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Segunda-feira, 9/7/2007
A Flip como Ela é... IV
Julio Daio Borges

Geralmente escrevo meu balanço da Flip numa Coluna em separado, mas, neste ano, resolvi fechar os Posts com uma conclusão (uma solução que eu achei mais interessante). Talvez, também, porque esta Flip 2007 - a Flip em sua quinta edição - peça por uma avaliação mais do que as outras. Avaliação, aliás, que os próprios organizadores já vão realizar (imagino), mas que eu - como participante de todas as Flips desde a segunda (a de 2004) - também tomo a liberdade de realizar. E talvez minhas "liberdades", aqui, sejam um pouco exageradas, porque eu - como muitos freqüentadores da Flip - já me sinto parte da Festa Literária Internacional de Parati. Uma pretensão minha, é claro - mas algo, também, que eu tomei como um "dever" (o de avaliar), a fim de encerrar esse ciclo que é um ciclo meu, igualmente. Espero, sinceramente, que os meus comentários sejam úteis e que não sejam, sobretudo, mal interpretados.

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Senti mais do que tudo, nesta Flip 2007, a questão da repetição. Conforme escrevi aqui antes, Mia Couto, José Eduardo Agualusa e Arnaldo Jabor (que não veio mas que foi "escalado" pela programação oficial) já estiveram em outras edições da Festa. Inclusive, o sempre muito caro (a mim e ao Digestivo) Ruy Castro e, para ficar num exemplo bem específico (desse aspecto repetitivo), o Carlito Azevedo, citando, na montagem da Bia Lessa (para Beijo no Asfalto), um poema seu já lido, em outra edição da Flip. Parece que até o diretor de programação deste ano reconhece que os "grandes nomes" da literatura brasileira já vieram todos, e que as próximas edições da Flip sofrerão, cada vez mais, a síndrome do "vale a pena ver (ou ler) de novo". De fato, as unanimidades - Fonseca, Gullar, Ubaldo, até Veríssimo - são aquela meia-dúzia de três ou quatro. Mas a consagração cada vez mais conservadora do mainstream (e da mídia de massas) pode levar a Flip a se esgotar - se não se renovar (como não está se renovando, outra vez, a mídia convencional).

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Por isso, a importância das mesas com "novos autores", um ponto em que eu sempre toco (até com a organização) desde a primeira edição da Flip a que compareci. É, por exemplo, muito tímida a abordagem, na Festa, da relação - hoje, intrínseca - entre literatura e internet. Enquanto o livro sofre mutações desde que a Web foi inventada (na década de 90) - quando se discute desde a primazia do suporte papel até formatos 100% eletrônicos (como o PDF), até novos "leitores" de e-book (como o recentemente lançado Sony Reader) -, o tema não é sequer evocado na Flip. E os poucos representantes dessa geração - por exemplo, neste ano - tratam (ou trataram) de renegar o suporte internet, como se este lhes fosse até estranho ou como se assumir alguma ligação forte como ele equivalesse a fazer "menos" literatura (nos moldes tradicionais). Não digo que o impasse dos "medalhões" do Brasil (que, segundo o próprio Cassiano Elek Machado, "se esgotaram") seria resolvido - mas a injeção de sangue novo, nas veias da Flip, garantiria, igualmente, uma renovação de público.

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E para dizer que não fiquei só na teoria - e não dei sugestões práticas -, eu queria ver, por exemplo, nas próximas edições da Flip: a Ana Elisa Ribeiro e o Joaquim Ferreira dos Santos falando do renascimento da crônica na internet; o Sérgio Rodrigues (ex-NoMínimo) e o Paulo Polzonoff Jr. falando da nova crítica (também na internet); o Pedro Dória (também ex-NoMínimo) falando da cobertura on-line do atual jornalismo de guerra; a Ana Maria Brambilla e o pessoal do Overmundo discutindo o freqüentemente criticado "jornalismo colaborativo", talvez com o caríssimo Sérgio Augusto (que queria ver - ele ironicamente diz - a engenharia e a medicina "colaborativas"); o Cardoso contando como ele reinventou a Web brasileira algumas vezes, à la Miles Davis no jazz, e o mercado editorial por tabela (revelando - vale a pena, aqui, a repetição - gente como Galera, Pellizzari e Averbuck); e os Autores do Mal mostrando a tantos editores (e autores) do-it-yourself como eles conseguiram chamar a atenção do Brasil para seus livros (embora a editora Livros do Mal hoje esteja em stand-by). Enfim...

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A Elisa Andrade Buzzo, a Annita Costa Malufe e a Flávia Rocha poderiam falar de poesia no tempo da internet (em experiências acumuladas na The New Yorker, na AIC, na revista Mininas...). Aliás, o Marcelo Miranda, o Lucas Rodrigues Pires e o Carlão Reichenbach poderiam convidar outros tantos jornalistas, críticos e cineastas que estão, também, revolucionando a crítica de cinema na internet brasileira (sob os auspícios de outros críticos renomados como Inácio Araujo, na Folha). Até a "literatura feminina", eternamente execrada, poderia tratar da revolução das mulheres na blogosfera brasileira (capitaneada por autoras como Cíntia Moscovich e Ivana Arruda Leite, seguidas de perto por projetos tão variados quanto o Mothern, que foi parar no GNT, e o Desabafo de Mãe). Mesmo narrativas de viagem poderíamos encontrar numa futura Flip, a partir de nomes como Ricardo "Xongas" Freire (colunista de Época e igualmente blogueiro); e mesmo mesas de humor on-line, capitaneadas por Xico Sá (Blônicas e Editora do Bispo), Tutty Vasques (outro ex-NoMínimo) e, até mesmo, Cocadaboa e Kibe Loco (que foi parar na Globo). A internet brasileira, e suas ramificações, já é, são, um mundo à parte...

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E quem são os heróis que estão sustentando as publicações independentes que, na sua liberdade, discutem a literatura brasileira a fundo? Cadê a Flip com Rogério Pereira, editor do Rascunho, numa mesa sobre suplementos literários em papel, e com Augusto Sales, por sua vez, numa mesa sobre "agregadores" de autores eletrônicos, como o Paralelos (que revelou - pelo menos, para mim - a mesma Cecilia Giannetti, o João Paulo Cuenca da primeira Flip (e do projeto Amores Expressos), o André Sant'Anna da Flip 2006 (e do Sérgio Sant'Anna), a mesma Veronica Stigger e dezenas de outros)? E cadê o Fabrício Carpinejar, falando do primeiro curso superior de formação de escritores para o mercado brasileiro? E cadê o Michel Laub, falando das suas oficinas na mesma AIC (e dos seus livros, que já foram indicados para dois prêmios Portugal Telecom)? E cadê o Luis Eduardo Matta, às voltas com a LPB e com as suas sugestões para incentivar a leitura desde a escola? E cadê, sobretudo, uma Flip com as editoras (e os editores) que - em maior ou menor grau - apostaram nessa gente: Conrad (Rogério de Campos), Planeta, Agir (Paulo Roberto Pires) e até Companhia das Letras (Cosac Naify e mesmo Record)?

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Porque já cansou, na Flip também, a Geração 90, criticada desde a primeira edição (a de 2003) - na Folha, por Milton Hatoum e Bernardo Carvalho (críticos com conhecimento de causa e, no meu ponto de vista, acima de qualquer suspeita). A "Geração 00" - se quiserem -, a da internet, está indiscutivelmente causando uma revolução (ou uma "evolução", se preferirem) na literatura brasileira contemporânea. E o impasse - de não ter de trazer, de novo, Ferreira Gullar, Ariano Suassuna, Luís Fernando Veríssimo (eu prefiro com acento) e até Millôr Fernandes - se revolve, nas próximas Flips, com apostas e um olhar (arriscado, talvez) no futuro. É louvável ter Mário Bortolotto (com ligações no teatro), Marçal Aquino (mediando, no cinema) e até a Orquestra Imperial (tocando, na música) na Flip, nesta edição. Mas muito mais pode ser feito. Porque como disse, novamente, a Flávia Rocha, é mais um problema de "administração" do que de criação - o da literatura brasileira hoje. E porque, se a Flip não fizer, alguém certamente fará. (É, também, uma questão de tempo.) A Flip poderia sair na frente (e dar o exemplo).

Para ir além
FLIPs: 2004, 2005 e 2006

Julio Daio Borges
9/7/2007 às 19h19

 

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