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Segunda-feira, 30/7/2007 A crônica ontem, hoje e amanhã Daniel Lopes As cem melhores crônicas brasileiras (Objetiva, 2007, 360 págs.), organizado por Joaquim Ferreira dos Santos, ele próprio um dos grandes do gênero no país, embora conte com alguns textos de qualidade duvidosa e, por um motivo ou outro, tenha deixado de lado escritores fundamentais, no geral é leitura para lá de prazerosa. Nele, temos Machado de Assis escrevendo sobre "O nascimento da crônica" (o Machado cronista me diverte mais que o romancista); Lima Barreto misturando crônica e conto para nos trazer uma "Queixa de defunto", queixa contra as deploráveis condições das ruas do Rio de Janeiro (tenho um carinho todo especial para com o Lima, autor de um dos dois livros que gostei de ler no colégio, como paradidático, Triste fim de Policarpo Quaresma); Graciliano Ramos e suas palavras mágicas, que desconcertam e arrancam riso (em "Um milagre", como quem quer explicar o dito cujo, ele o ridiculariza em um único e final parágrafo); Nelson Rodrigues se insurgindo contra o "complexo de vira-latas" do brasileiro, aquele que nos faz achar que somos piores que o resto do mundo em tudo; Fernando Sabino e a crônica-fábula-conto "A invenção da laranja" (Sabino, não custa lembrar, é autor do melhor livro de crônicas da história da raça humana, A cidade vazia); o rico humor dos anos 1960, refinado em Millôr Fernandes, escachado em Stanislaw Ponte Preta; o lírico e místico Caio Fernando Abreu; o papo descontraído de Martha Medeiros, que entrou na coletânea com um só texto, mas poderia ter entrado com dez (felizmente, há livros da Martha a preços módicos na coleção pocket da L&PM). Ficaram ausentes, por conta de problemas com os direitos autorais, Manuel Bandeira e Cecília Meireles. Como qualquer seleção, esta é altamente subjetiva, como reconhece o próprio Joaquim dos Santos na introdução. Por exemplo, quem me garante que "as cem melhores crônicas brasileiras" não saíram apenas das penas de Fernando Sabino e Martha Medeiros? Mas é verdade que não faria sentido fazer um livro desses com apenas um punhado de autores. E é claro que o livro atende a requisitos mercadológicos, também. Ou será que no Norte-Nordeste não se fez e não se faz crônicas melhores que a que Caetano Veloso (sem dúvida, um grande músico e compositor) conseguiu emplacar no volume? Julio Daio Borges, aqui no Digestivo, já havia observado de passagem a presença de nomes "de consenso" como o Caetano e o Chico Buarque na obra. Fora esses percalços, não há nenhum grande demérito que não faça d'As cem melhores crônicas brasileiras um apaixonante percurso pela literatura e história nacionais. Quanto à condição da crônica no Brasil do século XXI, basta dizer que Joaquim dos Santos selecionou textos de Xico Sá, Marcelo Rubens Paiva e Tutty Vasques, mas poderia muito bem ter dado espaço a Mylton Severiano, Renato Pompeu de Toledo ou Nirlando Beirão, entre tantos outros, prova dos nove de que essa vertente literária tem futuro garantido por estas bandas. Ainda bem. Daniel Lopes |
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