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Domingo,
27/9/2015
Na Pavuna: o samba e a irreverência carnavalesca
Mirian de Carvalho (e-mail: [email protected])
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Em Vila Isabel, volto a repetir, a fábula desenha o dia a dia. Almirante nasceu na Vila. Da Vila, outros bairros e cantares são parceiros, porque a poesia não mora numa torre de marfim. A poesia vai a todos os lugares. E, com ouvidos aguçados, o Almirante da Vila e Homero Dornellas foram ouvir a batucada no subúrbio distante, que inspirou o samba Na Pavuna, rememorado no estribilho:
"Na Pavuna
Na Pavuna
Tem um samba
Que só dá gente reiuna (...)."
Antiga região agrícola, a Pavuna nos dias atuais tem metrô, comércio em expansão e conjuntos residenciais. Conhecido e consagrado samba na memória de todos aqueles que cultivam esse gênero musical, Na Pavuna homenageia o bairro nos aspectos do primeiro quartel do século XX. Visitando a Pavuna de 1929, quando esse samba foi gravado pelo Bando de Tangarás, os autores destacam o malandro bamba, o lugar do samba e a batucada.
Nessa exaltação à Pavuna, Almirante e Dornellas rememoram naquele bairro a presença do povo com seus hábitos e costumes. Na Pavuna "Só nasce gente turuna", dizem os autores, porque lá, junto com o samba, tem muito mais a ser cantado. Lá se fixou a ancestral cultura africana:
Na Pavuna, tem
Canjerê também
Tem macumba, tem mandinga e candomblé.
Atentos à batucada, percebemos, nos versos e no ritmo, alusão à história daquele lugar, que no século xvi ganhou engenhos de cana de açúcar e, mais tarde, fazendas de café, tudo isso, relembre-se, com o trabalho dos africanos que deixaram também como herança espécie de transe rítmico:
"O malandro que só canta com harmonia,
Quando está metido em samba de arrelia,
Faz batuque assim
No seu tamborim
Com o seu time, enfezando o batedor (...)".
A Pavuna, que "tem doutor" de samba, espalhou pela cidade o espírito de arrelia na voz dos foliões. Tão forte, tão forte, a marcação do samba, que, no mesmo ritmo, o povo trocou a letra pra reclamar do governo que passara a cobrar pela utilização dos mictórios públicos. Nos idos de 1970, registrei depoimento de um professor, que afirmava ter visto certo bloco de sujo, na década de 1930, nas imediações da avenida Rio Branco, cantando assim o estribilho:
"Na cidade.
Na cidade.
Já se paga
Pra fazer necessidade."
Enxergando as verdades do carnaval, por certo os autores não ficariam zangados com tal substituição passageira da letra. Almirante e Dornellas ─ familiarizados com a irreverência carioca ─ certamente endossariam o protesto popular. E, com bom humor, apoiando a justa queixa, quem sabe até entrariam naquele bloco?
Postado por Mirian de Carvalho (e-mail: [email protected])
Em
27/9/2015 às 11h07
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