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Quarta-feira, 16/8/2006
Mozarteum 2006 para iniciantes
Marília Almeida

Os números da tradicional associação cultural brasileira são impressionantes. Em seu 25º ano, a associação Mozarteum, que já trouxe para o país a Filarmônica de Viena, Munique e Nova York, além da inglesa Royal Philharmonic, já realizou 894 espetáculos, 539 com artistas internacionais e 355 com nacionais, para um público que já soma quase dois milhões de pessoas. Sua temporada de 2006, que começou em maio e irá se estender até outubro, já teve 16 apresentações nas principais capitais do país.

Entidade sem fins lucrativos, apoiada por leis de incentivo a cultura e empresas privadas, visa contribuir para a difusão da música clássica em um país carente dela. Seus concertos são, por vezes, apresentados ao ar livre, o que amplia o seu acesso. Além disso, há matinês de ballet para crianças e jovens e os Concertos do Meio-Dia, realizados no MASP, ambos com entrada franca. O festival comumente também doa bolsas de estudos de cursos internacionais de verão para jovens músicos, dá cursos de história e interpretação e promove um intercâmbio entre músicos nacionais e internacionais através das master classes, onde músicos de grandes orquestras dão aulas a estudantes de música brasileiros.

A programação, mesmo focada na música clássica, é diversificada: são orquestras, solistas, grupos de música de câmara, óperas e companhias de dança. Após as alemãs Orquestra Sinfônica WDR de Colônia e Orquestra Filarmônica de Câmara de Freiburgo, esta composta por estudantes e cujo coro tocou em parceria com o Coro Barroco da Bahia; além dos grupo norueguês Solistas de Trondheim, também composto majoritariamente por jovens músicos, foi a vez do Quarteto Mitchell-Tomter-Poltéra-Leschenko se apresentar no Theatro Municipal de São Paulo nos dias 31 de julho e 1º de agosto.

O quarteto apresentou músicas de câmara, consideradas as de mais difícil deglutição por ouvidos virgens à música clássica. Ao invés de uma grande orquestra, com muitos ápices musicais que levantam e impressionam qualquer platéia, há, basicamente, o som do violino, violoncelo, viola e piano. Ficou difícil? Quem é leigo no universo regido por gênios como Mozart, Bach & Cia., mas adora este som transcendental não apenas no bip do celular, pode relaxar. O Mozarteum tem, desde 2001, o Clube do Ouvinte, uma série de palestras educativas gratuitas que são ministradas antes dos concertos da Temporada Internacional, destinadas à platéia de cada apresentação.

O maestro, compositor e pianista Sérgio Igor Chnee já logo nos situa, nos introduzindo à composição da música de câmara. Ela é, no máximo, executada por cinco músicos, todos com a mesma importância musical, ao contrário de uma grande orquestra sinfônica, onde cada um é reforçado por um conjunto musical. Esta equidade reflete até mesmo no nome do grupo. Composto por jovens músicos, a voz de sua experiência reside no violista norueguês Lars Anders Tomter, considerado um dos maiores violistas atuais. O Gigante da Viola Nórdica já se apresentou nas maiores orquestras sinfônicas mundiais e em famosos festivais. Mas, ao lado de Priya Mitchell, uma jovem violinista que toca um Balestieri de 1760, há o contraste que cria a sintonia, complementado pelo diligente violoncelo de Christian Poltera e o ágil dedilhado do piano de Polina Leschenko.

Depois de terem executado obras de Mahler, Mozart e Dvorák, em sua 2º apresentação o quarteto tocou três compositores muito diferentes entre si. O austríaco Franz Joseph Haydn é o pai do classicismo e seus trios são considerados a 2º parte mais importante de sua obra, caracterizada por contrastes sonoros. Já o alemão Johannes Brahms fazia parte do romantismo e está mais próximo de fontes clássicas como Bethoveen. Por fim, Gabriel Fauré, compositor francês, encontrou abertura para o experimentalismo, o que faz com que suas obras sejam entrecortadas de vazios sonoros propositais. Fica fácil perceber as características do minueto do quarteto ao ouvirmos CD guiados por Chnee. Ele é composto por um movimento rápido, um lento, uma dança e um segundo rápido, o gran finale.

Após a palestra, eis o concerto em si. Haydn nos é apresentado através de seu Trio nº 39 para piano, violino e violoncelo, em sol maior. Com seu violino em embate com o violoncelo e tendo o piano como fio condutor, encontramos em um mesmo movimento humor e agressividade. Já Brahms é dramático no primeiro movimento de seu Trio para piano, viola (clarinete) e violoncelo, op.114, em la menor. Há contrastes, uma conversa entre violoncelo e viola para depois se fazer presente a leveza, seguida por uma dança com muitos ápices e um final raivoso expresso pelo piano. Por fim, há o virtuosismo e melodia do Quarteto com Piano nº1, op.15, em dó menor de Fauré. Nele, o piano é o ator principal e o que vemos são fragmentos difusos, que sobem e descem para acabarem em uma fúria sóbria. E esta sobriedade se perpetua em nossos sentidos após este gran finale do quarteto.

A partir do dia 17 de setembro, a temporada que celebra os 25 anos do Mozarteum continua. Desta vez, o Parque do Ibirapuera, a Sala São Paulo, Blumenau e Rio de Janeiro receberão o violinista com trinta anos de carreira e reputação mundial Gidon Kremer. Em outubro, Rudolf Buchbinder terá apresentação única na Sala São Paulo, onde mostrará um pouco de sua extensa obra de cerca de cem discos e, por fim, a soprano inglesa Dame Felicity Lott, que já trabalhou com quase todas as maiores orquestras e festivais mundiais, se apresentará em dois dias, também na Sala São Paulo*.

*programação sujeita a alterações

Marília Almeida
16/8/2006 às 23h17

 

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