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Sábado,
30/1/2016
O impacto de Bolaño
Guilherme Carvalhal
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O entendimento da relevância da obra de Roberto Bolaño para a literatura latino-americana é algo que tem sido bastante discutido pela crítica literário atual. Sua obra quebra com o paradigma regionalista e fantástico, sendo urbana e globalizada. Seus livros retratam personagens inseridos em um contexto mais amplo, nas grandes cidades, abordando temas da atualidade como a violência, um de seus preferidos.
O ponto alto do estilo do autor é sua criação de enredos e a inserção de personagens nas histórias. A criatividade e principalmente a profundidade com que elabora personagens dos mais variados tipos é seu marco maior. De um rapaz pobre levado para ser policial e servir aos poderosos a um escritor de passado nebuloso cuja imagem está ligada a uma série de homicídios, ele consegue construir pessoas complexas e singulares, fugindo de qualquer esteriótipo. Por exemplo, ao elaborar Fate, o repórter de uma revista focada no público negro dos Estados Unidos, ele vai mais além do que um mero militante de uma causa: o personagem questiona seu editor e tenta ir além da política editorial ao viajar ao México para cobrir uma luta de boxe.
Em Detetives Selvagens a construção dos personagens é poderosa e remete às próprias pretensões do escritor em sua juventude, tanto que o personagem principal é Arturo Belano, seu alter ego. Nessa obra um grupo de poetas do movimento real visceralista vive o cotidiano de sua própria falta de importância, porém se veem como a mais forte tendência literária do mundo. Essa é uma das melhores produções referentes ao egocentrismo e a como pessoas geniosas lidam com a própria insignificância.
Os personagens de Bolaño possuem um forte valor por suas referência a tipos reais e mostram a riqueza de vivências do autor, que consegue incluir Osman Lins, pintores medievais e filmes de terror japonês em todo seu contexto. Ele aborda da intelectualidade acadêmica aos caudilhos latino-americanos e as classes baixas. Seus livros são um caldeirão cultural muito extenso e aqui se encontra uma das marcas do autor, que é inserir a América Latina em um mundo globalizado.
Um exemplo disse é a primeira parte de 2666, “A Parte dos Críticos”. Aqui, quatro tradutores do escritor alemão Benno von Archimboldi (para italiano, inglês, francês e espanhol) estão às voltas com o estudo da sua obra, indo a congressos, etc. Os tradutores para francês e espanhol e a tradutora para inglês viajam para o México, onde ele supostamente viveria após desaparecer do mundo (o para italiano é cadeirante e não acompanha). Então em um país da América Latina converge toda uma trama originada na Europa.
O estilo de Bolaño difere bastante de outros autores clássicos da literatura latino-americana, principalmente os do realismo mágico. Ao invés de mundos fechados onde o surreal prevalece, seus cenários são mais amplos e modernos. Se o coronel e a cultura interiorana e arcaica prevaleciam, agora os problemas da modernidade como a violência são o mote. Bolaño poderia ser relacionado a Cortázar ou a Borges, porém seu estilo é diferenciado. Borges e Cortázar não imaginaram no mesmo nível do autor chileno uma América Latina em interação com o resto do mundo, uma situação que se tornou mais evidente (e consequentemente mais temática para a literatura) em tempos mais recentes. Uma obra que poderia ser classificada como algo próximo ao estilo de Bolaño seria Cabeça da Hidra, de Carlos Fuentes, que apresenta uma intriga internacional ao estilo John Le Carré envolvendo judeus, árabes e norte-americanos em território mexicano.
Bolaño ganhou grande reconhecimento após sua morte em 2003. Tem sido merecidamente apontado como um dos maiores autores latino-americanos ao lado de nomes como Neruda, Borges e García Márquez. Ele criou um estilo literário que extrapola as fronteiras de um país e é comum a todo o continente. Cabe agora com o tempo compreender qual será o impacto de sua obra na produção de uma nova geração de autores.
Postado por Guilherme Carvalhal
Em
30/1/2016 às 19h12
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