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Quarta-feira, 17/12/2014
Escrever e defender o governo
Julio Daio Borges

Recebi a notícia de que os gastos das estatais, com publicidade em "mídias alternativas", vem crescendo nos últimos anos. Tradução: o governo do PT financia, cada vez mais, blogs estatais e revistas "independentes" como Carta Capital e Caros Amigos.

Antes de comentar, faço algumas ressalvas. Admiro a trajetória de Mino Carta na imprensa brasileira que criou, entre outras revistas, a Veja, a IstoÉ e, claro, a Carta Capital. No início dos anos 2000, a Carta Capital ajudou a divulgar o Digestivo, então sou grato a eles por isso.

Também agradeço ao Luis Nassif, que divulgou meu primeiro texto, na Folha, logo que comecei a escrever e a publicar na internet, há mais de quinze anos. Reencontrei-o, aliás, na sede da Carta Capital, no início dos anos 2000, mas nunca tive maiores contatos.

E, para completar, estive com o Paulo Henrique Amorim há quase dez anos, quando ele queria publicar um texto seu no Digestivo e me perguntou "quanto custava". Eu disse que não custava nada e que o meu "preço" era conhecê-lo. Sempre foi muito simpático comigo.

Feitas essas ressalvas, volto ao assunto: eu jamais aceitaria publicidade estatal para defender o governo. Ainda mais um governo como este que estamos vendo. Não importa o quanto estão pagando. Eu não faria por princípio.

Jornalismo é publicar o que alguém não quer que você publique. O resto é propaganda. A frase não é minha, é de George Orwell. Tem outra do Millôr: "Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados". É mais ou menos o que eu penso.

Sempre tive uma enorme dificuldade para entender a propaganda. Ou a publicidade, para ser mais exato. O Carol sempre me disse que eu fazia propaganda também, mesmo não querendo. "Quando você defende uma ideia, você está fazendo *propaganda* dela..."

Pode ser. Seguindo esse raciocínio, não tenho problema nenhum com quem defende uma causa em que acredita. E quando digo "causa", estou alargando o termo - também. Mesmo quando eu trabalhava em banco, eu acreditava nos projetos que estávamos desenvolvendo...

O problema de defender um governo, contudo, não é o mesmo de "defender" um livro, um disco ou um filme. Um governo pode empobrecer a população (através de inflação), pode destruir riqueza (vide a Petrobras na bolsa) e pode ameaçar a raça humana (vide o pós-guerra).

Fora tudo isso, acredito que quando você tem um talento, um dom, é como se você tivesse recebido um presente, com o qual você nasceu - e, portanto, você deve fazer um uso responsável dele. É como ter um super poder. É como naquela frase: com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades.

Minha conclusão é a de que um jornalista que abre mão de sua consciência para fazer propaganda de um governo corrupto não é muito diferente de uma prostituta. Sendo que esta, além de fazer mal a si, pode fazer mal ao seu cliente, e aos seus, no máximo.

Já um jornalista que vende sua pena para o partido do mensalão e para o governo do petrolão, distorce a imagem que a sociedade faz de si mesma, desinformando-a; prejudica o debate de ideias, deturpando-o; e sacrifica, em última instância, os interesses de um país, em nome de um grupo - o mesmo já condenado por "formação de quadrilha" e que tem merecido, cada dia mais, a alcunha de "organização criminosa"...

Em mais de uma década de Lula e Dilma, me decepcionei com muita gente que conheci e admirei neste meio. Não porque tenham votado no PT, o que é um direito, mas porque tenham continuado a defender seus governos com todas as barbaridades que, ano a ano, cometeram...

Os nomes que fizeram história no jornalismo brasileiro, têm comprometido o seu legado, quanto mais o tempo passa (e quanto menos eles se retratam)... Já os outros, os que nunca realizaram nada de significativo, retornarão para o anonimato (de onde nunca deviam ter saído), quando a "festa" acabar...

Não que o nosso jornalismo nunca tenha se rendido às tentações do poder. Mas já teve tempos melhores. E governos, então, nem preciso dizer...

Para ir além
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Julio Daio Borges
17/12/2014 às 16h32

 

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