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Sexta-feira,
10/7/2015
Competição Nacional - 7º Festival In-Edit
Mauro Henrique Santos
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A seleção de filmes da Competição Nacional, do 7º Festival Internacional de Documentários Musicais, em cartaz ainda, de 01 a 12 de julho, em São Paulo, mostra-se acertada na medida em que procura dar conta do mais representativo da recente produção do gênero no país. Segundo a organização são "5 filmes que refletem nossas tradições, nossos ídolos, nossos talentos escondidos e nossas razões de ser". Acrescento ainda que revelam diferentes modos de realização, concepção e produção de documentários musicais proporcionando, além de uma reflexão sobre si mesmo, uma análise dos nossos ídolos e tradições não naquilo que possuem de inacessível e inatingível - que nos distanciam desses protagonistas - mas lançam uma tentativa de compreensão na porção humana que os aproximam de todos nós.
Por conseguinte, os selecionados deste ano foram:Eu Sou Carlos Imperial (2014), My Name Is Now, Elza Soares (2014), Preme. Quase Lindo (2015), Samba e Jazz (2014) e Yorimatã (2014).
My Name Is Now, Elza Soares
Primeiro da competição a ser exibido no festival, sexta-feira última My Name Is Now, Elza Soares, se desenvolve como um documentário ensaio entrecortado das performances da cantora sempre fortes, de um improviso característico, impressionante. Revelando a mulher forte, negra, de periferia que enfrentou preconceitos e os superou.
A narrativa privilegiou exclusivamente relatos da própria Elza sobre si mesma a um espelho com intensa sinceridade e opta por deixa-la sempre em primeiro plano. A escolha visava, segundo a diretora Elizabete Martins Campos, em debate após a exibição do filme, apresentar Elza de maneira forte. Também vemos suceder uma profusão de referências que remetem ao universo particular da cantora, ligada ao mundo de alguns orixás como o espelho e a água - chuva, mar.
As escolhas destes elementos demonstram-se acertadas por contextualizar a personagem e, principalmente, por ser diante do espelho que Elza se desnuda de maneira mais lacerante. No entanto, entendo que neste processo poderia ter sido mais flexível no mínimo, para que a feitura do filme tivesse alcançado maior excelência.
Se a opção de câmera decalca uma pessoa forte, suas declarações também deixam a mostra uma Elza um tanto triste que poucas vezes exalou felicidade ou as mencionou. Este estado atual poderia não ser algo genuinamente anímico, mas sim fruto da sua condição de saúde a época, acometida por um acidente que o impedia por andar e o privaria de muitas coisas e da sua liberdade de maneira momentânea. A predileção pelo primeiro plano, para a diretora ainda, era uma questão de solução para não representa-la nesta condição. Porém, omitir de todo este fato pode causar uma falsa impressão na composição do retratado.
Sobre as imagens externas captadas e relacionados ao mundo religioso da cantora, apesar de importantes no documentário, carecem de um tratamento, no sentido de uma melhor estilização para que o produto final se estabeleça como um todo mais coeso.
Em momentos, a sensação é de episódios soltos, sem muito roteiro e ligação com o resto. O que, por exemplo, como no instante após as imagens de Garrincha, identificado ao Botafogo, temos estádio lotado, com torcida do Flamengo, em êxtase, e Elza cantando "Domingo eu vou ao Maracanã", ficou um tanto desconexo com a passagem anterior. Entendo que talvez uma maior interferência de fatores externos neste círculo interno e intocado - no filme - de Elza, com alguma outra declaração, nos ajudasse mais no processo de compreensão do ser - o que de alguma maneira o filme até consegue fazer. Temos apenas duas notícias externas, esparsas ao longo do filme, como o recorte de jornal que noticia a morte do filho. Essas inserções redimensionam o filme no caminho a que ele se propõe. Afinal, como diria Sartre, somos "aquilo que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós".
Exibição
CCSP, 09/07, 20h
Samba e Jazz
O filme procura o substrato comum que aproxima o samba do Rio de Janeiro ao jazz tradicional de Nova Orleans e vice-versa. Embora o formato do documentário apresente um formato mais tradicional recheado de entrevistas a comparação que temos neste documentário é vigorosa.
O diretor Jefferson Melo apontou, na sessão da Cinemateca, que a escolha da escola de samba Império Serrano aconteceu por esta ser considerada uma das últimas românticas do carnaval carioca, dona de nove títulos. Em tempos de aporte substancial financeiro de empresas, mesmo estando em crise financeira e na divisão de acesso no carnaval do Rio se recusa a distanciar-se da sua tradição.
Nos Estados Unidos o filme adentra no território restrito da YMO - The Young Men Olympians - associação, do século XIX, organizada para dar assistência aos negros locais que, além de não terem direitos, eram marginalizados.
As semelhanças assim se adensam. A exigência de vestimenta impecável era a lei nos dois ambientes. A ligação com os antepassados africanos explica a ligação de ambos com o candomblé e o vodu, ganhando contornos ainda mais robustos com as imagens do cortejo fúnebre do enterro de um membro do Olympians - rito ao som de jazz - e o gurufim ritual semelhante entoado com hinos do samba.
Neste entendimento de aproximações sem hierarquização, de privilegiar as ações no Brasil ou nos Estados Unidos, está a força deste filme, com um apuro visual belíssimo, tanto em cores quanto em preto e branco, que pode num instante nos remeter as fotos dos negros de Pierre Verger e Sebastião Salgado, registro que valoriza os traços dessa população.
O diretor Jefferson Melo, na sessão de abertura do filme no Festival In-Edit, de maneira tímida apresentou sua obra - roteirizada, dirigida, pesquisada e fotografada por ele - como um filme de fotógrafo, sua profissão."Belas imagens e boa música", comenta acanhado.
Se me permitirem uma correção que esta declaração aparentemente restritiva pode realçar, diminuindo suas potenciais qualidades. Corrijo. Estamos diante de um ótimo filme e que vale muito uma [s] conferida[s].
Exibição
CCSP, 09/07, 16h
Premê. Quase Lindo!
O filme percorre a trajetória do grupo paulistano Premeditando o Breque, o Premê. Da sua formação na Escola de Comunicação e Artes, da USP, há quarenta anos, da época do Lira Paulistana até tempos mais recentes.
Repleto de imagens caseira, amadoras e realizada pelos próprios integrantes do grupo, em tela não vemos o recurso da entrevistas de outras pessoas e de membros atuais como é mais comum, mas não há essa omissão. Os membros do grupo são entrevistados e fazem várias declarações ao longo do filme. Eles próprios se explicam e se revelam. "As entrevistas caíram no final", dizem os diretores Alexandre Sorriso e Danilo Moraes, completando que pretendiam deixar o filme mais dinâmico. Conseguiram e com a virtude de adequar o filme com estilo do Premê, bom humor e leveza que em uma hora e dez minutos deixam a sensação de quero mais ou um bis. Como, por exemplo, uma solução para reunir as imagens caseiras e em VHS utilizadas, os diretores preferiam, ao invés, de tentarem artifícios de hardware, que encareceriam a produção, uma imagem da tela, entre as inserções que aparecia B.E.ST PICTURE SISTEM.
As entrevistas realizadas para o filme, e que serviram de elemento de pesquisa para a sua realização, estarão presentes no lançamento do DVD, em negociação, segundo os autores. Em uma delas, após o final da película entre os créditos, temos Lulu Santos, produtor contratado para um disco do grupo, o primeiro para uma grande gravadora. Contrato rompido pouco depois do lançamento, por sentirem-se castrados e domados naquela estrutura comercial. Esta também é uma das questões do documentário e algo que falta no nosso cenário atual. Sempre bem humorados e muito competentes musicalmente - podemos facilmente relaciona-los ao Mamonas Assassinas. Foram taxados de anticomerciais, porém, acima de tudo, procuraram ser a afirmação de uma autenticidade. Quase não, lindo.
Exibição
CCSP, 11/07, 18h
Eu sou Carlos Imperial
O protagonista desta biografia vive uma espécie de "revival" no país nesses últimos anos. A sua persona aparece como um narrador no espetáculo teatral que retrata a vida de Wilson Simonal, personagem no filme recente sobre o Tim Maia e tema da biografia Dez! Nota, dez! Eu sou Carlos Imperial, de Denilson Monteiro, base para o filme.
Figura onipresente do show bussines brasileiro desde os anos 60, o filme não faz concessões ou se omite em explorar as contradições de um personagem tão complexo quanto humano. Com tirocínio publicitário incomum foi um dos precursores do Rock'n'roll no Brasil, lançando nomes como: Roberto Carlos, Ronnie Von, Elis Regina, Simonal entre outros. Ajudou e amparou nomes como Paulo Silvino e Tony Tornado, a quem até moradia ofereceu. Era fiel aos amigos, mas ostentava o bordão "amigo meu não tem defeito. Inimigo, se não tiver, eu ponho".
Compositor entre outras de Mamãe Passou Açúcar em Mim e Pode Vir Quente que Eu Estou Fervendo era controverso com a divisão dos direitos autorais das músicas, não creditando os amigos nas coproduções. Aliás, um dos momentos mais engraçados do filme e que dá dimensão de onde ia a ganancia de Imperial no filme, é a história contada pelo cantor Fábio revelando como tentou surrupiar a música Azul da Cor do Mar, de Tim Maia.
O filme tem a qualidade também de assumir claramente o tom irreverente do personagem, ostentando essa postura até mesmo na hora de creditar algumas das canções de domínio público que Imperial roubava para si. "Comigo é assim: música e mulher, se não tiverem dono, eu tomo!", bradava.
Apesar de se intitular cafajeste e de estilo boêmio, não bebia nem fumava. Quando descobriu que o filho experimentou, após pedir que o menino aos 12 anos fosse contestar o mundo, o privou de diversas coisas. Mesmo com suas falhas, por se assumir genuinamente, a despeito das mentiras, é um ser que desperta admiração. Mas que pode se tornar facilmente odioso, por exemplo, quando o filho revela que perdeu todas as coisas do pai na ocasião do nascimento da sua primeira filha, porque era contra que tivesse filhos - teve onze no total. Marco revela isso aos prantos, chamando Imperial de papai. O silêncio, neste momento, na plateia foi total. Era proibido por ele de sair mais de três vezes com a mesma mulher.
Faltou, além de qualquer explicação de como Carlos Imperial alçou este espaço e se tornou relevante no início, também alguma menção neste bom filme, para poder jogar alguma luz nesta questão, alguma abordagem relativa ao primeiro casamento de Imperial. Que rendeu seus dois filhos. Portanto, quebrou um dogma seu exposto ao seu filho. Rose Gracie, a ex-esposa, era filha de Carlos Gracie, de família tradicional e considerado fundador do Jiu-Jitsu brasileiro.Mas, de maneira inequívoca, não prejudica o conjunto, deste bom filme.
Exibição
CCSP, 11/07, 20h
Yorimatã
Se em Premê. Quase Lindo a questão que se impunha era pelo direito de se ter uma carreira afastada do mainstream, no filme de Rafael Saar a luta que se estabelece é pelo direito de se ter uma carreira. A dupla Luhli e Lucina gravada por Nara Leão, Ney Matogrosso entre outros, responsáveis por sucessos como O Vira e Bandoleiro, por vezes, teve que abrir mão da atividade, mesmo sendo donas de inquestionável talento.
A parceria que podemos dizer que no início era profissional tornou-se vital, inclusive com o casamento delas com o fotógrafo Luís Fernando Fonseca. Este, aliás, é a fonte do vasto material que é apresentado no filme de ensaios caseiros, apresentações, do contexto familiar realizadas em Super 8 e a concepção visual das apresentações das duas.
Estas imagens tem o poder de mostrar que a música produzida por elas tem total relação com o estilo mais alternativo que possuíam. Música sem rótulos, assim como a ligação com a própria vivência desfrutada claramente neste filme. Experiência entremeada de relatos da mistura da cultura e natureza - candomblé, orixás, matas, florestas, cachoeiras, palcos, filhos, perdas, conquistas e, acima de tudo, vida. Ótimo.
Exibição
CCSP, 11/07, 16h
Salvador, 15/07, 18h
Bons filmes!
Sugiro fortemente uma ida ao festival. Confira a programação aqui.
Bons filmes!
Mauro Henrique.
Postado por Mauro Henrique Santos
Em
10/7/2015 às 17h41
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