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Sexta-feira,
8/4/2005
Muitos amores
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Hélio Pellegrino foi um furacão. Em 64 anos de uma vida apaixonada, sempre a mil, desarrumou certezas em psicanálise, política e poesia. Tinha um único objetivo, quase obsessão: lutar pela libertação de tudo o que, sendo imposto ao Homem, o faz sofrer e apequena sua vida. Da Igreja, exaltava seus valores fundadores e descartava o moralismo clerical. Na política, recusava com a mesma veemência a opressão social e o dogmatismo dos partidos. Da poesia, na qual não se realizou plenamente, queria o ímpeto e o derramamento, jamais a glória besta da vida literária. Na psicanálise, finalmente, tentava a síntese de tudo isso, com a idéia de abrir o divã a rico e pobre, unidos na sua generosa convicção de que libertar-se interiormente não é privilégio, mas direito fundamental, passo decisivo para um existência digna.
Na carteira de trabalho, o doutor Hélio Pellegrino era médico psiquiatra, formado na Belo Horizonte em que nasceu em 1924. Na vida pública brasileira, foi dos poucos que pôde realmente ser chamado de intelectual - que se entende aqui como aquele cidadão que, destacando-se em suas atividades profissionais ou artísticas, usa prestígio e autoridade pessoais na defesa de causas coletivas. Na tradição brasileira, é posto reservado tradicionalmente a escritores, jornalistas e políticos e, dos anos 1960 para cá, a professores universitários. Na comissão que, formada na Passeata dos Cem Mil, foi recebida pelo ditador Costa e Silva num dos momentos mais críticos da repressão, os intelectuais eram representados, pela primeira vez, por um psicanalista, que logo seria preso por sua petulância e, anos mais tarde, se rebelaria até mesmo contra seus pares, denunciando autoritarismo e elitismo dos que ficariam conhecidos como "barões da psicanálise".
O inconformismo radical, que mateve até morrer, em 1988, vítima de enfarto, é a chave da [sua] vida (...). Beneficiados pelo tempo, que dá sentido e coerência ao passado, temos a certeza de que a convulsão permanente de Hélio Pellegrino faz todo o sentido. Para seus contemporâneos, no entanto, o homem-comício, como o apelidou o historiador Francisco Iglésias, era puro sobressalto. Por isso, é melhor deixar de lado a serenidade para acompanhar momentos de uma vida sempre um tom acima, com tambores ribombando, risos e choros compulsivos e uma tempestade daquelas que Nelson Rodrigues, seu grande amigo, imaginou para um inexistente quinto ano do Rigoleto.
Paulo Roberto Pires, em maravilhosa minibiografia de Hélio Pellegrino (igualmente dentro do "Arquivinho").
Postado por Julio Daio Borges
Em
8/4/2005 às 17h52
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