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Quarta-feira,
28/10/2015
Divórcio, de Ricardo Lísias
Guilherme Carvalhal
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Um dos pontos que se nota nos rumos da literatura nacional nos dias de hoje é uma narrativa cada vez mais intrínseca à subjetividade de personagens e a um mergulhar em suas realidade. Um caso bem claro desses na literatura recente do Brasil está em Barba Ensopada de Sangue, em que há um mergulhar na individualidade do personagem principal com o mundo, sendo que seu problema de memória acaba participando do eixo narrativo, uma mostra de como essa individualidade do personagem acaba sendo a chance de se criar um estilo para a literatura.
O livro Divórcio, de Ricardo Lísias, leva essa ideia a extremos, criando uma ficção em torno de uma autobiografia, deixando pouco claro ao leitor onde uma se inicia e onde a outra termina. É a própria vida sendo transformada em história inventada, uma tendência dos novos tempos onde a vida privada cada vez mais toma conta do espaço público.
A história fala sobre ele próprio passando por uma crise de casamento, envolvendo uma traição da parte de sua esposa, o que culminou na separação. O livro retrata a tentativa do autor (ou pseudoautor) em superar o trauma, passando por momentos de fúria e de frustração durante esse incidente.
Aqui, o personagem narrador foi traído pela esposa, jornalista cultural que se envolveu com um diretor de cinema durante o Festival de Cannes. O baque é agravado quando ele descobre o diário dela, deixando claros seus sentimentos, que misturam o encanto dela pelo seu conhecimento e sua cultura e menosprezo por todo resto.
A tentativa de superação mescla passado e presente, com memórias de fatos passados que culminam no tempo atual, como a época de estudo universitário ou a participação em um campeonato de xadrez. Essa é uma das melhores características do livro, a precisão com que o autor mescla essa procura do passado e os fatos do presente, junto a outros elementos narrativos, como trechos do diário de sua esposa que pouco a pouco vão tecendo toda a trama.
Essa reconstrução pela via temporal, envolvendo as memórias e sua percepção do presente, é a maneira como o escritor vai expondo esse seu falso eu. A condução do enredo vai montando o emaranhado pessoal do autor-personagem, em uma exposição da individualidade, esboçando a raiva sentida pela infidelidade conjugal e até mesmo dúvidas com a própria sexualidade.
Se cada vez mais o espaço público se torna palco para o privado se expor, a literatura também se rende a essa proposta. Não é nenhuma novidade que a literatura esteja há séculos expondo muitas vísceras, mas dessa vez essa tendência ocorre em um mundo em que a extrema oposição cada vez mais dá a tônica de noticiários e meios de comunicação. Divórcio faz parte desse universo. Porém, a profundidade com que o autor realiza sua orba a distancia de qualquer lugar-comum corrente.
Postado por Guilherme Carvalhal
Em
28/10/2015 às 16h08
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