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Domingo,
11/10/2015
Literatura e o gênero fantasia
Guilherme Carvalhal
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O gênero de fantasia é um dos estilos mais dúbios e duvidosos que existem dentro da literatura. Isso porque aquilo que ela entrega em muitas casos não cumpre aquilo que sua proposta inicial diz, que é a de se aventurar por lugares e roteiros que sejam realmente inovadores e fantásticos.
Por princípio, o gênero fantasia deveria ser aquele que provê maior liberdade criativa ao autor. É quando a inventividade pode falar mais forte do que em qualquer outro, sem medo de atropelos, sem jamais poder ser taxada como exagerada.
Na literatura romântica, erótica ou policial, sempre há determinados elementos que precisam existir. Na romântica, tem que haver um casal apaixonado, na erótica tem que haver cenas picantes, na policial é preciso haver um eixo investigativo que prenda o leitor até a solução dos fatos. Já o gênero de fantasia é livre. Não há nenhuma regra prévia exceto o uso de criatividade. Bem, pelo menos deveria ser assim.
A humanidade contou com umas poucas dúzias de autores que realmente foram criativos nesses gêneros, como Isaac Asimov, J. R. R. Tolkien, Mary Shelley, Lewis Carroll, os irmãos Grimm, Lovecraft, Philip K. Dick, etc. Esses autores criaram esteriótipos narrativos de fantasia que se estabeleceram e se fixaram na mente do público leitor e dos novos autores, entrando de uma maneira tão forte que é pouco possível que se consiga sair dessa lógica.
Por isso que olhar lista de livros do gênero fantasia sempre vai parecer que se assiste a um apêndice de algum clássico da série, alguém que leu O Senhor dos Anéis e pensou "E se na verdade o Frodo fosse um adolescente em uma escola de soldados?", desenvolvendo a trama de um novo livro. Isso então gera uma espécie de paradoxo, pois o estilo literário que deveria ser o mais inovador acaba sendo um pastiche sequente de si mesmo.
O gênero fantasia é um dos que mais se aproximou do conceito de indústria cultural. Nos últimos anos, com o sucesso de adaptações cinematográficas como O Senhor dos Anéis e Harry Potter, além do mais recente fenômeno de Game of Thrones o público para essas narrativas tem aumentado, tanto que histórias desse gênero, principalmente aquelas com temáticas medievais, tem frequentemente entrado para listas de best sellers. Se for temática medieval com um adolescente em formação a chance de sucesso é maior.
É bastante evidente que a produção de histórias assim se adéqua a uma lógica mercadológica e os autores e as editoras pretendem atender a um público específico. Justamente por isso, a literatura de fantasia deixa de ser de fato fantasia, mas apenas retrata uma história de relações humanas que se passa em um território inventado. Não é de fato algo inovador, mas algo banal contando alguns elementos que não encontram apelo no nosso mundo factível.
Podemos pegar alguns clássicos do gênero para avaliar. Em Frankenstein, Mary Shelley promoveu uma avaliação sobre a relação do ser humano com a natureza, questionando se havia limites éticos entre sua capacidade de influenciar e domesticar o mundo querendo imitar Deus. Lewis Carrol em Alice no País das Maravilhas traça uma complexa e criativa fauna de seres que levam o leitor a um longo questionamento. Asimov levantou a relação entre homens e máquinas e levantou a discussão sobre as possibilidades dos homens serem dominados pelas máquinas. Foram autores inovadores e que conseguiram ir além do mero lugar comum.
A literatura de fantasia atual tem se prendido muito a um modelo próprio, focando-se em um público juvenil, muitas vezes com uma proposta de formação de novos leitores. Essa proposta é válida, mas ela não esgota todas as possibilidades, até porque inovação é necessária por mais que seja pouco palatável ao grande público.
Talvez seja esse o ponto em que a literatura de fantasia encontre maior dificuldade: não encontrar um público que consiga aceitar uma literatura que fuja de qualquer tipo de relação com o mundo factível. Uma obra de fantasia precisa de elementos que a aproximem do mundo tangível, até mesmo como forma de situar o leitor. Daí o herói derrotando o vilão, bem versus mal, a mocinha sendo salva e se apaixonando, o ajudante atrapalhado, o mago misterioso e todos os elementos que levam as pessoas a interpretarem aquela história e a tornam algo inteligível.
O gênero fantasia tem produzido quantidades consideráveis de obras. Porém, são livros que tem caráter muito maior de produto de consumo do que de arte propriamente dita. Os fundadores desse estilo conseguiram colocar seu nome na história da literatura. Aos que vieram em seguida, é pouco provável que seus nomes prevaleçam por mais de duas gerações.
Postado por Guilherme Carvalhal
Em
11/10/2015 às 19h14
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