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Terça-feira, 28/8/2007
Ondulações
Elisa Andrade Buzzo

No entortado da letra forjo a cidade em palavras mata-borrões. Mancha gráfica é a cidade que imprimo fora de cores na noite. No limite negro-azul entre ela e a madrugada, os autos não respeitam os sinais no horizonte. Cada buraco, cada reentrância oscilante - fratura no asfalto - na qual indiretamente me deito e logo depois sou alçada. Um observador externo certamente veria as gorduras das bochechas e dos peitos tremendo. Sobressai minha caligrafia tremida sobre a noite amortecida; ressaltam-se sinais, rugas, sulcos gelatinosos. Na velocidade da luz noturna, o ônibus bóia no espaço, sou parte dessa estrutura que levita. Ele sobe tão rápido que minha escrita se descompassa, as fachadas de metal das lojas tornam-se um risco cinza de grafite definitivo. Escrevo as cenas que desabrocham na noite, como as camélias brancas desprendem um aroma doce e enérgico. A tentativa de reter essa fragrância é inexpressiva. Na noite quente de primavera, grilos esperneiam - e a cidade omite os insetos nas verduras. A escuridão fresca absorve a tinta da caneta: papel-chupão. Existe um momento na madrugada paulistana em que o atrito se desfaz das ruas. E as letras escorrem macias e tranqüilas.

Elisa Andrade Buzzo
28/8/2007 às 14h57

 

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