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Quarta-feira, 7/10/2015
Blog de Cassionei Niches Petry
Cassionei Niches Petry
 
Desparecer para aparecer

Doutor Pasavento, de Enrique Vila-Matas (CosacNaify, tradução de José Geraldo Couto), foi publicado no Brasil na mesma época da morte de J. D. Salinger. O romance do escritor espanhol tem como tema o desaparecimento de escritores. E Salinger foi um notório recluso, que optou por sumir do meio literário, apesar de o seu paradeiro ser de conhecimento de todos. Sincronicidade ou apenas coincidência?

Para quem não sabe, sincronicidade foi um termo criado pelo psicanalista C. G. Jung para designar eventos que acontecem simultaneamente e que são significativos para as pessoas, diferente da coincidência, que é uma conexão aleatória entre os fatos. Se alguém está pensando em um amigo e de repente recebe uma ligação telefônica dele, estamos diante de uma sincronicidade, afinal eles se conhecem e, no inconsciente de cada um, há o desejo de conversarem, mesmo sem terem combinado nada. Agora, se a pessoa conversa com um desconhecido em uma parada de ônibus e descobrem que ambas têm amigos em comum, há apenas uma simples coincidência, afinal, como diz o ditado, "o mundo é pequeno". (Ok, sou leigo no assunto. Para críticas, escrevam cartas, ou melhor, e-mails para a redação.)

Poderíamos classificar Doutor Pasavento como um romance ensaístico ou um ensaio romanesco? Já no início é citado o primeiro escritor dentre tantos que vão surgir na narrativa: Montaigne. É uma pista de que leremos uma espécie de ensaio, afinal, o escritor francês foi o pai do ensaio moderno, assim como os escritores Sterne e Cervantes, também citados, foram os criadores do romance-ensaio. Montaigne se refugiou em uma torre para escrever e é isso que Vila-Matas vai analisar: os escritores que resolvem desaparecer. Em obras anteriores, como sua obra-prima, Bartleby e Companhia, ele retratou os escritores que deixaram de escrever. Em O mal de Montano, abordou a "doença" de querer escrever. Ou seja, grande parte da sua obra tem como tema central a própria literatura. É a obsessão de Enrique Vila-Matas.

O protagonista é convidado para um encontro literário em Sevilha, justamente depois de ter imaginado essa viagem. Hospedado em Paris, descobre que o lugar onde está também foi ocupado por outros escritores. Sincronicidades? Resolve, depois, sumir no meio do caminho para o encontro literário, assim como fez certa vez Agatha Christie, e como fizeram tantos outros escritores, principalmente Robert Walser. Assume uma identidade falsa, a do psiquiatra Doutor Pasavento, para realizar novos projetos. Vila-Matas, em seu site na internet, diz que interpretar que o romance é sobre o desaparecimento e a solidão é aceitável, mas do que realmente trata o livro é a "dificuldade de não ser ninguém".

No Brasil, também temos alguns escritores que tentaram não ser ninguém. Os mais notórios são Dalton Trevisan e Rubem Fonseca. Ambos foram alvos de polêmicas nas últimas semanas. [Esta resenha foi escrita em março de 2010.] Sincronicidade? O primeiro, por ser retratado em um romance de Miguel Sanches Neto, seu ex-pupilo, e de não ter gostado nenhum pouco disso. O segundo, por aparecer no lançamento do livro de Paula Parisot, sua afilhada literária. O boato que corre nos meios literários é de que ela teria sido o pivô da saída de Rubem Fonseca da editora Companhia das Letras, que se recusou a publicar a obra da escritora. Para esse evento, Parisot faz uma performance dentro de uma caixa de vidro. Uma foto mostra Rubem Fonseca conversando com ela através da caixa, ele que sempre se fechou em uma redoma de vidro metafórica. Sincronicidade?

Enquanto alguns querem desaparecer, outros se expõem para chamar a atenção. Para se fazer literatura, não bastaria só escrever?

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Postado por Cassionei Niches Petry
7/10/2015 às 14h12

 
Dançando com o tempo no matadouro

Um romance de guerra? De ficção científica? Psicológico? Realista? Satírico? Autobiografia? Não dá para classificar um romance como Matadouro 5, de Kurt Vonnegut, publicado em 1969. Há de tudo um pouco na narrativa do escritor, que é daqueles autores que ficam na fronteira entre a literatura de ficção científica e a chamada literatura mainstream, assim como Philip K. Dick e Ray Bradbury.

Já no subtítulo, Cruzada das crianças, uma dança com a morte, há uma pista de que o romance é um libelo contra a guerra. A referência ao episódio em que crianças foram convocadas para lutar na época das Cruzadas, mas que acabaram sendo vendidas como escravas, acontece na própria fala do narrador. Os combatentes americanos na 2ª Guerra Mundial não passavam de crianças jogadas ingenuamente a uma luta que os levariam inevitavelmente a dançar com a morte. O protagonista da história, Billy Pilgrim, é um deles.

O jovem se alista para lutar na guerra e acaba prisioneiro em um matadouro na cidade de Dresden, na Alemanha. Acontece que o soldado tem um problema: está solto no tempo, ou seja, viaja no espaço temporal sem nenhum controle. Assim como ele está em um determinado momento na guerra, pode estar no instante seguinte com sua esposa e filhos, trabalhando como optometrista, ou então no planeta de Tralfamador, depois de ser abduzido, vivendo uma espécie de Big Brother em uma redoma de vidro com uma atriz pornô muito famosa, para delírio dos alienígenas. Portanto, sabe tudo sobre o seu futuro, inclusive a data de sua morte. Estão nesses pontos os toques de ficção científica, apesar de não ficar bem claro se a viagem é psicológica ou material.

No campo da realidade, a guerra é presença marcante. O protagonista (assim como aconteceu com o escritor na vida real), está em Dresden no dia do fatídico bombardeio, um dos fatos mais polêmicos do conflito, em que morreram por volta de 130 mil pessoas, mais do que na bomba de Hiroshima. "Coisas da vida", como diz a filosofia tralfamadoriana, frase repetida durante muitas vezes, sempre que há referências à morte. O livro foi uma catarse para o escritor, sendo que, na abertura, seu alter ego, Yon Yonson, faz uma viagem de volta à cidade alemã. É este o narrador da história, que faz reflexões sobre a guerra, inclusive sobre a Guerra do Vietnã, conflito no qual o filho de Pilgrim se alista.

A narrativa fluente é composta por fragmentos curtos, num tom de comédia e sem ordem cronológica, pois acompanha o vai e vem temporal do protagonista. Vale destacar também a participação do fictício escritor Kilgoure Trout, personagem presente em outras obras de Vonnegut, que escreve livros de ficção científica. Os argumentos de seus livros são uma atração à parte na narrativa.

O romance (que ganhou uma adaptação para o cinema em 1972) foi editado no formato pocket pela editora L&PM, com tradução de Cássia Zanon. Uma ótima oportunidade para o leitor conhecer um clássico do século XX.

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Postado por Cassionei Niches Petry
5/10/2015 às 09h01

 
O inferno são os outros?

Três pessoas estão em uma pequena sala: um intelectual, uma socialite e uma lésbica. É ali que vão permanecer, não sabem por quanto tempo, talvez eternamente. Logo ficamos sabendo que ali é o inferno, diferente do inferno fixado no imaginário ocidental por Dante Alighieri na Divina Comédia. Em um primeiro momento, tudo é novidade, estão todos sorridentes, "não sabia que era assim", "onde estão as estacas e as grelhas", "pensei que você fosse o carrasco, "com o tempo a gente se acostuma com os móveis", "esses sofás são medonhos". Porém, conforme vão se conhecendo, toda a tranquilidade começa a acabar, surgem os conflitos, as verdades sobre suas vidas vão aparecendo e seus próprios pensamentos começam a perturbá-los. Até que um personagem conclui: o inferno são os outros.

Esse pequeno relato bem podia ser de um reality show da TV. Mas calma, leitor, não vou falar sobre esse assunto, pelo menos por enquanto. Tudo faz parte da peça de teatro Entre quatro paredes ("Huis Clos", no original) escrita pelo filósofo francês Jean-Paul Sartre, em 1944, e editada no Brasil pela editora Civilização Brasileira. Tive o privilégio de assisti-la há alguns anos. O texto nos faz refletir sobre a convivência entre as pessoas, de como não sabemos lidar com quem é diferente, pois todos queremos que os outros ajam de acordo com nosso modo de vida e ficamos incomodados quando isso não acontece. No filme Dia dos mortos, do diretor George Romero, militares e cientistas viviam em um bunker para se refugiar dos zumbis. Depois de uma discussão muito forte, um dos personagens afirma: "o problema do mundo é que as pessoas têm ideias diferentes a respeito do que querem da vida."

Então, não estaria o inferno dentro de nós mesmos? Estamos sempre querendo ver o céu ou o inferno em um além-túmulo, mas a paz ou o conflito não estão dentro de nosso próprio cérebro? Não é à toa que na mitologia grega o mundo dos mortos era protegido pelo cão de três cabeças chamado Cérbero, que controlava a saída do Hades. Notem a semelhança entre o nome do monstro e a palavra cérebro. Pois cada cabeça desse ser mitológico pode simbolizar as divisões do inconsciente, de acordo com Sigmund Freud: o ID, que são nossos instintos e desejos mais primitivos, relacionados à busca pelo prazer; o SUPEREGO, que representa a censura que a cultura impõe ao indivíduo, as repressões aos desejos do id; e o EGO, que é o equilíbrio, controlando o comportamento, pois nem o id nem o superego podem prevalecer um sobre o outro, caso contrário acontecem os distúrbios mentais. Então, quem se deixa dominar pelos seus desejos mais recônditos pode ser tachado de pervertido. Quem se deixa ser controlado de mais pode se tornar um fanático religioso, por exemplo.

O inferno, portanto, não é um lugar além-túmulo fictício, tampouco o nosso mundo o é, muito menos são as outras pessoas. O inferno está dentro de cada um de nós, e, como disse Juan Pablo Castel, personagem do romance El túnel, do argentino Ernesto Sabato, "os muros deste inferno serão, assim, cada dia mais herméticos".

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Postado por Cassionei Niches Petry
27/9/2015 às 16h51

 
Questão de talento

para Márcio Paz

Posso começar? Ok, bem, alô, alô, 1, 2, teste. Tá bom? Vamos lá, então. Antes de mais nada, agradeço o espaço que não me deram, mas estou agora utilizando para dizer que o talento é uma coisa que não se conquista e sim se nasce com ele. Eu nasci com talento, mas parece que as pessoas têm inveja e por isso não deixam a gente mostrar. Daí resolvi tomar esta atitude, e agora vocês vão ouvir a minha música que o programador da rádio vai rodar. Antes eu queria que a rádio rodasse pelo menos uma música minha, mandei meu CD, mas tem um cara aqui que não foi com a minha cara, eu acho. Então a única ideia que eu tive foi invadir a rádio e obrigar os caras a botarem meu som. Eu estou armado, mas não quero machucar ninguém, quero só mostrar meu talento. Não tô nem aí pro sucesso, quero só mostrar minha arte pra todas as pessoas. Então vocês vão ouvir todo o CD que eu gravei com minha banda e entre uma música e outra vou expressar minha filosofia de vida pra vocês, valeu. Então, aí vai a primeira.

...

Que som, né? Pois justamente essa letra expressa o que eu sinto contra as rádios que só rodam os caras que pagam jabá, tá ligado? Esta rádio até que toca um lance alternativo e tal, só não queriam rolar o meu som. Vamos logo para a próxima música.

...

Bem, esse é um som de quem tá revoltado com os políticos, e todo brasileiro sempre tá. Mas eu queria que vocês reparassem na linha de baixo do próximo som, é do caralho.

...

Ouviram com atenção? Pois é, pra mostrar que meu som tem uma qualidade musical muito grande. Repito, as pessoas que nascem com talento como eu têm que ter espaço nas rádios. Próxima música.

...

Bem, esse som eu fiz quando minha mina me traiu e tal, mas não tem nada a ver com esse som de corno dos sertanejos ou sertanojos. O estilo é mais metafórico, não sei se vocês perceberam, mas a serpente da letra... bem, se vou explicar não tem graça, né? A que vai rolar agora fala sobre a TV e tem o título "Tenda dos Varais", se ligaram nas iniciais? Ninguém teve essa ideia ainda.

...

Os caras da banda disseram que a gente não devia ter gravado essa música sobre a TV porque fala sobre a Globo e aí a gente nunca ia poder tocar lá. E eu com isso, eu disse, não quero fazer sucesso na TV, o que vale é expressar a arte da música que deve ser ouvida e se o cara quer ver a banda tem que ir nos shows e tal. Vou rolar a próxima, mas antes queria dizer que é bem mais a fudê quando não tem propaganda na rádio. Olha só quanto tempo a gente tá ouvindo música sem aquelas musiquinhas babacas que só servem pra enganar os otários e comprar os produtos que eles querem vender. Mas vamos pra faixa seguinte.

...

Por causa dessa música que rolou eu comprei uma briga com minha mãe, porque meto o pau na religião, principalmente na porra da Igreja Universal e também na Católica, mas é mais os caras que tomam conta dessas igrejas, só querem dinheiro. Bem, só quero avisar pra quem tá ligando pra cá que eu não vou atender, e pros "pés-de-porco" que tão ali no outro lado do vidro me vendo, que a próxima música é uma homenagem a vocês. E tô avisando, se vocês entrarem antes de terminar meu CD, eu mando bala no cara aqui, hein?

...

Tudo que eu disse nesse som é verdade, tá ligado, os brigadianos só querem dar cacetada na gente e assim acabam perdendo o controle da lei, tá ligado. Os caras que tão me olhando ali não querem nem saber se eu vou me entregar depois, quando terminar meu CD vão entrar dando porrada, depois vão dizer que foi preciso porque o elemento reagiu à prisão, ah, vão se fudê. Agora o último som é bem deprê, depois das pauladas sonoras, vamos descansar o cabeção.

...

Viram aí, a música fala de suicídio e tal, do artista que não é compreendido em vida e resolve se matar porque tem certeza que fará sucesso depois de morto. É isso aí rapaziada, com isso vou me despedindo, e espero que vocês comprem o CD e façam de mim e da minha banda um sucesso e adeus pra toda minha família e tal. E aí vai o último som que eu faço em vida.

(Conto publicado no meu primeiro livro, Arranhões e outras feridas.)

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Postado por Cassionei Niches Petry
25/9/2015 às 14h30

 
Nossos monstros interiores

Quando lemos sobre a violência ou, pior, quando a sofremos, perdemos muitas vezes o próprio controle pensando também em praticá-la. Queremos fazer justiça com as próprias mãos, queremos pena de morte, queremos que o criminoso sofra. Será que somos, então, violentos por natureza? Ou, como disse Jean-Jacques Rousseau, "o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe"? A literatura e o cinema podem-nos fazer refletir sobre isso.

O médico e o monstro - O estranho caso do dr. Jekyll e sr. Hyde, romance escrito por Robert Louis Stevenson no século XIX, tem uma edição primorosa recente pela Penguin/Companhia das Letras, com tradução de Jorio Dauster. O protagonista, Dr. Jekyll, defende a teoria de que o ser humano não tem uma alma ou psique, mas sim duas. O lado bom se esforça para fazer o que é considerado o correto e o lado mal são os impulsos animalescos reprimidos. Se esses dois lados fossem separados, o homem alcançaria a sua liberdade, pois o lado mal deixaria de perturbá-lo. Para isso, ele cria uma poção química, conseguindo separar essa duas personalidades. Surge o Mr. Hyde, seu lado mal, que se mostra muito mais forte, acabando, aos poucos, por tomar o lugar do lado bom. Vejo nessa história uma analogia do uso de drogas. A maioria dos casos de violência decorre do uso de substâncias que liberam o lado ruim que temos, lado repreendido pela sociedade. Quando se bebe muito, é revelada a verdadeira personalidade do indivíduo. Acontece que nem todo bêbado sai cometendo barbaridades por aí, uns até se tornam extremamente amáveis, assim como nem todo consumidor de maconha é bandido.

O filme O lobisomem, por sua vez, retrata um dos mitos mais antigos da humanidade. Na mitologia grega, o rei Licaonte serve a Zeus carne humana e, como castigo, o deus dos deuses o transforma em um lobo. Do nome do rei deriva a palavra licantropia, distúrbio mental no qual a pessoa pensa ter se transformado em algum animal. Pois o lobisomem é a grande metáfora do mal dentro de cada homem, mesmo que este seja uma pessoa boa, como diz a frase inicial do filme: "até um homem que é puro de coração, e reza suas orações à noite, pode-se tornar um lobo quando o acônito floresce, e a lua do outono estiver cheia e brilhante". O acônito, também chamado de mata-lobos, é uma planta venenosa, simbolizando o mal que surge da terra, ou seja, da natureza. A lua cheia representa o estímulo exterior para que esse lado ruim venha à tona. Faz parte da natureza o lado mal que temos, mas a influência da sociedade não pode ser descartada. Algumas pessoas, porém, têm mais capacidade para controlar esse lado ruim, enquanto outras, por qualquer provocação, têm reações extremas.

Escrevi que a literatura e o cinema podem-nos fazer refletir sobre o assunto, mas apenas refletir, não mais do que isso. Não dá para se chegar a uma conclusão sobre esse mistério guardado dentro de cada um de nós. Ninguém está livre de cometer um ato insano. Então, quando condenamos uma pessoa, estamos na verdade julgando a nós mesmos. Nós, que fazemos parte da sociedade, somos os culpados pela violência. Nós, que não temos controle sobre nossos extintos, somos culpados pelo mal existir.

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Postado por Cassionei Niches Petry
18/9/2015 às 14h27

 
Philip Roth trapaceiro

Philip Roth publicou Deception originalmente em 1990. No Brasil, houve um edição da Siciliano em 1991, já esgotada, com o título Mentiras. Em Portugal, foi intitulada Engano. Este é mais apropriado.

Roth nos engana, criando um personagem chamado Philip, que pensamos ser ele próprio. Engana, mas não mente. Esse Philip engana sua esposa, que descobre a traição ao ler as anotações de diálogos entre o escritor com as suas amantes. Ele alega, porém, que aquilo é ficção: "É uma representação, um jogo, uma imitação de mim mesmo! Faço ventriloquismo comigo mesmo. Ou quem sabe seja mais fácil entendê-lo ao contrário: tudo é falsificado, exceto eu. Talvez inclusive eu mesmo o seja. Mas de um ou outro modo, querida, tudo se reduz a uma invenção, um entretenimento do homo ludens." Philip Roth, ou o personagem Philip, tenta convencer a esposa de que ele não é ele mesmo nas anotações que ela havia lido. Não consegue convencê-la, assim como não consegue convencer o leitor.

Isso já está na segunda parte, mas ainda não é o final. O final nos engana ainda mais. Ou estaria o próprio Roth se enganando? Nesse jogo, o escritor trapaceia os personagens, o leitor e ele mesmo. "Trapaça" também seria um bom título. Não é à toa que o livro é considerado um apêndice do anterior, O avesso da vida, outra trapaça, assim como The facts, que tem como subtítulo "uma autobiografia de um romancista", mas que não é uma autobiografia. Capricho de escritor? "'Caprice' é o que está no coração da natureza de um escritor. Explorações, fixações, isolamento, malignidade, fetichismo, austeridade, leviandade, perplexidade, infantilismo, etc. O nariz na costura da roupa de baixo - que é a natureza da vida do escritor. Impureza."

Na primeira parte de Deception, a dos diálogos entre os amantes, estamos diante de reflexões sobre a condição judaica (que não poderia faltar), o processo de escrita e a criação de personagens como Nathan Zuckerman, o câncer, etc. Temas que perpassam a obra rothiana. Mas é o adultério o foco da obra. Coincidentemente, estive relendo alguns romances com esse tema, preparando material para as minhas aulas (o lado prazeroso de ser professor). Madame Bovary, de Flaubert, e Dom Casmurro, do nosso Machado de Assis, foram algumas dessas leituras. Ema Bovary é até citada nos diálogos de Deception. Roth pinta com tintas nada coloridas as relações humanas, as nossas mais escondidas relações.

O que é verdade e o que é ficção? Claudia Roth Pierpont, em Roth libertado: o escritor e seus livros, editado pela Companhia das Letras, nos aponta os caminhos. Ela revela que tudo o que parece ser realmente é. Aliás, é por causa deste livro que estou lendo toda a obra de Roth, tentando entender como a vida dele influenciou na sua escrita e vice-versa. Estou na metade desse processo todo. Há ainda os anos 90 e 2000 para explorar. Philip Roth vai continuar me trapaceando. E, como leitor, gosto de ser trapaceado.

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Postado por Cassionei Niches Petry
15/9/2015 às 13h55

 
Os livros são perigosos?

Sempre que ocorre algum incêndio em favelas ou outro tipo de desastre, como enchentes, um dos primeiros objetos salvos é a televisão. Fico pensando, ao observar minha pequena biblioteca, o quão triste para mim seria vê-la consumida pelo fogo. A televisão é uma coisa fria, sem vida, enquanto os livros parecem humanos, têm sentimentos. Se acontecesse comigo, salvaria os livros.

O mais duro, porém, é saber que um mecanismo opressivo de um Estado totalitário poderia querer atear fogo na minha biblioteca. É o que acontece na sociedade distópica criada por Ray Bradbury em seu romance Fahrenheit 451. O livro, clássico da ficção científica, publicado em 1953 (foi escrito nos porões de uma biblioteca, onde Bradbury alugava uma máquina de escrever, de acordo com o posfácio escrito por ele) está sendo relançado pela Biblioteca Azul, selo da Globo Livros, com tradução de Cid Knipel.

Fahrenheit 451 (que corresponde à temperatura em que o papel entra em combustão) conta a história de Guy Montag, bombeiro cuja função não é apagar incêndio, mas queimar livros. Como assim?, está se perguntando o leitor agora. Pois nessa sociedade futura, as casas são pintadas com um produto que as protege de incêndios. Já os livros são proibidos, com a alegação de que tira a paz das pessoas e as deixa deprimidas. Por isso, ao receberem denúncias, os bombeiros são chamados para acabar com eles. As pessoas que vivem nessa sociedade têm como divertimento assistir à televisão, disposta nas paredes das casas, onde os moradores interagem com a chamada "família". "A TV molda as pessoas como bem deseja! É um ambiente tão real quanto o mundo. Ela se torna a verdade e é a verdade. Os livros podem ser postos de lado com razão". Mildred, esposa de Montag, passa o tempo todo vidrada nessas paredes, não ficando muito tempo longe de sua "família".

Uma nova vizinha, a adolescente Clarisse, muda a mente de Montag. Ela o ensina a ver as coisas boas da vida e pergunta a ele se é feliz. A partir desse momento, o bombeiro começa a ter curiosidade de ler o que está nos livros que são incinerados e os rouba. O que trazem esses objetos a ponto de preocupar tanto às pessoas como Beatty, seu chefe no corpo de bombeiros? Aliás, em uma passagem do romance, uma descrição ao mesmo tempo bela e apavorante, Montag imagina a voz do seu superior o orientando: "Observe. Delicadamente, como as pétalas de uma flor. Acenda a primeira página, acenda a segunda página. Cada uma se torna uma borboleta preta. Linda, não é? Acenda a terceira página na segunda e assim por diante, fumaça em cadeia, capítulo a capítulo, todas as coisas estúpidas que as palavras significam, todas as falsas promessas, todas as noções de segunda mão e filosofias desgastadas pelo tempo."

O romance (adaptado para o cinema por François Truffaut em 1966) é um registro de amor pelos livros, seja no papel ou guardado na memória, que foi a maneira encontrada pelos resistentes para conservar o conhecimento sem serem presos. O objeto livro nessa história também simboliza toda a obra intelectual que nos faz pensar sobre a condição humana, tanto no aspecto psicológico quanto no aspecto social e, consequentemente, é perigosa para os interesses do Estado. Ao mesmo tempo, Fahrenheit 451 é uma crítica à televisão que estava se tornando um sucesso na época. Ray Bradbury, que morreu em 2012, a julgava como um objeto alienante, que limitava a mente das pessoas.

Fica a reflexão: O que preferimos? A realidade anestesiante desse objeto retangular, cheio de imagens e sons, chamado televisão? Ou a realidade inquietante, perigosa, desse objeto retangular, cheio de letras impressas e imaginação, a que chamamos livro?

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Postado por Cassionei Niches Petry
14/9/2015 às 10h19

 
Aceita uma laranja?

Alguém já disse: se torcêssemos um jornal como se faz com uma toalha, pingaria muito sangue. Claro, isso serve para a TV, nesse caso não apenas nos noticiários, como também nos filmes, séries e novelas, que estão se especializando na "estética do tiro". Muitos afirmam que é a sociedade que está cada vez mais violenta. Isso é uma verdade em partes, pois a violência cresce proporcionalmente ao aumento da população. O homem sempre foi um animal violento. A diferença é que uns controlam esses instintos, enquanto outros não seguram a fera dentro de si.

O que acontecerá no futuro? Os otimistas acreditam que tudo pode melhorar, sonham com um mundo de paz para seus filhos, são utópicos. Os pessimistas, por seu turno, pintam um mundo sombrio, onde cada vez mais as casas terão cercas eletrificadas e proliferarão os condomínios fechados. Quem não tiver dinheiro (a "tia pecúnia") estará à mercê de gangues, com delinquentes cada vez mais jovens, que praticarão a "ultraviolência". Esse cenário distópico aparece em muitos livros de ficção científica. Entre eles, Laranja mecânica, de Anthony Burgess, cuja 2ª edição foi lançada recentemente pela Aleph, com traduçao de Fábio Fernandes.

Utopia é um termo que designa, literalmente, um lugar que não existe (do grego, "ou", negação e "topos", lugar"). A palavra foi usada pela primeira vez no livro homônimo de Thomas More para nomear uma ilha onde tudo era perfeito, do sistema de governo às atitudes dos cidadãos. Por extensão, passou a significar o sonho de um mundo ideal, o qual muitas vezes seguimos, mesmo sabendo que ele pode nunca acontecer. Miramos o horizonte e nos guiamos por ele, apesar de nunca o alcançarmos. Já a distopia é o contrário. Seriam distópicas as sociedades do futuro em que prevalecessem os regimes totalitários que controlassem os passos e o pensamento do indivíduo (como no livroromance 1984, de George Orwell, onde surgiu a expressão Big Brother), que manipulassem geneticamente os embriões dos seres humanos para condicioná-los a agirem conforme o sistema (Admirável mundo novo, de Aldous Huxley) ou destruíssem obras intelectuais para que as pessoas não aprendessem a questionar a realidade (Fahreinheit 451, de Ray Bradbury).

No livro de Burgess, publicado em 1962, vemos uma Inglaterra, num futuro não muito distante, tomada por gangues juvenis que praticam a ultra violência. Quem nos narra a história é um membro de uma dessas gangues, Alex, com uma algaravia de gírias chamada de linguagem "nadsat" (há um glossário no final do livro para compreender as expressões). Seus companheiros são "druguis", que moram em "flatblocos", adoram beber "moloko" para depois "itiar" pelas ruas, espancar "vekios", estuprar "devotchka", roubar "tia pecúnia, fazer muitas coisas "horrorshow" e depois fugir dos "miliquinhas". Burgess, estudioso da obra de James Joyce, criou as gírias baseado em línguas do leste europeu. Causa estranhamento em um primeiro momento, mas com o decorrer da leitura acabamos nos acostumando com ela, sem contar que, nessa nova edição no Brasil, a tradução de Fábio Fernandes faz fluir bem mais fácil o texto do que a antiga, feita nos anos 70.

Após todas as atrocidades cometidas, Alex acaba preso e passa por um processo de reabilitação inovador chamado processo Ludovico. Amarrado a uma cadeira e com grampos prendendo suas pálpebras, ele assiste a filmes que mostram as ações cruéis de que o ser humano é capaz de fazer contra seu semelhante, com destaque para o Holocausto. Ao ser obrigado a assistir às cenas que seguem numa sucessão frenética, sem poder fechar os seus olhos, Alex é condicionado a ter repulsa por qualquer situação de violência e, consequentemente, é considerado curado. Na terceira parte, ocorre a tentativa de voltar a conviver pacificamente dentro da sociedade e com sua família, mas percebe a dificuldade de aceitação de um ex-delinquente, ainda mais por reencontrar aqueles que antes foram suas vítimas.

Laranja mecânica se tornou mais conhecido depois da adaptação cinematográfica feita por Stanley Kubrick, com cenas que entraram para o inconsciente coletivo dos amantes da sétima arte. No filme, porém, os "druguis" são adultos, ao contrário do romance, em que são adolescentes. Recentemente, a adaptação de Alice no país da maravilhas também optou por uma personagem adulta em vez da criança da obra de Lewis Carroll. Será tudo culpa do "politicamente correto"? De qualquer forma, o romance nos instiga a refletir sobre o caráter do ser humano que se forma já na infância e sobre como estamos cada vez mais perdendo o controle dos nossos filhos. Mas também faz uma crítica ao Estado, que faz muito pouco para curar esse mal da sociedade e, quando tenta, utiliza métodos errados ao manipular a mente das pessoas. Como escreveu uma das vítimas dos "druguis", um escritor, em seu livro que foi rasgado por Alex, e cujo título é o mesmo do romance de Burgess: "A tentativa de impor ao homem (...) leis e condições que são apropriadas a uma criação mecânica, contra isto eu levanto minha caneta-espada".

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Postado por Cassionei Niches Petry
12/9/2015 às 10h55

 
O dia em que a Terra parou

Conto do meu livro Arranhões e outras feridas. (Porque hoje é 11 de setembro.)

"a noite tem peso/e tem feridas", Noite em chamas, Romar Beling

São mais ou menos oito da matina e estou fechando o primeiro baseado do dia, ouvindo o Raul: "O dia em que a Terra parou". A mulher do meu lado ainda dorme. Tento acordá-la: "Tu não trabalha, não?". Ouço apenas um grunhido que tanto pode significar um "sim" ou um "não enche, porra, que eu quero dormir".

Não sei nem seu nome. Eu a encontrei ontem à noite na Imigrante com uma long neck, na mão, recitando Bilac (ou cantando a música da Paula Toller, não sei): "...direis ouvir estrelas, certo perdeste o senso". Perguntou se eu não tinha um baseado, eu disse que só em casa. Viemos pra cá, mas quando chegamos, ela desabou na cama dizendo "boa noite, amor" e apagou.

Olho pro calendário, dia 11, meu aniversário. Tenho alguma coisa pra comemorar? Será que vai aparecer alguém da família hoje à noite ou ninguém vai vir porque eles sabem que eu não vou pagar a festa sozinho? Querem só boca livre. Os amigos a mesma coisa. Melhor dizendo, meus conhecidos, já que amigo mesmo é como baseado bom, só consegue quem tem dinheiro. Aliás, essa erva ainda não fez efeito. Será que o Índio me vendeu bosta de vaca?

Sento na frente da cama e observo a mulher. Não acredito que dormi ao lado dela e não fiz nada. Olha só que corpo. Ao menos não sou um desses que pegam mulher e estrup...estu-pa...Puta merda! Acho que tão começando as pauladas ficar olhando pra esse rabo levantado tá me deixando louco ou é o efeito da erva ou são os dois juntos ou tô sentindo sono ah sei lá oh a TV não lembro se tinha ligado ela ihhh! oh as torres do congresso bah! dois aviões bateram nelas ah ah ah e aquela corja de ladrões senadores deputados bah tá desabando tudo que fumaceira que fumaceira aqui também tem fumaceira fogo na bomba bah o que vai ser do futuro das crianças o programa da Angélica tá muito louco.

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Postado por Cassionei Niches Petry
11/9/2015 às 13h18

 
O terremoto no Haiti e as explicações religiosas

(Texto originalmente publicado em janeiro de 2010)

O desastre no Haiti tem uma explicação, segundo o pastor norte-americano Pat Robertson: foi um castigo de Deus. Para o reverendo, os haitianos teriam feito um pacto com o Diabo para obterem a independência da França. Mas o pastor não está sozinho nesse pensamento. O cônsul geral do Haiti em São Paulo, George Samuel Antoine, que é cristão, disse, sem saber que estava sendo gravado pelas câmeras de um canal de televisão, que "a desgraça de lá está sendo uma boa pra gente aqui, fica conhecido. Acho que de tanto mexer com macumba, não sei o que é aquilo... O africano em si tem maldição."

Atribuir desgraças da natureza a decisões de deuses não é nenhuma novidade na história universal. Na Grécia antiga, o deus dos mares, Poseidon, provocava terremotos com seu tridente. Zeus, o mais importante dos deuses do panteão olímpico, era responsável pelos raios destruidores. Quando havia erupções vulcânicas, era Hefaístos (Vulcano na mitologia romana) que estava forjando metais embaixo da terra. Ou seja, sempre que não temos respostas racionais para os fenômenos da natureza, elaboramos explicações através de mitos.

O fato nos remete a 1755, quando a cidade de Lisboa sofreu um terrível terremoto, seguido de um tsunami, provocando, além de desmoronamentos, incêndios em vários prédios. O número de mortos nunca foi contabilizado com precisão. Estima-se que chega a 60 mil, segundo a enciclopédia Britânica. A catástrofe aconteceu no dia 1º de novembro, dia de Todos os Santos, e como Portugal era um país extremamente católico, grande parte da população morreu sob os escombros das igrejas que foram destruídas. Isso provocou profundos debates na época, pois muitas pessoas diziam não entender a ira de Deus.

O mais famoso debate ocorreu entre os filósofos Voltaire e Rousseau. No "Poema sobre o desastre de Lisboa", Voltaire, já que os franceses atribuíram o desastre ao um castigo divino, questiona: por que um Deus bondoso e todo-poderoso permitiria um desastre se abater sobre crianças e mulheres? "Que crime, que falta cometeram esses infantes/ Sobre o seio materno esmagados e sangrantes?" Como explicar o mal com a ideia de um Deus benevolente? "Direi vós: 'Eis das eternas leis o cumprimento,/ Que de um Deus livre e bom requer o discernimento?' " Em uma carta no ano seguinte, Jean-Jacques Rousseau, defendendo sua fé, respondeu a Voltaire que os culpados de tudo foram os próprios homens, que construíram prédios tão altos em tão pouco espaço. "A natureza não reuniu ali vinte mil casas de seis a sete andares, e que se os habitantes dessa grande cidade tivessem sido distribuídos mais igualmente, e vivessem de maneira mais modesta, o dano teria sido muito menor, e talvez nulo". Que culpa teria Deus? Além disso, segundo ele, muitos voltaram aos escombros para buscarem roupas e dinheiro e acabaram sendo engolidos pelo tsunami.

Outro filósofo, Imannuel Kant, também escreveu sobre o abalo sísmico de Lisboa, afirmando que as causas eram meramente físicas, nada tendo a ver com questões morais. Concordo com ele. Hoje, com todas as descobertas científicas, já há respostas para a maioria dos fenômenos. Todas as verdades estabelecidas pelas religiões aos poucos vão caindo por terra. Os raios não são castigos de Zeus ou Júpiter, como se pensava, tampouco a deusa Fortuna está escolhendo quem deve ter sorte ou não sobre a terra, e não é Deus que está bravo quando ouvimos trovões no céu. Além disso, pessoas boas e más, religiosas ou descrentes, qualquer um pode morrer nessas tragédias. Não há motivo para nossa mentalidade ainda presa a velhas questões religiosas continuar impondo explicações desastradas para os desastres.

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Postado por Cassionei Niches Petry
5/9/2015 às 08h14

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