"São três horas, é domingo", e pergunto: o que você está fazendo? Mas nem preciso arquitetar muito a resposta, pois aposto que sua televisão está ligada: Faustão ou futebol?
Isso é aflitivo.
E neste outro trecho de uma música de Gil, que sensação te passa?: "Ele falava nisso todo dia, a herança, a segurança, a garantia".
Para mim, a resposta é simples. Estamos perdidos em um comodismo. Discutimos os mesmos problemas há décadas. As questões deveriam ser outras. As preocupações nem se fala. Porém continuamos com os mesmos problemas, que sequer identificamos.
O movimento tropicalista, do qual fez parte Gil, entre outros músicos, e que inspirou este artigo, deveria ser transmitido pelo Estado, a cada recém-nascido, por meio de uma vacina, que em seu conteúdo teria um vírus, imune a qualquer tipo de tratamento, independente da nacionalidade do sujeito. Esse vírus incitaria o debate, a discussão, a ânsia pelo novo. Quebraria paradigmas e criticaria o estereótipo.
Reparem que não estou falando só de novas letras, arranjos musicais ou roupas, gostaria que este vírus estivesse espalhado em todas as áreas do conhecimento humano.
Os reacionários me xingarão, mas não vejo o porquê. Chocar não é necessariamente ruim. Pelo contrário, estaremos "somente" saindo do rótulo posto e imposto pela sociedade, que seguimos sem ao menos questionar.
Outra coisa: os reacionários estão, por acaso, com "medinho" do desenvolvimento? Mudanças são imprescindíveis, e quebras de modelo podem assombrar em um primeiro momento, mas depois percebemos como são necessárias para sairmos do Mito da Caverna, descrito por Platão.
Besta é tu, se não acordar!
Mas, para mim, o melhor mesmo deste vírus seria que ele curaria uma de minhas grandes angústias da vida, que passo a socializar agora: sinto um arrepio todos os domingos ao voltar da praia, pela rodovia Mogi-Bertioga, adentrar na cidade de Mogi das Cruzes e ver sempre a mesma cena, pessoas reunidas em bares feios e caindo aos pedaços, cerveja na mesa e televisão ligada.
Pronto, a depressão bate. Vejo nesta viagem, que faço desde pequeno, uma sociedade carente culturalmente e, portanto, alienada.
É verdade que a culpa não é exclusiva deles. Há poucas opções de entretenimento. O governo não cria parques, não incentiva o teatro comunitário, nem faz sessões de cinema gratuitas. Também é verdade que a raiz está na pouca afloração intelectual incitada na infância do brasileiro, sendo que tal deficit deveria ser suprido principalmente na escola, o que, infelizmente, não é.
A mediocridade é a pior faceta da humanidade. Eu gosto de novidades. Para isso, precisamos do vírus do tropicalismo. Precisamos de empreendedores, sem medo do novo e das críticas que ele fatidicamente gerará!
Nossa Daniel, me apaixonei pelo texto. E, sim, essa idéia da vacina anti-ignorância é muito criativa... uma crítica de peso e fundamental!
Vejo quanto a isso, que os fausteiros e futeboleiros de plantão da televisão, são marionetes de um sistema que não se interessa pela independência sócio-cultural alheia. Cegos como no mito, porém real!
Penso, logo existo.
Com sua célebre frase, certamente hoje Descartes pegaria muita gente de calças curtas, pois pensar tornou-se um exercício por demais "doloroso". Numa sociedade consumista onde tudo já vem pronto, pensar pra quê? (diria a grande maioria). Mas o Daniel tem razão. Talvez seja hora de repensarmos novamente as atitudes que fizeram de nós o que somos e nos amarmos e nos transformarmos não mais nos conformarmos com o mundo. Nota dez, Daniel!!