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Terça-feira,
8/9/2015
Costa-Gavras ataca o capitalismo novamente
Guilherme Carvalhal
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O cineasta grego (cujas produções são francesas, além dele ter a nacionalidade desse país) Constantin Costa-Gavras vive no limiar entre arte e política. Dos realizadores de cinema, ele foi quem melhor encontrou o equilíbrio entre a ideologia e a estética, com filmes que são inovadores artisticamente e ao mesmo tempo capazes de levar o espectador a reflexões.
Costa-Gavras atacou muitas instâncias do mundo ao longo de sua obra. Em Paraíso à Oeste (2009), ele retrata a atualíssima questão de imigrantes na Europa. Em O Corte, a abordagem é sobre um homem desempregado e sua jornada violenta para tentar reingressar no mercado de trabalho. Em O Quarto Poder, seu foco é nos métodos pouco éticos da imprensa sensacionalista.
Dois de seus trabalhos chamaram mais atenção. Um deles foi Z, sua obra mais premiada, vencedora do Prêmio do Júri do Festival de Cannes de 1969 e do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 1970. Nessa obra, o assassinato de um político desencadeia uma investigação que mostra toda a falsidade por trás do jogo político. O outro é Desaparecido - Um Grande Mistério. Nessa obra, o cenário é o Chile na época da ditadura de Pinochet. Um rapaz dos Estados Unidos é dado como desaparecido e seu pai vai ao país, descobrindo toda a tragédia por trás do regime militar.
O filme mais recente de Costa-Gavras foi O Capital. Obra que, como o título já sugere, se passa no metiê de grandes corporações e do mercado financeiro, fazendo eco da crise de 2008.
O filme inicia com Jack Marmand, presidente do banco Phenix, acossado por uma crise devido ao seu problema de câncer nos testículos, que vem escondendo. Impossibilitado de continuar no cargo, ele se reúne aos acionistas e sugere o nome de Marc Tourneuil para assumir seu lugar. A diretoria reluta por considerá-lo incapaz, mas aceita planejando tirá-lo do posto quando Marmand morrer.
Marc Tourneuil é uma figura um tanto quanto dúbia. Assume a presidência querendo reduzir créditos aos pequenos empresários, mas usa como slogan a ideia de prezar por uma empresa ética. Inicia uma campanha para redução de pessoal, que ultrapassa as 10 mil demissões pelo mundo inteiro, utilizando um discurso de ouvir os funcionários da base para demitir as chefias (estratégia que absorveu de um livro de Mao Tsé-Tung).
De fantoche posto à frente da empresa, Tourneuil se torna uma figura popular após aumentar o valor do Phenix nas bolsas de valores. E logo começa a ser assediado por Dittmar Rigule, um acionista norte-americano que deseja converter o banco para o seu país. Rigule começa a sugerir uma série de ações por parte do novo presidente, de modo que pouco a pouco ele e seu grupo assumam o controle, ação que coloca em cheque a posição de Tourneuil.
Essa trama consegue abarcar inúmeras questões do mercado financeiro sob uma visão bastante crítica, marca registada do cineasta. As movimentações realizadas para enriquecer os especuladores acabam gerando consequências na população, o que é frisado por um tio de Tourneuil, que diz que a conta do enriquecimento deles é paga pelos contribuintes franceses. E isso se soma às negociatas por baixo do pano, como acintosamente desvalorizar as ações da Phenix para conseguir comprá-las e aumentar sua influência dentro dela.
O presidente passa por uma espécie de jornada a partir do momento em que é alçado a esse posto. Suas pretensões de deixar a vida corporativa e retomar às salas de aula se perdem e ele se vê cada vez mais envolvido pelo poder concedido a ele. E essa jornada se vê cercada por todas as provações: ele precisa agir contra Marmand, que era uma espécie de mentor seu; se sente atraído por uma modelo que o arrasta em um jogo de interesses no qual dinheiro está sempre presente; e transforma sua esposa em mais um objeto de decoração junto a seus ternos caros. Ao fim das contas ele começa a ser chamado de Robin Hood dos ricos, que rouba dos pobres para dar a eles.
O enredo desse filme pode soar um tanto quanto caricato demais. Obras como O Lobo de Wall Street, Wall Street - Poder e Cobiça e Trabalho Interno já bateram nessa tecla, incluindo os danos causados pela especulação. O detalhe em Costa-Gavras é sua capacidade de fugir do óbvio, principalmente ao ocular as reais aspirações de Tourneuil. Se no filme de Scorcese o personagem principal não possui nenhum valor moral e no de Oliver Stone fica evidente o quanto ele se posiciona contra as corporações, em O Capital sempre há algo a ocultar as reais pretensões do presidente, que com uma visão bastante cínica deixa claro que sabe das consequências negativas de seu trabalho, mas não há outra forma de proceder.
Se por um lado o diretor trabalha um tema que tem sido desgastado nos últimos anos, por outro sua abordagem é bem detalhada e consegue inserir o espectador em momentos de dúvida sobre o que vai acontecer. Não é uma das melhores obras de Costa-Gavras, mas é mais uma peça no enorme mural de críticas que ele construiu ao longo dos anos.
Postado por Guilherme Carvalhal
Em
8/9/2015 às 19h27
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