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Segunda-feira, 7/11/2005 Higienópolis Julio Daio Borges Eu tenho uma ligação, digamos, umbilical com Higienópolis... Meus pais se conheceram no bairro, eu praticamente nasci no bairro. Meu pai estudou no Mackenzie. Também, meu irmão. Nestes cinco anos de existência do Digestivo, eu vim três vezes, sempre nos anos ímpares do site, e convivi, por um tempo, com o bairro. Em 2001, o Digestivo Cultural ainda era estático e eu vim basicamente para fazer um curso de ASP (Active Server Pages), no Senac da rua Dr. Vila Nova, para tornar o site mais dinâmico. 2001 era uma época de total incerteza. Eu havia saído do banco para levar a cabo o projeto do Digestivo Cultural. E perdia longas horas para que ele ficasse mais fácil de atualizar, para que eu estabelecesse um sistema de publicação, para cada colaborador, simultaneamente ao Blogger (eu não sabia do Blogger). Lembro que eu ainda me pautava pelas bancas de jornal. Descobria como enviar as newsletters (em HTML) por e-mail. Enquanto administrava os egos dos primeiros Colunistas do Digestivo Cultural... Já em 2003, eu vim com a missão de fazer um curso de PageMaker, também no Senac, tendo em vista a versão impressa do site (um projeto que desembocou na revista com a FGV no ano posterior). Eu não sabia, mas estava à frente do meu tempo. Outro dia, encontrei uma revista que é a cara do meu projeto gráfico de dois anos atrás. Em 2003, eu havia concebido uma revista em PDF, para ser lançada em 2005 (?), se fosse... Agora em 2005, eu vim para conhecer a Casa do Saber de Higienópolis (nossa Parceira), e freqüentar o curso do Luiz Felipe Pondé de Filosofia da Religião, desta vez na rua Itambé. É provável que eu não fale do curso agora. Queria falar de Higienópolis... Sempre quando eu venho para Higienópolis, assim pra andar, eu penso no meu pai. Meu pai entrou no Mackenzie, pelas minhas contas, em 1968 e saiu em 1972, para cursar Engenharia Civil. Eu sempre fico imaginando - sempre que venho - como foram aqueles anos. Acho que os anos 60 são a obsessão da minha geração. Foram anos de grande transformação como o são agora os primeiros anos deste século XXI. Também penso no meu irmão, que cursou Arquitetura, muito tempo depois, entre os anos 90 e os anos 2000 (Diego, você me desculpe se eu não sei ao certo os seus anos). Sempre penso que o meu irmão viveu aqui uma vida que eu não vivi, porque até então havíamos estudado nos mesmos colégios, na mesma faculdade (a Poli), até ele debandar pra cá. Se não me engano, o Oliver Sacks, o mesmo de Tempo de Despertar, escreve sobre as memórias que herdamos de nossos familiares, que eles nos contaram, que eles nos passaram, por contágio... Meu pai, por exemplo, sempre conta que estudou no Mackenzie, que trabalhou na rua Maria Antônia (tinha lá um Pão de Queijo) e que, por isso, não viu nada daquelas brigas contra a Faculdade de Filosofia da USP - sempre mostrada incendiada e pichada nas fotos -, que os sobreviventes inventaram, aumentaram, que no fundo não houve mesmo coisa nenhuma, etc. e tal. Meu irmão, por sua vez, quando estudava no Mackenzie, contou de uma praça de alimentação (ou equivalente) que construíram lá. Enfim, coisa sem grande importância, mas que eu fiquei imaginando como deveria ser e que finalmente vi, este ano, sem não antes pensar em quantas memórias e em quantas histórias ele tinha daquele lugar. Memórias e histórias que eu não vou compartilhar... Quando meu tio, irmão da minha mãe, veio no ano passado, eu quis andar com ele por Higienópolis. Ele nunca morou em São Paulo. Ele não sabe, como nós, da história da cidade, e, principalmente, da história recente do bairro. Eu quis percorrer toda a Maria Antônia, apontar o Mackenzie, apontar a ex-Filosofia da USP, transmitir o que eu sabia do meu pai, o que tinha lido, o que tinha ouvido do meu irmão... No fim, não houve tempo. Passamos, de carro mesmo, eu, ele e minha mãe. Ele contando a minha bisavó, muito religiosa, que eu não conheci; minha mãe contando de quando viveu sua vida de solteira - também em Higienópolis -, com minha avó; e eu apontando as coisas, tentando transmitir, em frases ou palavras, o que havia acumulado em 30 anos. Como agora, não esgotei, em poucas horas, minha relação com Higienópolis... De 2001, ficaram os Colaboradores do Digestivo Cultural. De 2003, ficaram, por vias travessas, os Parceiros. De 2005, não sei ainda o que vai ficar... Ao mesmo tempo, nunca vou parar de pesquisar sobre os anos 60, para tentar entender (ou compreender) o que os meus pais viveram (ou deixaram de viver). Do mesmo jeito, a presença dos prédios, do muro, dos portões, e daquela gente pra lá e pra cá, sempre me levará a imaginar como terá sido a época do meu irmão no Mackenzie, na sua FAU... Obrigado, portanto, ao Pondé e sobretudo à Casa do Saber, por haverem me trazido, de novo, a Higienópolis. Julio Daio Borges |
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