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Terça-feira,
4/8/2015
Porque as mulheres fazem artesanato?
Sonia Regina Rocha Rodrigues
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Simone de Beauvoir que me desculpe, eu discordo. Li seu livro aos 17 anos, hoje tenho 60 e falo com conhecimento de causa. Mulheres fazem artesanato porque é divertido, criativo, interessante e cada pequena peça cuidadosamente elaborada expressa vida.
Nos anos setenta, O segundo sexo tinha seu peso. Garotas intelectualizadas (como eu) torciam o nariz para tarefas domésticas e varavam as madrugadas sobre os livros, visando um futuro financeiramente e socialmente/ nte independente.
A verdade? Eu adorava cozinhar e pintar. Também admirava as lindas colchas de crochê feitas por vovó. A pouca habilidade de minhas mãos canhestras foi um fator determinante em minha decisão de debruçar-me sobre os grossos compêndios. Formei-me e por 35 anos empenhei-me em trabalhos enfadonhos sonhando em pilotar o fogão. Minha alegria era estar em casa a cuidar dos filhos. Pude trabalhar meio período por alguns anos a vivia pensando nos momentos passados em casa com a família.
Ao longo da vida, como muitas colegas, em intervalos dos plantões, dedicava-nos a pequenas tarefas manuais, usufruindo uma agradável sensação de relaxamento mesmo que o resultado final estivesse muito aquém dos mimos comprados prontos nas lojas. O resultado objetivo, a princípio um completo desastre, aprimorava-se com o tempo, gerando profunda satisfação. Aquele sapatinho, aquele paninho de prato, aquela touquinha, feitas com as próprias mãos, expressavam amor. Cada pecinha tecia a vida, acalmava a mente, trazia a atenção ao momento presente. Comecei a ver o artesanato como uma forma de meditação ativa, potente e eficiente, como descobre através dos anos.
Quantos depoimentos de mulheres que começavam a bordar do lado de fora da UTI (unidade de terapia intensiva), às portas do centro cirúrgico, nas salas de espera dos terapeutas, enquanto aguardavam notícias dos entes queridos? "Deu-me conforto espiritual". "Salvou-me da depressão". "Diminuiu meu desespero".
Velhice chegando, maridos morrendo, que os egoístas dos homens insistem em morrer antes, pais idosos com doenças degenerativas, o que salva centenas de mulheres da solidão e da tristeza? A arte e o artesanato, seu primo próximo e igualmente gratificante.
Não, Simone de Beauvoir, o artesanato não é necessariamente" a ocupação que mantém as mulheres ociosas em casa, preenchendo o vazio de suas vidas inúteis". Nem acredito que fosse assim para todas as mulheres dos séculos passados.
Ao aposentar-me, fiquei feliz em dedicar meu tempo a sanar a frustração da adolescência: aprendi a tricotar, a costurar e a fazer patchwork. Não o faço por sentir-me inútil. É simplesmente divertido. O patchwork é um quebra-cabeça de adultos. De quebra, relembro geometria, que eu teria aprendido com mais facilidade no ginásio confeccionando roupas do que me debatendo com a questão retórica "pra que diabos serve isso? ". É difícil. Desafiante. Criativo.
Sou, como sempre fui, uma pessoa muito ocupada, com múltiplos interesses. Ainda exerço a profissão, dois dias por semana. Frequento todos os grupos que sempre quis frequentar, onde se discute literatura, poesia, cinema e....artesanato também! Esses caminhos criativos nos conectam com as pessoas, expressam o nosso eu.
Simone, nem toda mulher nasceu para ser intelectual, e eu, que sou intelectual assumidíssima, tenho, sim, meu lado caseiro que me dá muita alegria.
Neste bom século XXI a mulher pode ter o melhor dos dois mundos.
Vamos, então, ser feliz. Simples assim.
Postado por Sonia Regina Rocha Rodrigues
Em
4/8/2015 às 11h38
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