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Terça-feira,
10/3/2015
No meio da noite, no meio do dia
sonia maria de araujo sobrinho
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Como posso falar da noite se sempre tive medo dela. Não sei mas as pessoas que varavam a madrugada na rua, para mim eram esquisitas, libertárias demais.
Bebia-se muito, flertava-se muito e eu via muitas caras solitárias e tristes, como se esperassem que á meia noite, as bimbalhadas dos sinos anunciassem uma reviravolta em suas vidas, onde tudo seria melhor.
A esperança e a reflexão são nítidas nesta hora. Agarra-se ao último foco de luz para não deixar sumir o brilho da noite, o brilho da vida.
Tudo é tão luminoso, furta cor. Todos parecem se conhecer e serem amigos; - ou seria só cumplicidade ?
Muitos que não fumam passam a fumar, os que bebem pouco, bebem um pouco mais e riem, riem alto, ás gargalhadas. Tudo fica engraçado. Olha só sua cara, está grande, parece torta. Seus olhos parecem saltar e percebo agora sua falha de dentes, bem na frente. A gente ri tanto que dá vontade de fazer xixi e na toalete as mulheres definem quem ficará com quem. Formam-se os pares, alguém vai sobrar...
Já passaram das duas da manhã e daqui pra frente o resto tudo vale. O garçom entrega bilhetes; pendura contas e vai enchendo mais o copo.
Olhares furtivos, passos trôpegos, fala embolada. Será que é comigo mesmo que ele está falando?
Na volta pra casa, muitas juras, carícias audaciosas, troca de telefones; telefones trocados de propósito.
- é da casa do Luiz?
- não, minha filha, não existe nenhum Luiz neste telefone
- desculpa, foi engano
E agora, eu não peguei o nome completo dele.
A roupa que parecia linda na noite anterior, agora parece ridícula demais para esta manhã. Toda amarrotada, ás vezes sem botão ou o zíper não funciona mais (sobe só até o meio).
Vou me deitar e aviso antes pra Maria.
- não me chame, por favor. Se eu acordar no meio da noite/no meio do dia, deixa que eu me viro. Viro pra um lado, viro pro outro. Aperto meu travesseiro, que assume contornos de parceiro. Me recuso nesta hora a ouvir o toque do despertador, a campainha, o telefone. Faremos nossa própria distinção de horário.
Daqui pra frente nosso estômago nos avisará a hora de comer, nosso sexo e coração a hora do amor, em sintonia, e nosso corpo nos levará para a cama, relaxar, recuperar energias. Eu me alimento e reservo, esticando sensações, revivendo tudo; só assim consigo esperar nosso próximo encontro.
O próximo encontro aconteceu de uma maneira nada convencional, alguns meses depois. Sabe aqueles dias onde parece que se tem amnésia? as coisas são lembradas pela metade, como um sonho interrompido.
Tínhamos uma reunião com fornecedores para escolha de determinado produto e para meu espanto, lá estava ele, impecável, em terno de linho claro. Chegou como se estivesse atrasado, cumprimentando a todos apressadamente. Foi como se não me conhecesse ou tivesse talvez uma vaga lembrança. Também procedi como tal. Ao final deste encontro nos despedimos cordialmente com um até logo, até um dia.
Passado tanto tempo, eu me pergunto o que se encontra nestas noites. Será que ainda tem tanto brilho ? brilho falso, brilho fugaz, um calor que nos esquenta quando se tem frio. Apenas isto.
No dia seguinte o tempo já estava fresquinho de novo, podia-se usar menos roupas (não preciso de tanto para me aquecer).
Vou sair um pouco, passear, tomar sorvete.
Agora a luz é natural e é assim que eu me encontro. Faça um comentário
Postado por sonia maria de araujo sobrinho
Em
10/3/2015 às 12h56
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