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Sábado,
15/10/2016
Quase milionário
ANDRÉ LUIZ ALVEZ
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Estava sem nada a fazer na barbearia, esperando o Bruno cortar os cabelos. Ao lado da barbearia existe uma casa lotérica. . Não sou dado a apostas, para mim jogo de azar quer dizer exatamente isso: azar. . Mas como o corte demorava a ficar pronto, resolvi esticar as canelas e quando vi já estava preenchendo uma cartela da lotofácil, que foi a que me pareceu mais fácil de ganhar e que os números já seriam sorteados no final daquele mesmo dia. . “Ficou rico da noite para o dia”, li essa frase em algum lugar e agora ela se encaixa perfeitamente nesse texto. . O prêmio era tão vultoso que faria coçar as mãos de certos políticos. . Um pensamento insólito, tão forte, garantia que eu iria ganhar, já cheguei em casa arrotando licor. Quando abri a internet e consultei o resultado, decepção. Por míseros três números, que não foram sorteados, continuo liso na lida. Entre os três números que não saíram, o 13 me chateou profundamente, justo meu número da sorte, me abandonou. Pensando bem, o que eu faria com tanto dinheiro? Num divagar silencioso, a primeira atitude seria mudar os horários; dormir tarde, acordar tarde, comer a comida que me traria até o beiral da cama o mordomo Alfredo – sim, porque mordomo que se preza se chama Alfredo – depois tomaria banho na banheira de hidromassagem, beberia uma taça de vinho raro, ignorando o fato que nunca gostei de vinho, sempre preferi a cerveja, mas agora, podre de rico, o que me importa é a safra do vinho. Daí usaria uma sandália de veludo e cobriria o corpo com tecido de seda, por cima, claro, um pulôver João Dória amarrado sobre os ombros, já ansioso que logo à noite, durante o jantar, finalmente descobriria que diabos de gosto têm o tal caviar. E as horas caminhariam devagar, no mesmo ritmo dos meus passos, aborrecido com Jarbas, o motorista – sim, porque todo motorista que se preza se chama Jarbas - que demora a tirar o Jaguar da garagem. Num estalo de dedos perceberia a necessidade de ser um ricaço benevolente, então, mandaria dinheiro para as ONGs dos amigos mais chegados e distribuiria brinquedos às crianças carentes no natal. Nas reuniões com o seleto grupo de amigos, todos ricos, é claro, entre taças de champagne e arrotos de caviar, discorreria elogios sobre a obra de Warren Buffett, embora nunca tenha lido uma mísera página de seus livros. E no final da reunião, noutro estalar de dedos, pediria para que Alfredo servisse a sobremesa, um doce insosso, de nome estranho e comprido “brownie de chocolate negro com baunilha de Madagascar”, que custou os olhos da cara, embora me corroesse o desejo quase doentio de comer paçoca de amendoim. E na solidão de depois da festa, entre suítes, quartos e banheiros, acalentaria o sonho de comprar o Operário e assim reviver os tempos bons de infância, que a gente formava filas que entupiam as avenidas, marchando à pé - valorosos pés da infância pobre - até chegar ao Morenão e das suas arquibancadas de concreto, sentir novamente aquela felicidade de criança, só de ver o time em preto e branco entrar em campo, sensação muito mais saborosa que caviares, vinhos e champagnes. Depois dormiria pesado, porque ser rico é bom, mas cansa. Putz, ainda bem que aqueles números não saíram. De qualquer modo, só para garantir, amanhã vou fazer uma nova fezinha na loteria. Dessa vez, não vou apostar no 13.
Postado por ANDRÉ LUIZ ALVEZ
Em
15/10/2016 às 13h33
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