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Sexta-feira, 30/4/2010 Pessoa sobre Arte Julio Daio Borges LIANA TIMM© (http://timm.art.br/) A arte livra-nos ilusoriamente da sordidez de sermos. Enquanto sentimos os males e as injúrias de Hamlet, príncipe da Dinamarca, não sentimos os nossos ― vis porque são nossos e vis porque são vis. O amor, o sono, as drogas e intoxicantes, são formas elementares da arte, ou, antes, de produzir o mesmo efeito que ela. Mas amor, sono, e drogas tem cada um a sua desilusão. O amor farta ou desilude. Do sono desperta-se, e, quando se dormiu, não se viveu. As drogas pagam-se com a ruína de aquele mesmo físico que serviram de estimular. Mas na arte não há desilusão porque a ilusão foi admitida desde o princípio. Da arte não há despertar, porque nela não dormimos, embora sonhássemos. Na arte não há tributo ou multa que paguemos por ter gozado dela. O prazer que ela nos oferece, como em certo modo não é nosso, não temos nós que pagá-lo ou que arrepender-nos dele. Por arte entende-se tudo que nos delicia sem que seja nosso ― o rasto da passagem, o sorriso dado a outrem, o poente, o poema, o universo objectivo. Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência. Bernardo Soares, ou Vicente Guedes, ou Fernando Pessoa, ele mesmo, no Livro do Desassossego. Julio Daio Borges |
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