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Sexta-feira,
4/3/2016
O Funeral - O Equilibrista
Heberti Rodrigo
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Sorrow,Vincent Van Gogh. Fonte:http://www.myartprints.co.uk/
Quando pousaram o caixão do menino, ela soltou um grito lancinante, e seus soluços abafaram o eco das orações fúnebres. Comovidos, todos se calaram. Ela perdera tudo. Ela não era mais nada, e, no entanto, aquele nada estava ali, diante de nós, a revelar-nos, com uma brutal lucidez , que ninguém está seguro. Talvez na esperança de afastarmos de nossas vistas esta terrível realidade, talvez simplesmente porque aquele seria apenas mais um dentre inúmeros outros sepultamentos naquela manhã, minha impressão era de que quanto mais desesperadamente os coveiros jogavam terra na cova, mais o senso do definitivo abandonava-nos a todos. Jamais fui capaz de esquecer a cor e o cheiro daquela terra grossa, cheia de cascalho e pedras que repicavam ao cair no caixão branco do menino. O padre insistia em retomar as orações, mas a multidão hesitava em acompanhá-lo. O céu novamente ficara nublado e recomeçou a chover. A seguir, todos nos separamos e cada qual seguiu seu caminho, perplexo, sem que palavra alguma fosse pronunciada, enquanto aquela mulher, fulminada pela devastadora realidade à qual a inundação a arrastara, permanecia ajoelhada no barro, debatendo-se com o luto e a desesperança. Dias mais tarde, ao evocar as lembranças daquele funeral, lembrei-me que na saída do cemitério reparara que o relógio da catedral havia parado, e os ponteiros indicavam o momento fatídico em que a chuva surpreendera a cidade.
Postado por Heberti Rodrigo
Em
4/3/2016 às 23h46
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