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Terça-feira,
13/6/2006
Dez anos e várias solidões
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Na ocasião dos dez anos da morte do escritor e jornalista gaúcho Caio Fernando Abreu, além da reedição de alguns de seus livros, a peça B, Encontros como Caio Fernando Abreu, que estreou no Centro Cultural Fiesp no dia 2, é mais uma das ações que marcam o ano e reacendem sua memória. Encenada pelo Núcleo Experimental de Artes Cênicas do Teatro Popular do Sesi-SP, sua temporada segue até o dia 27 de agosto.
Seu diretor, Francisco Medeiros, premiado nome da cena teatral contemporânea, frisa a importância da manutenção do Núcleo Experimental em meio a um mercado com poucos incentivos. Configurado em oportunidade para jovens atores em começo de carreira, ele consiste em cursos de dois anos de duração, que terminam com uma montagem profissional no Mezanino do Centro Cultural. Dirigido ao público jovem, o Núcleo já apresentou cinco peças desde sua formação, entre elas Motorboy, de Aimar Labaki e direção de Débora Dubois, e Romeu e Julieta, peça shakesperiana dirigida por William Pereira. A jovem dramaturga Lucienne Guedes, chamada para participar do projeto em fevereiro, explica que teve um reencontro com a literatura do escritor gaúcho. Segundo ela, estes encontros, premeditados ou naturais, feitos em processo colaborativo com todo o elenco e equipe, são o foco da peça.
B, Encontros com Caio Fernando Abreu é marcada pelo fragmentado, insights de sua obra e lembranças de sua morte. A própria encenação no mezanino do Centro Cultural, um corredor de 45 metros onde cabem apenas 50 espectadores, reforça a idéia da via, estrada onde os personagens se encontram e, muitas vezes, se separam. Baseada em livros como Morangos Mofados, um dos maiores sucessos editoriais da década de 80, e Triângulo das águas, que ganhou o Prêmio Jabuti de melhor livro de contos, entre outros, seu elenco jovem se encaixa eficientemente em temas como a solidão, a censura política e a busca pela dignidade e uma vida regrada. A destacada atuação de Alex Gruli, como o mendigo narrador e participante das histórias, traduz a eloqüência e crueza da obra do escritor. As atuações são complementadas por uma trilha sonora bem selecionada e mistura elementos do rock e MPB, a maioria canções cantadas ao vivo.
Entre contos, romances, poesias, peças teatrais e crônicas nos principais jornais e revistas do país, Caio Fernando Abreu sempre esteve situado na intensidade do momento presente, reflexo de sua vida breve, pois morreu de complicações provocadas pelo vírus da AIDS aos 47 anos. Seus contos, publicados sob o Regime Militar, foram proibidos, considerados demasiadamente obscenos. Apesar das diferenças, todos os seus personagens são caracterizados pela paixão e inconseqüência, impulsionados pela traição, abandono, rejeição, morte e medo.
Daí se pode pensar que a peça, assim como a obra de Caio Fernando, é uma apologia do niilismo. Mas o próprio autor sempre viu a marginalização da sociedade como algo que pode ser transposto, apesar de dar o título cruel de um de seus maiores sucessos, Morangos Mofados, à juventude de sua época. Principalmente neste e em Triângulo das águas, as situações adversas de seus personagens os impelem a progredir. O mesmo acontece na peça, que tem uma reviravolta inesperada e o prisma de dois ângulos, opostos que se complementam. Ao lado de belas cenas, algumas necessitam talvez de maior contextualização e embasamento, mas esta crítica é contornada pelo argumento de seu diretor, que afirma que o texto está em sua segunda versão e é um espetáculo em processo, longe de estar finalizado. Assim como as homenagens a este escritor, símbolo de uma geração que encontra muitos reflexos na moderna.
Postado por Marília Almeida
Em
13/6/2006 às 10h10
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