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Sexta-feira, 4/7/2008
Flip 2008 ― I
Fabio Silvestre Cardoso

Para quem conhece Paraty de outras ocasiões ― menos literárias, porém não menos atraentes ― a cidade não parece estranha como a capital da literatura nesta sexta edição da Flip, que começou anteontem, dia 2, com a palestra do crítico literário Roberto Schwarcz a propósito do homenageado deste ano, o escritor Machado de Assis. Ao caminhar pela pedregosa Paraty, o que se vê é um lugar totalmente adequado aos acontecimentos ora em curso. Nas ruas, muitas são as pessoas que andam com as camisetas desta e de outras edições; o comércio local, por sua vez, fica sempre pronto a indicar quais são os produtos mais tradicionais; e mesmo nas ruas já existe um mercado informal com os produtos mais afeitos ao público que frequenta a Flip. Assim, se é comum em algumas metrópoles vendedores de CDs piratas, por aqui, em cinco minutos de passeio, é possível ser abordado pelos portadores de um audiolivro. Em outra cidade, isso seria apenas fora do comum; em Paraty, parece natural. Simples assim.

E talvez o maior atestado de que o evento, sim, pegou é não somente a mobilização, mas, também, o fato de que as crianças aderiram à Flip. Prova disso é a programação da Flipinha, que conta com a presença de pais e filhos, estes certamente mais elétricos do que aqueles; contudo, ainda assim, com alguma atenção. Foi o que se viu na apresentação de uma peça que teve início às 18h30 de quinta-feira, dia 3, com direito à música de Chico Buarque e Hino à Bandeira. A compreensão era quase nula para quem estava de fora, mas o tom era de discurso político, de consciência social. Em poucos minutos, a canção "Cálice" soava a partir das caixas de som, e os atores, no palco, performavam. De repente, palmas, muitas palmas. Parece que havia alguma mensagem de fundo. Escrevo "parece" porque, sinceramente, não deu para entender qual era a proposta ― talvez a iniciação das crianças no teatro do absurdo. Vai saber.

Um pouco distante do palco, logo na porta da tenda da Flipinha, é possível ler a mensagem de apresentação sobre a exposição de trabalhos das crianças sobre a obra de Machado de Assis. Em linhas gerais, o texto tratava de questões de fundo, como identidade e alteridade. É a partir daí que a suspeita aventada por alguns se cristaliza, ou melhor, se comprova. A edição deste ano da Festa Literária de Paraty está um tanto mais conceitual e, alguém certamente dirá, mais acadêmica. E é dentro dessa perspectiva que a presença de Roberto Schwarz na abertura faz do evento um acontecimento mais vetusto, uma vez que é um acadêmico, célebre autor de "As idéias fora do lugar", texto que pertence aos clássicos de interpretação do Brasil. Desse modo, na sua intervenção inicial, Roberto Schwarz apontou como a obra de Machado de Assis é fundamental para o entendimento do Brasil. E a palestra do pensador repisou nesses pontos, muito embora tenha se fixado em aspectos não necessariamente abordados com freqüência nos romances de Machado de Assis, como os trechos de abertura e as novas leituras sobre o autor de Memórias Póstumas de Brás Cubas.

Nesse sentido, o que se pode esperar das palestras é um debate intelectual sobre livros e literatura, sobretudo quando o tema for Machado de Assis, tendo em vista a presença de nomes como Sérgio Paulo Rouanet, Lilia Schwarcz, Flora Susskind. E mesmo quando o tema for futebol, José Miguel Wisnik e Roberto DaMatta prometem uma tabela com teor mais abstrato do que o de costume ao falar do ludopédio. E a respeito dos contadores de história, para hoje, a expectativa é a das "Formas breves" de Ingo Schultze e Modesto Carone, bem como da "Estética do Frio" de Vitor Ramil, Martín Kohan e Nathan Englander. Mais notas em breve.

Fabio Silvestre Cardoso
4/7/2008 às 11h04

 

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