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Sábado,
2/1/2016
Crônica para um Bom Natal ( republicado )
Eduardo Pereira
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O fim do ano sempre me alegrava. Um pouco triste, se despedir da professora e dos colegas de classe, mas estava chegando o Natal. Logo os pais voltariam das fábricas carregando suas cestas com castanhas, panetones e vinho. Ao andar pelas ruas à noite, podia-se se ver de dentro das casas, as árvores iluminadas através vitrôs e janelas meio abertos por causa do calor. Os jingles de TV e de rádio, com melodias tão inspiradas, eram autênticas canções natalinas. Ainda mais hoje, depois de décadas, já purificados do motivo comercial.
Na manhã do dia 25, eu e meus irmãos achávamos nossos brinquedos debaixo da cama. Ainda havia um livro e bombons e balas que raramente víamos ao longo do ano. Da cozinha, vinha o cheiro do pernil assado e nas ruas, as crianças estreavam seus brinquedos. Não havia padarias. O pão e o leite eram entregues na porta de casa antes de clarear o dia e no Natal, vinham acompanhados de pão doce recheado com frutas. Eu não precisava me preocupar com nada. O Natal era bom por si só. Bastava tirar boas notas na escola e aguardar.
Claro que eu não sabia que o Papai Noel, era a empresa onde meu pai trabalhava e descobrir isso, não estragou minha alegria. Com o passar do tempo, a festa natalina se resumiu a uma boa mesa. A árvore muito velha foi jogada fora e um "vácuo natalino" se instalou. Foi quando decidi comprar um pinheiro natural (gosto de árvore, feita de árvore) e começar tudo de novo. O Natal não mais aconteceria por si só. Para ser bom, eu precisava fazer algo. Para mim e para os outros. Estava começando a entender o Natal pelo seu sentido.
* * *
É Natal! É Natal! Canta o coro infantil no shopping.
"Natal é só comércio!", dizem.
"Adeste Fidelis!" Canta o coral da Igreja!
Natal é uma farsa capitalista!, continuam.
São um tipo particular e bem moderno. Gostam de caviar e falam muito dos pobres, mas uma filantropia que olha o corpo e ignora a alma. Pairam o olhar, como que levitando por cima das pessoas, que enchem seus carrinhos no supermercado com calóricos produtos da época, ou saem das lojas com sacolas cheias de camisas e sapatos novos. Brinquedos, não muitos : por falta de filhos, estão ficando escassos. Estranho, para uma festa que existe por causa de uma criança.
Claro que estas cenas não traduzem o Natal, mas menos ainda, essas caras melancólicas, aborrecidas com a proximidade do dia 25. Se estivessem convencidos de que isso não é sinal de inteligência, talvez começassem a sorrir.
Vivemos tempos sofisticados: já se deram conta que atacar o Papai Noel nem sempre é bom negócio. Para quê atacar aquele que pode ser um aliado? A artilharia pesada se volta agora contra o Menino Jesus. Tudo sob o manto da "liberdade de expressão". Agem como um Herodes, apegado ao seu reino e com medo de uma criança.
Outros, preferem mostrar um Natal disperso e confuso : "magia" para o comércio, "ação social" para as ideologias.
Sentimentos tão contraditórios não acontecem por pouca coisa.
Com o Carnaval, é diferente. Os que gostam, entram na festa, os que não gostam, ignoram. O que é "sagrado" para o carnaval está preservado. Há uma atmosfera de consenso. Os carnavalescos do alto de suas cátedras, não são contestados. Os quatro dias de festa pertencem a eles. O Natal no entanto, muitos querem se apropriar, num esforço para adulterar, abafar as consciências e tornar obsoleto o sentido religioso.
Um sinal disso, vemos nas Crônicas de Natal. Entre os autores de prestígio, predominam textos amargos e irônicos. Em 2011, o escritor Ivan Lessa, então colunista da BBC, escreveu uma anti-crônica - também não gostava de Natal - jogando "areia na presepada", ao dizer que até os grandes nomes da nossa literatura, quando escreviam sobre o Natal, faziam seus piores textos do ano. De fato, lendo Ruben Braga, ".se deixando ficar sozinho ( na noite de Natal ) numa confortável melancolia. ", Drummond de Andrade, sugerindo a idéia de um Menino Jesus assaltante de rua, e a celebrada Clarice Lispector, brincando com o nascimento de Cristo, apresentando uma personagem que engravida - sem saber como - e vive com o marido, a fantasia de serem Maria e José, numa crônica sangrenta e cheia de dor; vejo que Lessa tinha razão.
Tristes autores. Nada lhes inspira a escrever sobre um personagem como o avarento Ebenezer Scrooge, do excelente Conto de Natal, de Dickens. Scrooge tão apegado estava com o seu dinheiro, que a sua total indiferença não lhe permitia hálibis ideológicos quando os tres espíritos o visitaram na noite de Natal.
Paradoxalmente, isso o ajudou a mudar totalmente a sua vida. Por isso, - convertido - não se contentou apenas em ajudar um menino pobre, mas também em pedir perdão ao sobrinho rico, e aprender com ele a ficar feliz e celebrar o Natal. Essas duas redenções de Scrooge são importantes. Scrooge era culpado e pronto. Não tinha subterfúgios.
A vida real também nos conta uma bela história de Natal. Durante Primeira Guerra Mundial, quando soldados alemães e britânicos, pararam para uma trégua. Entrincheirados na neve, estavam muito próximos. Uns 100 metros. Era Noite de Natal, e os alemães começam a cantar "Noite Feliz". Os soldados ingleses ouviram a música e gritaram, "Feliz Natal!", ao que os alemães respondem a mesma saudação e pedem : "Nós não atiramos, vocês também não". Durante seis dias, enterraram os mortos, rezaram o Pai Nosso. Havia um padre capelão do lado inglês. Celebraram o Natal juntos. E jogaram várias partidas de futebol. Nas semanas seguintes, passaram a dar tiros para o alto, não queriam mais se matar. O fato histórico virou filme.
Tudo começou com o desejo de celebrar o Natal. Não buscaram a paz. A paz foi conseqüência.
Uma grande lição para pessoas e nações, que hoje - sem sucesso - buscam uma paz sem Deus. Todos os acordos que fazem são inúteis. A paz é como o prazer : não existe isoladamente. A paz é consequência de Algo maior. Busca-se a paz, como se busca a satisfação, como se fosse um item na prateleira. Buscam a paz e não a acharão.
A Paz do Natal não vem das frases de efeito, mas da celebração do nascimento de Jesus. Do contrário, será apenas "espirito de natal", essa coisa genérica que não sei o que é, mas deve estar dentro das caixas de perfume que se abrem e saem luzes, nos ônibus iluminados dirigidos por um Papai Noel, nas decorações dos shoppings que evitam os Presépios para não incomodar os laicos.
No ano passado, perguntei a um amigo, como lembrar as pessoas distraídas com presentes, conversas em dia e pratos na mão, como lembrar as pessoas que é Natal, o verdadeiro Natal :
"Caprichar no Presépio", ele respondeu.
Não esperava uma resposta tão simples e certeira. Pode-se escrever um poema, uma crônica, ou mesmo um Tratado de Teologia, simplesmente ao olhar para o Presépio. Talvez você não veja a hora da ceia acabar e todos irem dormir para ser o último a olhar para o Presépio - à essa hora, talvez no único lugar iluminado da casa - e dizer algumas palavras em silêncio. Que esse momento não seja prejudicado pelo péssimo costume de anos recentes de soltar fogos à meia noite - não podem esperar o Reveillon ? - Afinal, um menino nasceu, e o silêncio deveria ser quase que uma Liturgia.
Uma das mais belas mensagens de Natal que já li, faz referência a essa necessidade de recolhimento interior que o Presépio deve nos provocar. Foi escrita na Noite de Natal de 1902, pelo seminarista Angelo Giuseppe Roncalli, que viria a ser eleito como Papa João XXIII:
"Caiu a noite; as estrelas claras e brilhantes cintilam no ar frio; vozes altas e estridentes vindo da cidade chegam ao meu ouvido, vozes dos boêmios deste mundo que celebram com alegria a pobreza do seu Salvador. À minha volta, nos seus quartos, meus colegas dormem. E eu, continuo acordado, pensando no Mistério de Belém. Vinde, vinde Jesus, espero por ti "
Não posso me esquecer de que estar feliz no Natal, pode não ser nada fácil. Pense na situações de muitos, talvez possa ser a sua: se neste ano lhe faltou dinheiro, emprego, faltou saúde, faltou convivência famiiar, se faltou amizades, se muita coisa deu errado, se você não ganhou presentes ou não tem dinheiro para comprar para ninguém, ou não tem nem a quem dar um presente, e no entanto, está diante de pessoas comemorando o Natal, segurando taças de champagne na mão, sorrindo e comemorando seus lucros, porque neste ano lucraram amizades, lucraram dinheiro, lucraram sucesso, lucraram promoções no emprego, lucraram saúde e em tudo isso você só perdeu, talvez por culpa sua e talvez sem culpa nenhuma.
Isso não importa agora. Diga a Jesus: " Meu Senhor, o meu Natal está sendo pobre, igualzinho ao seu. Que bom que vieste ao mundo assim, entre palhas e animais, assim não me sinto sozinho. Me sinto como esses pobres pastores "
Nestes tempos de lojas lotadas, precisamos pensar num bom remédio para o consumismo, que é ajudar quem necessita. Em que medida ? Se não me engano, perguntaram à Madre Teresa de Calcutá, sobre quanto deveriamos ajudar: "Até doer" - respondeu ela.
No mais, esperar que não haja murmurações em família. Que não haja comparações, no caso de reuniões de famílias grandes, sobre quem colaborou mais para o jantar. Isso vai ajudar muito. Também será uma boa ocasião para ver bons filmes, ou ler livros com temas natalinos, nestes dias que antecedem o Natal.
Perdoar o pedir perdão. Que presente acessível ! Custa, mas todos temos a moeda para comprar !
Por isso, é bom lembrar que além de errarem conosco, também erramos. Mas, tudo é mais difícil quando se apaga a noção de culpa; doença dos dias de hoje, que faz muitos pensarem que os culpados são sempre os outros: os que destroem os rios, os que roubam os cofres públicos, os que maltratam as crianças - ( deixaram de fora quem pratica aborto ), os que derrubam florestas e extiguem animais. Num mundo assim, "sem culpa", desaperece a percepção da necessidade da salvação, e a vinda de Cristo na terra se torna incompreensível.
Eu vou escandalizar, mas..como é bom sentir culpa ! Espero que me entendam. Não quis dizer que é bom praticar o mal, mas reconhecer que erramos.
Que fazer? "Bora" fazer uma boa confissão, para estar preparado para este Natal.
Um Feliz e Santo Natal a todos !
Postado por Eduardo Pereira
Em
2/1/2016 às 16h06
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