigo que dirija um carro de Fórmula 1.

O exemplo pode parecer, à primeira vista, sem sentido, mas não é. Pode ser esdrúxulo, mas é proposital. Dirigir, qualquer um que faz dezoito anos sabe, mas pilotar é bem diferente: alta velocidade, perigos, inúmeros controles eletrônicos, e até pressão dos patrocinadores influenciam no decorrer de uma corrida. É necessário, portanto, treinar para conseguir.

No mesmo sentido a literatura. Para você ler os grandes clássicos são necessários muita leitura anterior, bons professores (em sentido latu), bagagem cultural e curiosidade.

A última palavra é a chave matriz. Muitas vezes os deuses da literatura escrevem em difícil linguagem, de uma outra época, e o real sentido do que estão escrevendo está tão profundo que seriam necessários mergulhadores profissionais para conseguir atingir o real significado. Isto quer dizer que sem persistência e curiosidade para saber o porquê da consagração daqueles títulos, a leitura está fadada a acabar nas primeiras páginas do livro.

Desta forma, o que mais interessa na leitura, pelo menos para mim, é a diversão. Ao ler você deve estar interessado no prazer que aquele livro tem a oferecer. Às vezes é amor, às vezes é história, às vezes entretenimento, e às vezes é pura pretensão....mas você se divertiu? Sonhou? Imaginou-se fazendo coisas incríveis?

Eu não vou a um filme do James Bond esperando ver diálogos profundos, críticas sociais ou denúncia de alguma catástrofe que está destruindo boa parte do planeta.

O mesmo acontece com os livros. Há livros de todos os tipos. Se você já leu revista em quadrinhos, Quatro Rodas, Contigo ou Veja, e intercalou estas leituras com Sidney Sheldon, Fernando Veríssimo e Nelson Rodrigues, tente agora a leitura dos seguintes livros: A escolha de Sofia, Equador e O olho mais azul.

O romance A escolha de Sofia, de William Styron, publicado em 1979, remonta um passado de preconceitos, escolhas éticas e futuro ambíguo de uma refugiada do nazismo nos EUA. A luta pela vida é terrível e uma das grandes conseqüências foram os distúrbios psíquicos que atingiram a protagonista.

Para os mais chegados em história, delicie-se com Equador, livro do português Miguel Souza Tavares, que transporta o leitor para o meio de intrigas políticas, jogos de interesse e traições amorosas. De quebra você conhece mais da história de Portugal e das colônias portuguesas de São Tomé e Príncipe, bem como da pressão inglesa de acabar com a escravatura em 1905.

O último livro é uma crítica social. Escrito pela prêmio Nobel Toni Morrison, O olho mais azul narra a devastação que o desprezo racial pode causar em uma menininha negra e pobre que é obrigada a brincar com bonecas loiras de olhos azuis. O grande problema é que ela não se identifica em nada com aqueles brinquedos à la "american way of life", mas, contrastantemente, sonha em ter olhos azuis para se afirmar neste mundo preconceituoso.

O que todos estes livros têm em comum? Possuem linguagem culta, mas não "barroca", são facilmente entendidos, e ao acabar de lê-los você com certeza terá absorvido muita cultura e algum questionamento quanto à sua visão da sociedade e de suas atitudes perante ela.

Mas não é só. Os livros sugeridos demonstram que leitura e diversão podem caminhar juntos. Ou será melhor dizer, nesta fase, engatinhar juntos?

Assim, pegue uma almofada, um cobertorzinho, um chocolate quente e boa diversão!

Daniel Bushatsky
19/6/2007 às 09h24

 

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