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Segunda-feira,
22/6/2015
Passageiro do Fim do Dia
Guilherme Carvalhal
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A premissa utilizada por Rubens Figueiredo para construir seu romance Passageiro do Fim do Dia é bastante simplória: um rapaz indo para a casa da namorada de ônibus após o término de seu expediente de trabalho. E dentro desse enredo supostamente simples se constrói uma história grandiosa, envolta em percepções variadas do personagem principal durante esse trajeto.
Pedro é um personagem de profundidade não muito explorada. Pelo menos não o seu eu, sendo o seu entorno a construção da trama. Dono de uma pequena loja de livros situada em zona pobre frequentada por figuras poucos usuais à região, como juízes cheios de segurança, sua viagem para o bairro do Tirol, onde mora sua namorada Rosane, é desafogada do marasmo com o livro de Darwin sobre suas andanças pelo Rio de Janeiro. Ao ler e imaginar a passagem do cientista pelo Brasil e tentando imaginar os muitos contrastes entre o hoje e o atual, sua leitura vai sendo cortada pelas conversas ao redor, pelas diferentes pessoas embarcando e pelas suas muitas realidades.
Aqui já temos um bom caldo da imensidão da narrativa de Figueiredo. Os conflitos de Pedro com o mundo antigo exposto no livro, juntamente à percepção do Rio de Janeiro contemporâneo, quebram a linha narrativa da mera viagem. É uma trama paralela, um ir e vir na história constantes, evidenciando um dos principais pontos do livro, que é a literatura com fins de crítica social, ou então como narrativa a respeito de problemas sociais.
Em um trecho, Pedro lê sobre o comentário de Darwin a respeito de ser servido pelas negras, o que ele considera negativo pela condição da escravidão, mas ao mesmo tempo é aprazível essa regalia. Esse comentário ecoa ao longo dos tempos e serve como uma reflexão contemporânea.
A relação de Pedro com Rosane é outro gancho para essas narrativas paralelas. Aqui as diferenças sociais são bem explícitas. Pedro é classe média, Rosane é classe baixa. A mãe dele detesta seu relacionamento enquanto o pai dela o adora. O rapaz acaba precisando ajudar na casa dela devido à baixa renda familiar, sendo seu pai um operário aposentado devido a alergia a cimento.
O núcleo familiar dela é um dos pontos centrais da história, servindo para ilustrar com maiores detalhes as diferenças sociais. A realidade dela é mais profunda ainda do que a de Pedro. O bairro do Tirol onde ela vive é minuciosamente descrito, juntamente à jornada de sua família até ir residir no local. As muitas realidades históricas e sociais se juntam para tornar o cotidiano de Rosane mais explicitado ao leitor.
Rubens Figueiredo explora em Passageiro do Fim do Dia várias temáticas atuais. É o caos do trânsito, os conflitos que surgem em uma cidade marcada pelas muitas diferenças sociais, as expectativas de pessoas esmagadas por um mundo excludente. Isso é exposto em uma narrativa não linear, em que a memória e o pensamento servem de constantemente de gancho para narrativas paralelas. E com isso ele forma um dos maiores livros brasileiros da atualidade, ganhador do Prêmio São Paulo de Literatura como melhor livro de 2011.
Postado por Guilherme Carvalhal
Em
22/6/2015 às 14h25
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